segunda-feira, 13 de maio de 2019

Sergio Lamucci: O desanimador cenário econômico de 2019

- Valor Econômico

Condições financeiras pioraram, outra má notícia para a atividade

A economia brasileira está empacada. O desempenho no primeiro trimestre foi muito decepcionante, levando a uma onda de reduções nas estimativas de crescimento para 2019 - hoje, vários analistas projetam uma expansão em torno de 1%. Para complicar, as condições financeiras voltaram a piorar nos últimos meses, dado o comportamento de indicadores como o câmbio, a curva de juros e os preços das ações. É mais uma notícia ruim para a atividade econômica, num quadro de insuficiência crônica de demanda, apesar do nível baixo dos juros básicos, pelo menos para padrões brasileiros.

O mercado de trabalho mostra um quadro especialmente preocupante, com 25% da força de trabalho subutilizada, uma medida que inclui desempregados, quem trabalha menos horas do que gostaria e quem estaria disponível para trabalhar, mas não procura emprego. Esses três grupos somam 28,3 milhões de pessoas. Além disso, a falta de gás da economia afeta as contas públicas, prejudicando a arrecadação de impostos e, com isso, obrigando o governo a segurar ainda mais os gastos.

Depois de melhorar entre o fim do ano passado e o começo deste ano, o índice de condições financeiras da MCM Consultores Associados voltou a piorar entre fevereiro e abril. O indicador ficou mais próximo da neutralidade, ou seja, do nível que não exerce um efeito de estímulo ou de contração sobre a economia. "Esse movimento foi impulsionado pela depreciação da taxa de câmbio, pelo aumento da inclinação da curva de juros e pela maior volatilidade dos preços das ações", diz, em estudo, o economista Alexandre Teixeira, da MCM. O índice da MCM inclui uma medida de risco-país, a inclinação da curva de juros, o câmbio, o nível e a volatilidade da bolsa e os depósitos compulsórios. O objetivo é avaliar de forma ampla o ambiente financeiro e, consequentemente, as condições mais gerais para o crescimento, explica Teixeira.

O economista esperava uma melhora gradual do indicador neste ano, "apoiada na avaliação de avanço relativamente rápido da agenda econômica do governo na Câmara dos Deputados". Mas não foi o que se viu, dada a "falta de articulação política do Executivo e a extraordinária capacidade do governo de criar crises para si mesmo". Nesse cenário, "o desânimo tomou conta dos agentes de mercado, e o risco de atraso no cronograma de tramitação da PEC [proposta de emenda à Constituição] e de redução ainda maior da potência fiscal da reforma foi incorporado aos preços dos ativos", diz Teixeira.

O comportamento recente do indicador preocupa, por sugerir "que o incentivo do lado financeiro para a retomada do crescimento econômico a curto prazo é praticamente nulo", segundo ele. Para piorar, no começo de maio a volta das tensões comerciais entre EUA e China renovou "as preocupações com a guerra comercial e com o crescimento mundial, situação claramente desfavorável aos ativos de países emergentes em geral", ressalta Teixeira. "Assim, as condições financeiras voltaram a piorar." Há possibilidade de elas voltarem a ser contracionistas neste mês, como ocorreu entre maio e novembro de 2018.

É um cenário desalentador para a economia, que não engrena. A MCM projeta um crescimento de 1,7% neste ano, número que tem "viés de baixa", diz Teixeira. A previsão para o resultado do primeiro trimestre está em revisão, e deve apontar uma variação ligeiramente negativa na comparação com o trimestre anterior, feito o ajuste sazonal. Na sexta-feira, o Bradesco cortou a sua estimativa para 2019 de 1,9% para 1,1%, o mesmo ritmo pífio de 2017 e também de 2018. Para o primeiro trimestre, o banco espera uma contração de 0,2% em relação ao quarto trimestre do ano passado.

Não há sinais de melhora expressiva no curto prazo, dada a piora das condições financeiras, avalia Teixeira, que resume: "As perspectivas para o segundo trimestre não são das melhores."

Num quadro de contas fiscais em péssimo estado, não serão os gastos públicos a impulsionar a atividade. As famílias, por sua vez, seguram as despesas, dada a fraqueza do mercado de trabalho, e as empresas pouco investem, num ambiente de incerteza ainda elevada, grande ociosidade e baixa demanda. As exportações tampouco puxarão a economia, ainda mais num momento em que as perspectivas para a economia global parecem piores, devido aos novos capítulos da guerra comercial entre EUA e China, deflagrados pela decisão do presidente Donald Trump de elevar as tarifas de importação sobre produtos chineses.

Nesse ambiente, aumenta a possibilidade de o Banco Central (BC) voltar a cortar os juros, hoje em 6,5% ao ano. Sem espaço fiscal para impulsionar a atividade e com o programa de concessões de infraestrutura ao setor privado devendo ganhar mais fôlego apenas em 2020, resta basicamente a política monetária para tentar estimular a economia.

Para que uma eventual queda da Selic seja mais sustentável, é importante o andamento rápido da reforma da Previdência, para consolidar a percepção de que o desequilíbrio fiscal de longo prazo do país será enfrentado. Mas, com atividade quase parada e expectativas de inflação sob controle, parece aumentar a chance de o BC retomar o corte dos juros mesmo se a mudança do sistema de aposentadorias estiver nas etapas iniciais de sua tramitação.

Teixeira observa que "o benefício desse possível estímulo adicional para a atividade depende do sucesso dessa ação em propiciar condições financeiras favoráveis ao crescimento de forma sustentada". O ponto é que uma piora das condições financeiras é, em boa medida, capaz de anular o efeito da expansão da política monetária. "Ou seja, a queda do juro real ex-ante [descontado da inflação esperada para os próximos 12 meses] é eficaz para impulsionar a demanda, desde que as condições financeiras não atuem na direção contrária." Medidas em estudo, como a liberação de recursos do PIS e do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), podem dar algum fôlego de curto prazo para a demanda, mas não farão a economia deslanchar.

O governo pode colaborar na melhora das condições financeiras se acertar os ponteiros da articulação política no Congresso, o que tenderia a acelerar a tramitação da reforma da Previdência e garantiria uma economia expressiva de recursos com a proposta. Um cenário externo mais adverso joga contra os emergentes, podendo reduzir a tolerância dos investidores com um país com sérios desequilíbrios fiscais e dificuldade crônica para crescer. O espaço para erros na política, que já era pequeno, diminuiu ainda mais.

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