- Valor Econômico
Banco deveria atuar na melhoria da qualidade do ensino básico e na implementação de projetos na área
A inclusão do termo social em 1982 ao atual nome do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) foi o prenúncio da importância de uma ação mais direta da instituição para a redução da pobreza e da desigualdade no país. Nesse sentido, é correto o discurso do seu presidente de que o BNDES precisa ser menos banco e mais desenvolvimento.
Essa atuação é condizente com a minha defesa por um maior foco da instituição na educação, principal motor para a alta do crescimento potencial. Minha proposta é de a instituição atuar na melhoria da qualidade do ensino básico e na implementação de projetos na área. A incapacidade do BNDES de monitorar ações nos municípios não é um problema. A instituição não tem estrutura própria para acompanhar todos os seus financiamentos, mas nem por isso deixa de monitorá-los com o auxílio de seus agentes financeiros. O acompanhamento do ensino seria efetuado, por exemplo, com a interveniência das secretarias de educação.
As ações do BNDES incluiriam o desenho de incentivos para os profissionais de ensino, bem como o monitoramento de metas e a elaboração de projetos em conjunto com o Ministério da Educação e as secretarias regionais. As atribuições do BNDES complementariam o papel desses órgãos, que continuariam responsáveis pela atualização do Plano Nacional de Educação, definição curricular e pedagógica, determinação das metas de desempenho e de qualidade, realização de exames e qualificação de profissionais.
A transformação do BNDES passa pela conclusão de que não há mais espaço para o papel de simples provedor de empréstimos subsidiados. O declínio da participação da indústria na composição do PIB, a baixa competitividade da maioria dos seus segmentos e a sua reduzida inserção nas cadeias globais de produção atestam que os enormes e contínuos subsídios não elevaram o crescimento potencial nas últimas décadas.
A implementação da TLP, a maior capitalização dos bancos privados, as novas fontes de crédito e a estabilidade da inflação contribuirão para o alongamento dos prazos dos recursos alocados pelo setor privado. Nesse contexto, o BNDES poderia atuar na concessão de garantias aos provedores de crédito para investimentos. Em contrapartida, receberia remuneração atrelada à variação do valor da empresa. Isso estimularia a expansão do mercado de crédito de longo prazo.
O correto seria o BNDES elevar sua alocação em atividades (e.g., infraestrutura) que geram maior eficiência econômica e retorno social, além de criar mecanismos para eliminar o acesso continuado dos tomadores dos seus financiamentos. Ao mesmo tempo, a instituição precisa interromper a oferta de crédito para capital de giro, pois esse não é o seu papel.
A desmobilização da carteira de ações do BNDES é necessária. Não é sua função manter participação em empresas por período prolongado, pois isso limita o crédito e desestimula o desenvolvimento do mercado de capitais. A carteira do BNDES totaliza mais de R$ 100 bilhões, sendo que as maiores participações são Petrobras (R$ 53 bilhões), Vale (R$ 16 bilhões), Eletrobrás (R$ 9 bilhões), JBS (R$ 9 bilhões), Suzano (R$ 7 bilhões) e Copel (R$ 2 bilhões). Em uma situação normal, o processo teria de ser gradual para não ter impacto significativo nos preços de mercado. Assumindo uma venda diária de 5% do volume médio negociado por dia de cada papel, a desmobilização dessas posições demoraria: Petrobras (2,5 anos), Vale (1,2 ano), Eletrobrás (3 anos), JBS (2,9), Suzano (2,6) e Copel (3,5). Há participações que demandariam uma estratégia diferente, pois a liquidez é baixa e a posição é expressiva, como na Marfrig (34% do capital).
O volume recente de emissões primárias e secundárias sugere que há espaço para que essa desmobilização seja bem mais rápida. A redução dos juros e a percepção de maior estabilidade econômica podem estimular o aumento da participação em renda variável de investidores locais - com a redução da rentabilidade de instrumentos de renda fixa - e de estrangeiros - cuja participação no mercado local tende a crescer, após o recuo dos últimos anos.
O governo pode resgatar a atuação do BNDES na desestatização da década de 90, estabelecendo-o novamente como coordenador e agente operacional da privatização e da concessão de serviços públicos no âmbito federal e subnacional, bem como da venda de ativos e de empresas controladas por estatais. A instituição também precisa expandir seus serviços para incluir a prestação de consultoria de projetos para Estados e municípios, ainda mais quando o recuo dos seus empréstimos elevou a sua ociosidade. A média anual dos seus financiamentos diminuiu de R$ 162,3 bilhões entre 2010 e 2015 para R$ 76,1 bilhões entre 2016 e 2018. Isso agilizaria o processo de modernização do Estado.
A alocação dos recursos públicos melhoraria com a absorção pela instituição de outros órgãos, como partes do BNB e do BASA que operam como banco de fomento. A incorporação da Finep também contribuiria para a elevação da eficiência na concessão de crédito para pesquisa e desenvolvimento. A transferência para o BNDES da gestão do fundo de investimentos FI-FGTS melhoraria igualmente essa eficiência, caso não seja tomada a decisão mais coerente de devolução imediata dos recursos aos correntistas.
Uma outra mudança seria a autorização para movimentação do eventual excedente de funcionários do BNDES para áreas carentes de pessoal no governo. Isso melhoraria o serviço da administração pública e contribuiria para o ajuste do corpo funcional do banco, no contexto da acertada aceleração na devolução de recursos para o Tesouro - R$ 126 bilhões em 2019.
Não será fácil para o BNDES sair da posição confortável de ser o único provedor de crédito de longo prazo. Todavia, caso a estabilidade econômica seja sustentável nos próximos anos, não haverá alternativa senão buscar uma nova missão para a instituição. Sem essa transformação, o BNDES continuará falhando no papel de fomentar o desenvolvimento e será, mais cedo ou mais tarde, desnecessário.
*Nilson Teixeira, Ph.D. em economia pela Universidade da Pensilvânia,
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