Depois de anos de crise, o Brasil mantém o balanço externo em bom estado e dispõe de um volume seguro de reservas, hoje em torno de US$ 380 bilhões, mas até para manter essas condições o País precisa melhorar suas contas públicas e ganhar poder de competição. Isto resume alguns dos principais pontos da avaliação incluída no Relatório do Setor Externo recém-publicado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). São desafios especialmente importantes num quadro global inseguro, marcado por medidas protecionistas e, segundo o documento, pelos perigos associados à tensão entre Estados Unidos e China, as duas maiores economias.
Divulgado uma vez por ano, esse estudo contém um amplo retrato do comércio internacional de bens e serviços, do movimento de capitais, da variação de reservas e das políticas de câmbio, além de uma avaliação das condições e das perspectivas globais dos mercados.
O Brasil é uma das 30 grandes economias selecionadas para análise individual no fim do relatório. Em 2018, ano tomado como referência, a posição externa do Brasil estava “amplamente em linha” com os fundamentos de longo prazo e com “as políticas desejáveis”. O buraco nas transações correntes, um dos menores nas economias analisadas, correspondeu a 0,8% do Produto Interno Bruto (PIB) e foi facilmente financiado com investimento estrangeiro direto. O País, segundo o texto, “continua atraindo consideráveis fluxos de capital”.
A política de câmbio flexível, bem avaliada, tem facilitado a absorção de choques externos. O volume de reservas, de US$ 375 bilhões no fim de 2018 e hoje superior a US$ 380 bilhões, é visto como adequado. O governo, recomendam os autores do relatório, deveria manter fortes amortecedores.
O texto se limita a essa recomendação, no caso do volume de reservas. A equipe econômica deveria levar em conta esse ponto de vista. Já surgiu, no atual governo, proposta de venda de reservas para cobrir parte da dívida pública. É uma ideia obviamente perigosa. Se as causas do endividamento permanecerem, a dívida pública voltará a crescer, o estoque de dólares terá diminuído e o País estará menos seguro se ocorrer um choque externo mais perigoso.
O relatório contém outras advertências importantes. Se a economia crescer mais rapidamente do que nos últimos anos, o déficit em transações correntes deverá aumentar e talvez atingir 2% do PIB. Não será uma condição de alto risco, mas será preciso manter as contas externas sob controle. Para isso – e também para garantir uma prosperidade sustentável – será indispensável arrumar as contas públicas e isso deverá incluir a reforma da Previdência.
A expansão econômica mais firme dependerá de mais investimentos produtivos. Será conveniente aumentar a capacidade interna de poupança, além de continuar atraindo poupança externa. O relatório menciona também a criação de um ambiente mais favorável aos negócios, um detalhe geralmente lembrado nos estudos sobre competitividade.
No caso do Brasil, mesmo um exame das contas externas, o lado mais saudável da economia, acaba levando a recomendações sobre a pauta de ajustes e reformas e sobre as condições necessárias a um maior poder de competição. O País deve continuar atraindo capitais de fora e isso será um importante fator de segurança, mas o interesse dos investidores estrangeiros, advertem os técnicos do FMI, poderá diminuir, se falhar o ataque aos problemas estruturais.
No exame do quadro global, o relatório chama a atenção para a insuficiência das medidas protecionistas quando se trata de combater grandes desequilíbrios. Isso é visível no caso dos Estados Unidos. Os desajustes continuaram, apesar das barreiras contra produtos chineses. Além disso, o protecionismo distorce as condições do comércio e, quando praticado por grandes potências, pode prejudicar a economia global. Se as barreiras já implantadas forem mantidas e surgirem novas medidas protecionistas, o PIB global em 2020 poderá ser diminuído de 0,5%. Todos perderão com a briga das maiores potências.
Nenhum comentário:
Postar um comentário