- O Estado de S.Paulo
A reforma tributária é a primeira vítima do desacerto político
O caldo entornou de vez entre a Câmara e o Senado por conta da proposta de reforma tributária.
As lideranças das duas Casas não conseguem chegar a um acordo nem mesmo sobre o comando da comissão mista informal que seria criada para buscar uma convergência entre as duas propostas de reforma que tramitam no Congresso: a PEC 45, patrocinada pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e a PEC 110, bancada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre.
A coluna apurou que a Câmara propôs ao Senado a presidência da comissão mista para o senador Roberto Rocha (PSDB-MA) e a relatoria da proposta para o líder da maioria, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). O Senado disse não e não. O acordo pode naufragar. Aguinaldo é o atual relator da PEC de reforma da Câmara e Rocha, da proposta do Senado.
A criação da comissão mista faz parte do acerto dos presidentes Maia e Alcolumbre com o ministro da economia, Paulo Guedes, para a divisão da forma de tramitação das próximas reformas que serão enviadas pelo governo, depois da previdenciária aprovada na última semana.
Apesar do acordo para as reformas de gastos, do Pacto Federativo e administrativa (serviço público), a tributária ficou sem rumo certo e acabou sendo postergada para 2020.
O descontentamento foi grande com a iniciativa do líder do governo, Fernando Bezerra (MDB-PE), de anunciar no meio da semana um acordo para o adiamento da reforma tributária para o ano que vem. “Não tem acordo”, reagiu Aguinaldo em conversa com a coluna.
Só depois dessa convergência é que o governo enviaria a proposta de unificação do PIS e Cofins, um projeto mais enxuto de reforma. Agora, nem isso está garantido com o clima de animosidade em torno da reforma tributária. Ao repórter Daniel Weterman, do Broadcast, Rocha também não escondeu o descontentamento com o caminho dado para a tributária.
“Não tem previsão regimental para comissão mista. O mais legítimo e razoável é que a reforma administrativa seja pautada prioritariamente na Câmara e a reforma tributária, no Senado”, reclamou o tucano, que briga pelo protagonismo da sua proposta, que foi feita pelo ex-deputado Luiz Carlos Hauly na Legislatura anterior e resgatada pelo presidente Alcolumbre para contrapor à proposta da Câmara.
Na Câmara, a estratégia agora será dar velocidade à PEC 45, que continuará sendo tocada independentemente da instalação da comissão mista, que não tem previsão regimental.
O autor da PEC 45 e líder do MDB na Câmara, Baleia Rossi (SP), adiantou que as conversas do relator com os setores mais refratários ao modelo estão adiantadas. São eles: transporte público, serviços e construção civil.
Os consultores da Câmara que trabalham para o relator Aguinaldo Ribeiro têm buscado uma solução para mitigar os efeitos negativos no impacto nos preços com a criação no Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), tributo que seria criada com a PEC 45 nos moldes do Imposto sobre Valor Agregado (IVA). Um modelo de desoneração da folha também está avançado. Uma das maiores preocupações é com o preço das tarifas no transporte urbano.
De nada adianta avançar sem acordo, já que os presidentes das duas Casas têm domínio da pauta. Cada lado da disputa pela reforma tributária avalia que a sua proposta é melhor. Também os partidos de oposição, com o apoio de um grupo de governadores dos Estados do Nordeste, já apresentaram uma emenda à PEC 45 para criar uma reforma tributária solidária, que aborda também mudanças no Imposto de Renda, tributação sobre lucros e dividendos e herança com a meta de diminuir as desigualdades do País.
Com tantas propostas na mesa, mas sem nenhum acordo próximo até agora, é lamentável que logo a reforma capaz de mudar a cara do caótico e distorcido sistema tributário brasileiro acabe ficando para depois.
A reforma tributária é a primeira vítima do desacerto político. O ministro da Economia vem segurando o envio da sua proposta para não desagradar os dois lados às vésperas do lançamento do seu ambicioso plano econômico de criar um novo arcabouço institucional para as contas públicas e a Federação.
É inacreditável que após tantas promessas de mudanças na tributação ao longo dos últimos meses, desde a campanha e mais tarde na transição de governo, não tenha ocorrido avanços concretos. O ano vai acabar sem a redução do Imposto de Renda das empresas e as mudanças na tributação das pessoas físicas.
Com tantas PECs (o pacote de Guedes exigirá a aprovação de pelo menos três) que vão tramitar no Congresso, o próximo ano, sem dúvida, será consumido pelos debates dessas propostas. Se não houver correção de rumo, será um sonoro não que o governo e as lideranças estarão dando à reforma tributária. Ainda há tempo de corrigir o passo.
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