sexta-feira, 6 de março de 2020

Celso Ming - A turbulência cresce e aumenta as incertezas

- O Estado de S.Paulo

Analistas continuam no escuro sobre o impacto do coronavírus na economia mundial

Os analistas continuam no escuro sobre o impacto do surto do coronavírus na economia mundial. No Brasil, a escuridão parece ainda mais densa. Sobram palpites e até apostas de vários calibres, que, no entanto, não passam de palpites e de apostas. Enquanto isso, o medo se espalha e vai empurrando pessoas e empresas para refúgios seguros, seja lá o que isso hoje signifique.

A Organização Mundial da Saúde (OMS), instituição melhor informada sobre o que acontece, vem passando sinais contraditórios. Reconhece, por exemplo, que a China, epicentro da epidemia, vem contendo o vírus com impressionante rapidez. Mas não esconde que o flagelo se alastra pelo resto do mundo, a ponto de estar muito perto de reconhecer a existência de uma situação geral de pandemia.

Os governos dos senhores do mundo, o G-7 (do Grupo dos Sete), prometem ação coordenada de políticas públicas, tanto na área de saúde para estancar o contágio quanto na da economia, para contra-atacar os efeitos paralisantes sobre a atividade produtiva, o emprego e o mercado de ativos financeiros.

Enquanto isso, os grandes bancos centrais ou voltaram a derrubar os juros ou se preparam para isso, que é para irrigar a economia com mais recursos e mais crédito. Mas sobre essa decisão pairam mais dúvidas do que certezas. O caroço do problema não é nem de falta de dinheiro nem de falta de crédito. Os juros nos países avançados já estão tão baixos – em grande número de países, chegam até a ser negativos –, que fica difícil imaginar como juros ainda mais baixos possam ajudar a recuperar a economia.

O Banco Central do Brasil parece confuso. Passa o recado de que a disparada do câmbio não tem justificativa técnica e se dispõe a combater o que entende tanto como excesso de volatilidade das cotações quanto atividade especulativa. Mas mostra pouca firmeza na empreitada baseada nesse diagnóstico. Nesta quinta-feira, por exemplo, mesmo depois de terem subido pela 12.ª diária consecutiva (veja gráfico) para níveis históricos, as cotações do dólar em reais pareceram insensíveis aos três leilões de dinheiro novo, de US$ 1 bilhão cada um, em contratos de swaps (leilão de títulos em reais que garantem correção cambial).

O outro assunto são os juros. Em comunicado oficial extraordinário divulgado terça-feira, o Banco Central admite que os estragos globais causados pelo surto do coronavírus produzirão consequências também na economia brasileira. A principal delas é a derrubada dos preços globais das commodities, especialmente petróleo, minério de ferro e grãos, itens que compõem mais de 50% das exportações brasileiras. Trata-se de impacto mais deflacionário do que o efeito da alta do dólar pode ter de inflacionário. Daí a nova disposição de reduzir ainda mais os juros também no Brasil.

A maior dúvida, também por aqui, é se juros ainda mais baixos, portanto se o despejo de mais moeda na economia, será recurso suficiente para virar um jogo hoje perdedor.

É quase unanimidade entre os mais competentes analistas do mundo que mais afrouxamento da política monetária pode pouco ou quase nada contra um problema cuja natureza não é monetária. Daí a advertência de que a principal resposta terá de vir da política fiscal. Ou seja, espera-se que os governos gastem mais, principalmente em obras públicas, para irrigar a economia e dar mais emprego.

O problema aí é o de que, por todas as partes, os Tesouros estão esgotados. Mais despesas públicas implicam ou aumento de impostos numa paisagem geral de redução de renda ou aumento geral das dívidas públicas num quadro de alto endividamento. E é preciso saber como se comportará a variável política nessa equação complicada.

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