- Folha de S. Paulo
Autoridades econômicas colaboram para aumentar o paniquito no mercado
Era um daqueles dias de pânico nos mercados financeiros, quando muita gente não sabe bem o que está fazendo nem para onde o vento sopra. O ministro da Economia deu mais uns tiros nesse desconcerto.
Para quê? O tempo está fechando. Já há paniquito entre os negociantes de dinheiro grosso, "o mercado", mas também questões reais na praça, além dos lobbies de costume.
Nesta quinta-feira (5), o pessoal da finança pediu ao Banco Central que atenue a corrida do dólar. Foi também dia de pregar que o BC não reduza a taxa básica de juros daqui a duas semanas.
O mercado já jogou a "sua" taxa básica de curto prazo no chão, mas argumenta que nova queda da Selic vai colaborar para alta adicional do dólar e alimentar riscos de inflação, com o que os juros de prazo mais longo já sobem. Na terça-feira (3), o Banco Central sugeriu que tal coisa não tende a acontecer.
Caso fosse duradoura e relevante, essa alta das taxas de juros de prazos mais longos encareceria o financiamento dos negócios, de fato. Mas a alta dos juros mais longos nem durou nada, nem foi relevante e nem alguém tem ideia segura do destino do dólar e de seus efeitos na inflação. Até mesmo o impacto da crise que veio da China no PIB brasileiro é incerto.
O tiroteio de frases de Paulo Guedes pode dar em nada, assim como a desordem desta quinta-feira na praça financeira --por vezes isso simplesmente passa. No entanto, como o governo de Jair Bolsonaro é dado ao disparate atroz contínuo, o ambiente anda estressado e a desconfiança aumenta.
Por exemplo, há cada vez mais fofoca sobre a permanência de Guedes no governo, o que não está em questão, mas é um exemplo dos efeitos nocivos do rumorejo constante, desde janeiro em nível de gritaria graças às crises de Bolsonaro.
No dia depois do pibinho, Guedes:
1) disse que, se "fizer muita besteira", "se o presidente pedir para sair, se todo o mundo pedir para sair", o dólar pode ir a R$ 5;
2) observou que as notícias da relação conturbada de Bolsonaro com o Congresso e o risco de atraso nas reformas contribuem para alta do dólar (não deu para entender se o ministro atribuiu a responsabilidade ao tumulto ou ao fato de o tumulto ser noticiado);
3) fez observações azedas sobre uma declaração de seu secretário do Tesouro ("se o Mansueto [Almeida] estava esperando que fosse crescer 3%, ele deve estar frustrado");
4) disse que sua previsão de crescimento da economia é diferente da estimativa da Secretaria de Política Econômica.
"Se todo o mundo pedir para sair"? Do que se trata?
Guedes disse ainda que, como o Brasil é uma economia fechada, a crise mundial não terá efeitos tão grandes ("quando ventou a favor [no mundo], não pegou, quando ventar contra, também não pega tanto"). Hum.
Não tem sido esse o caso do último quarto de século, por exemplo, quando a economia brasileira passou a sentir especialmente as variações da economia chinesa e seus impactos nos termos de troca (a relação entre os preços das exportações e das importações brasileiras). Uma queda relativa do preço dos bens que exportamos, dominados por commodities, tende a reduzir o crescimento brasileiro. Não é destino, mas é provável.
Em si mesmas, em um ambiente e país mais normais, uma afirmação dessas de Guedes não faz lá diferença. Soltar todas elas em apenas um dia, dia de paniquito, em país ainda mais conturbado pela sensação crescente de desgoverno, confirma essa impressão de que a coisa está desgovernada.
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