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Em nome da liberdade da imprensa dele
O que notícia falsa tem a ver com liberdade de expressão? Nada. Por falsa, a notícia só causa prejuízo às pessoas que as recebem, acreditam nelas e ajudam a disseminá-las. Seus autores escapam impunes porque quase sempre são anônimos.
Favor não confundir notícia falsa, criada com o propósito de enganar e estimular o ódio, com notícia errada. Jornalista, quando erra, é obrigado a admitir o erro e a corrigir-se. Se não o faz, perde credibilidade, seu maior ativo, e pode ser processado.
O presidente Jair Bolsonaro, embora enfermo, fez questão de protagonizar, ontem, mais uma de suas lives no Facebook – logo onde… E saiu em defesa das pessoas que tiveram suas páginas cassadas pelo Facebook por publicaram notícias falsas.
Uma dessas pessoas é seu assessor especial, uma das cabeças do chamado “gabinete do ódio”, que trabalha ao lado de sua sala no terceiro andar do Palácio do Planalto. Depois do seu filho Carlos, é o marqueteiro digital favorito de Bolsonaro.
Em termos mais brandos, Bolsonaro voltou a criticar a imprensa e a desafiá-la a apresentar uma única notícia falsa que ele ou a sua turma divulgou (e o kit-gay, hein?). E no seu papel favorito de vítima da esquerda que quer derrubá-lo, afirmou a certa altura:
– Não podemos perder essa liberdade da imprensa. Isso me elegeu presidente da República.
“Essa liberdade da imprensa”, salvo interpretação errada, seria a liberdade de seus seguidores de o defenderem, mesmo valendo-se de notícias falsas. Por que ele e seus filhos foram contra a Comissão Parlamentar de Inquérito das fake news?
Por que andam tão assustados com o inquérito conduzido no Supremo Tribunal Federal pelo ministro Alexandre de Moraes que investiga a postagem de notícias falsas? Se forem inocentes como dizem ser, por que se portam como aliados de criminosos digitais?
Uma vaga de ministro do Supremo para quem mais agradar Bolsonaro
Tem um novo golpe na praça
O crime compensa, a levar-se em conta a decisão do ministro João Otávio Noronha, presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que concedeu habeas corpus não só a Fabrício Queiroz, sócio de Flávio Bolsonaro no esquema da rachadinha, mas também à sua mulher, Márcia, procurada pela polícia e foragida há 21 dias sob a proteção de milicianos. Ela já pode reaparecer.
Se não for revogada quando o plenário do tribunal a examinar depois das férias de julho do Judiciário, a decisão beneficiará no futuro pessoas suspeitas ou comprovadamente criminosas que para escapar à prisão prefiram fugir a se entregar. Esse é o aspecto mais “chocante”, “absurdo”, “vergonhoso” e “bizarro” da decisão, segundo ministros do próprio STJ e do Supremo Tribunal Federal.
Noronha concordou com os argumentos de defesa do casal de que Queiroz, por ter se operado de um câncer, correria risco menor de contrair o coronavírus se fosse mandado para casa. E que uma vez em casa, precisava dos cuidados da mulher. Há vídeos e fotos que mostram Queiroz dançando ainda no hospital depois de operado, fazendo churrasco em Atibaia, e sem a mulher.
Há mais de um ano que Queiroz estava sob o controle de Frederick Assef, advogado da família Bolsonaro. Abrigou-se em três imóveis de Assef entre o Rio e São Paulo. Na maior parte do tempo sozinho, vigiado por caseiros que informavam ao advogado sobre todos os seus passos. Era uma espécie de prisão domiciliar sem a tornozeleira eletrônica que agora será obrigado a usar.
Queiroz, preso, na Penitenciária de Bangu, no Rio, poderia sentir-se tentado a contar o que sabe sobre os Bolsonaro em troca de uma pena mais branda. Se sua mulher acabasse presa também, aumentariam as chances de ele delatar. Sua filha mais velha é personagem do esquema da rachadinha e deverá depor. Foi funcionária do gabinete do então deputado federal Jair Bolsonaro.
O presidente da República contraiu uma dívida impagável junto a Noronha. Os dois se tornaram amigos depois de Bolsonaro se eleger. Na posse do atual ministro da Justiça, ao saudar Noronha ali presente, Bolsonaro não se conteve e derramou-se em elogios a ele:
– Prezado Noronha, permita-me fazer assim, presidente do STJ. Eu confesso que a primeira vez que o vi foi um amor à primeira vista. Me simpatizei com Vossa Excelência. Temos conversado com não muita persistência, mas as poucas conversas que temos o senhor ajuda a me moldar um pouco mais para as questões do Judiciário.
O ministro fez por merecer o “amor à primeira vista”. Levantamento feito pelo O Estado de S. Paulo nas decisões individuais tomadas por Noronha entre 1º de janeiro do ano passado a 29 de maio último, aponta que ele atendeu aos interesses do governo em 87,5% dos casos que julgou. É uma marca que faz dele o mais confiável juiz aliado de Bolsonaro.
Mas essa história de que o presidente não tem como pagar o que deve ao ministro não passa de lugar comum. Tem como pagar, sim. Basta indicá-lo para a próxima vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal a abrir-se no final deste ano com a aposentadoria de Celso de Mello, o decano da Corte. É o que Noronha deseja. É o que Bolsonaro já mandou lhe dizer que seria possível.
O “golpe da vaga de Celso” está sendo aplicado à farta pelo governo sempre que se vê em apuros, segundo confessa um ministro militar com gabinete no Palácio do Planalto. Até aqui, ela foi prometida a meia dúzia de pessoas. E é natural que todos a ambicionem e se esforcem por obtê-la. Outra vaga, a do ministro Marco Aurélio Mello, será aberta em 2021, mas já está sendo oferecida na praça.
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