Desigualdade se reflete nos homicídios, concentrados em negros, pobres e jovens
Registrou-se, no ano de 2018, uma mais que bem-vinda queda do vergonhoso número de homicídios no Brasil, repetida com maior vigor no ano passado. O detalhamento dos números, no entanto, revela desigualdades cruéis nessa melhora.
Foram assassinados 58 mil brasileiros em 2018, o que correspondeu a uma taxa de 27,8 por 100 mil habitantes. Do total de mortos, nada menos de 75,7% eram negros (pretos e pardos), segundo o recém-divulgado Atlas da Violência 2020, elaborado pelo Ipea e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Uma década antes, em 2008, a participação dos negros no total de vítimas de homicídio se mostrava significativamente menor, 65,5%. Dito de outro modo, a violência fatal aumentou no período para os pretos e pardos, enquanto caía para os demais grupos.
Não se pode afirmar que são sempre brancos a matar negros —inexistem dados a respeito dos homicidas. Mas resta evidente a deprimente vulnerabilidade dos segundos —que há dois anos perfaziam 55,8% da população e 75% dos miseráveis— ao morticínio.
As desigualdades não se verificam apenas em cor e renda. A taxa de assassinatos por 100 mil habitantes varia de 8,2 em São Paulo a 71,8 em Roraima; chega a 60,4 entre jovens de 15 a 29 anos, mais que o dobro da medida no país se consideradas todas as faixas etárias.
Homens constituem 92% das vítimas de homicídios; ainda assim, entretanto, o Brasil ostenta a macabra estatística de uma mulher morta a cada duas horas.
Em sua totalidade, as cifras brasileiras são escandalosas em qualquer comparação internacional, a despeito da ainda mal compreendida redução nos últimos dois anos. E, o que é mais grave, existem sinais de nova piora neste 2020.
Entre as hipóteses para a queda estão os esforços de governos estaduais no combate à violência, a diminuição dos confrontos entre facções criminosas e as mudanças demográficas, que levam a menor proporção de jovens na sociedade.
No sentido oposto podem atuar os retrocessos, estimulados em especial pelo governo Jair Bolsonaro, no processo de desarmamento da população. O Atlas da Violência contou uma lei, 11 decretos e 15 portarias com incentivos à disseminação de armas de fogo e munição.
Se as causas não parecem claras, é fácil prever quais serão os maiores atingidos por um eventual recrudescimento dos assassinatos: os jovens, negros e pobres.
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