Ainda que feitas em período eleitoral, são graves as denúncias de corrupção dentro da prefeitura
Não se pode ignorar a possibilidade de motivação política ao analisar a proliferação, em período eleitoral, de operações policiais contra candidatos ou pré-candidatos, como ocorreu nos últimos dias com o prefeito do Rio, Marcelo Crivella (Republicanos). Crivella não é o único a ter de enfrentar os tentáculos da Justiça às vésperas da eleição — Cristiane Brasil (PTB) e Eduardo Paes (DEM) também foram alvos de operações. Para além da eventual estranheza que a coincidência de calendário cause, é preciso avaliar cada ação pelo próprio mérito.
E, no mérito, são graves as denúncias do Ministério Público do Rio que apontam o empresário Rafael Alves como operador de um esquema que se estendia a mais de 20 órgãos da prefeitura carioca, atingindo setores essenciais como Saúde e Educação. De acordo com as investigações, o apoio financeiro a Crivella na eleição de 2016 transformou Alves em aliado influente nos bastidores. Embora não ocupasse cargo no município, mandava e desmandava no governo Crivella. Tinha até sala na Cidade das Artes, na Barra, onde, diz o MP, recebia malas de dinheiro.
Era ele, segundo a denúncia, quem decidia as dívidas prioritárias que a prefeitura deveria saldar, à base de propinas. De acordo com o MP, intermediava contratos, fazia nomeações para cargos importantes — como o irmão, Marcelo Alves, na presidência da Riotur —, exonerava funcionários e interferia em decisões técnicas — em 2018, mandou suspender a demolição de parte da casa do senador Romário, na Barra, determinada pela Secretaria de Urbanismo.
Alves conseguiu até o que parecia improvável: que Crivella, conhecido por desprezar o carnaval, intercedesse para evitar o rebaixamento do Império Serrano e da Grande Rio em 2018. Em mensagem enviada ao doleiro Sérgio Mizrahy — que fez delação premiada —, Alves deixa claro seu poder na prefeitura: “Assim, todos viram que quem manda sou eu e ponto. A caneta é minha, não de A ou B, e sim só minha”.
As investigações mostram que ele tinha intimidade com Crivella, seu vizinho no Condomínio Península, na Barra. Entre maio de 2016 e março deste ano, eles trocaram, pelo cálculo do MP, 1.949 mensagens. Crivella chegou a ligar para um dos celulares de Alves durante uma operação, em março. Desligou ao perceber que não falava com ele — do outro lado da linha estava um delegado. Na última quinta-feira, mandados de busca e apreensão foram cumpridos na sede da prefeitura, no Palácio da Cidade e na casa de Crivella, cujo celular foi apreendido. Num despacho da desembargadora Rosa Helena Guita, que autorizou a Operação Hades, ela ressalta que “a subserviência do prefeito a Rafael Alves é assustadora”. Muita coisa ainda pode vir à tona.
Crivella precisa prestar contas dessas relações espúrias, inaceitáveis não só à Justiça, mas também à população, refém de infindáveis esquemas de corrupção, em que os recursos do Erário são drenados por organizações criminosas. Que o esquema tenha sido descoberto em período pré-eleitoral não significa que deva passar impune.
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