terça-feira, 15 de setembro de 2020

Bernardo Mello Franco - Diplomacia da submissão

- O Globo

Na semana passada, Jair Bolsonaro aproveitou o feriado da Independência para fazer mais um pronunciamento na TV. “Naquele histórico 7 de setembro de 1822, às margens do Ipiranga, o Brasil dizia ao mundo que nunca mais aceitaria ser submisso a qualquer outra nação”, disse. Dom Pedro guardaria a espada se soubesse o que fariam com seu brado retumbante.

Desde a vitória do capitão, o Brasil diz ao mundo que aceita ser submisso à Casa Branca. Outros governos já haviam se ajoelhado diante dos EUA, mas nem a ditadura militar foi tão servil nas relações com o país.

Para agradar Donald Trump, Bolsonaro tem jogado no lixo décadas de política externa independente. Em vez de defender o interesse nacional, a diplomacia brasileira passou a defender o interesse de Washington. A vassalagem acaba de se repetir na disputa pelo comando do Banco Interamericano de Desenvolvimento.

Fundado em 1959, o BID sempre foi presidido por um latinoamericano. Um acordo entre os países reservava a vice-presidência aos EUA. Desta vez, Trump resolveu ignorar a regra e indicou um ex-assessor para chefiar o banco. O Brasil já havia lançado candidato, mas voltou atrás e traiu os vizinhos para apoiar a manobra.

Em plena Semana da Pátria, o Itamaraty festejou a eleição do americano Mauricio Claver-Carone. Mais um gesto de submissão a Trump, que já debochou dos esforços de Bolsonaro para imitá-lo.

Além de humilhar a diplomacia brasileira, a subserviência demonstra falta de visão estratégica. O republicano aparece em desvantagem nas pesquisas para a eleição de novembro. Se o democrata Joe Biden chegar lá, seu partido deve incentivá-lo a retaliar o capitão.

No sábado, o Ministério das Relações Exteriores afirmou que a vitória de Clever-Carone honrou “valores comuns e fundamentais às Américas”. A nota ajudará a contar a história do desmanche do Itamaraty na gestão do bolsonarista Ernesto Araújo.

Outras páginas terão que ser escritas mais tarde. O governo alterou a classificação de papéis para esconder instruções que aproximaram o Brasil de teocracias islâmicas na ONU. Os telegramas ficarão em sigilo até 2025.

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