Os
últimos meses causaram fissuras profundas na aprovação de que Jair Bolsonaro
gozava junto a alguns dos grupos responsáveis por levá-lo ao Planalto em 2018.
Ele perdeu completamente os lavajatistas, está com a relação abalada com os
fanáticos ideológicos e, diante da intervenção na Petrobras, vê abalada também
a confiança (que parecia inesgotável) da elite econômica, composta por
integrantes do mercado financeiro e o empresariado industrial e do agro.
Hoje,
o governo Bolsonaro é composto basicamente por uma aliança entre o Centrão e os
militares (incluindo aqui as polícias militares), uma combinação bastante
esdrúxula e preocupante no que pode oferecer de riscos à democracia, em
primeiro lugar, e a qualquer ilusão de que se vá promover algum ajuste fiscal.
Paulo Guedes é uma espécie de estranho nesse ninho. No fim de semana, o ministro da Economia permaneceu em silêncio obsequioso diante da intervenção com mão grande de Bolsonaro na Petrobras e o anúncio de que pretende fazer o mesmo com as tarifas de energia elétrica (Dilma, é você?).
Coube
a Bento Albuquerque, o ministro de Minas e Energia que Bolsonaro vira e mexe
ameaça demitir, tentar colocar panos quentes com os integrantes do Conselho da
Petrobras, e à dupla dinâmica da Comunicação, Fábio Faria e Fábio Wajngarten,
ir para as redes sociais dizer que estava tudo bem e que o que o presidente fez
na Petrobras é apenas um gesto normal numa economia de mercado. O que todo
mundo sabe que não, não é.
A
tentativa dos dois é evitar o esperado strike nas ações da empresa e nos demais
indicadores na abertura dos mercados, nesta segunda-feira. Mas o fato de terem sido
eles a sair em defesa do gesto de Bolsonaro mostra que sim, o Centrão ganha
espaço mesmo em áreas que antes não se poderia supor. Afinal, o que Faria, um
expoente do grupo e responsável por quebrar as barreiras que havia entre o
capitão e esses partidos, tem a dizer sobre algo tão complexo quanto a gestão
de uma empresa de economia mista?
O
avanço do Centrão é tal que ninguém tenta mais nem disfarçar. Em entrevista ao
GLOBO, o presidente da Câmara, Arthur Lira, não usou de meias palavras: o
objetivo do grupo é ter o controle do Orçamento.
Diante
disso, da militarização inclusive de postos-chave da área econômica e da
evidência de que Bolsonaro descambou de vez para o populismo reeleitoreiro,
resta a Paulo Guedes a pergunta que fiz aqui na sexta-feira: até quando,
ministro?
A
pergunta não se aplica só a ele. Sondagem da XP com investidores institucionais
no fim de semana mostrou a esquizofrenia que reina no mercado: mesmo 80%
dizendo que Bolsonaro voltará a intervir na economia, 76% esperam a
continuidade da política fiscal, como se isso fosse um fator de permanência da
confiança. Mas qual política fiscal quando o que se decide é uma nova cláusula
de calamidade que permita pagar o auxílio emergencial (absolutamente
necessário, mas que não se encaixa nesse discurso) e o Centrão se prepara para
tomar conta do Orçamento?
Da
mesma forma, outros agentes institucionais, inclusive o Conselho da Petrobras,
assistem a cada avanço de Bolsonaro na supressão da democracia e ampliação de
seus poderes e da presença de militares em lugares que nada têm a ver com sua
missão constitucional e fazem o mesmo balé: se chocam, ameaçam reagir, mas
cedem. Cedem sempre.
A
cada concessão a fatos como a nomeação do general Joaquim Silva e Luna para a
empresa é uma casa que Bolsonaro avança num tabuleiro que leva a 2022. Quando
se tentar reagir a alguma dessas investidas, o presidente estará fortalecido
demais e com o controle de áreas que poderão dar a ele o que nem mais esconde:
a possibilidade de ao menos tentar "mudar o regime", como ele deixou
claro que gostaria de fazer em mais uma fala sincericida neste fim de semana.
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