Depois
de fracassar na primeira tentativa de impedir a CPI da Covid-19, convencendo
senadores a retirar assinaturas do requerimento por sua criação, o governo
Bolsonaro agora tenta interferir na escolha dos integrantes, garantindo que a
maioria seja a seu favor. Nesse xadrez, o bloco formado pelo PSDB e pelo
Podemos é hoje o fiel da balança.
Pelas
contas dos líderes partidários, o bloco indicará dois membros titulares da CPI.
Como a oposição já tem garantidos hoje cinco dos 11 membros titulares (um do
PT, um do bloco Rede-Cidadania e três do MDB) e o governo, quatro (um do PP, um
do PL, um do PSD e um do DEM), os dois senadores do bloco (PSDB-Podemos) farão
a diferença. A depender de quem for escolhido, a CPI poderá ser mais
governista ou mais anti-governo.
Tanto
no Podemos como no PSDB há senadores mais críticos ao governo e outros mais
alinhados ao bolsonarismo. Como o Podemos é uma incógnita para os articuladores
de ambos os lados, a pressão no final de semana se concentrou sobre os
tucanos.
Três dos quatro tucanos que assinaram o pedido de CPI são oposicionistas — José Serra e Mara Gabrilli, de São Paulo, e Tasso Jereissati, do Ceará. Por isso, o bloco de oposição pediu ao governador de São Paulo, João Doria, que entrasse nas articulações para tentar garantir que Jereissati integrasse a CPI.
Doria
falou com Jereissati na sexta-feira. Mas o senador, que tem 72 anos e
faz parte do grupo de risco para a Covid-19, está isolado em Fortaleza e
resiste a participar das sessões presenciais que podem vir a ser
convocadas.
Se
ele de fato não for para a comissão, Mara Gabrilli é a opção mais provável. A
decisão será tomada nesta segunda-feira.
A
julgar pelas negociações do final de semana, o jogo na CPI será pesado. Não
só pelas conversas entre o presidente Jair Bolsonaro e senadores, como Jorge
Kajuru (Cidadania-GO), defendendo a ampliação do escopo das investigações para governadores e
prefeitos e querendo revidar com pedidos de impeachment de
ministros do Supremo. Mas também porque ela deverá ser composta
majoritariamente por veteranos.
Do
lado do governo, é o próprio Ciro Nogueira, senador pelo Piauí e
presidente do PP, quem vai integrar a CPI. A candidata mais óbvia era
Kátia Abreu (PP-TO), que chegou a reivindicar o posto. Mas ela foi preterida
por ser considerada "muito independente" e
"incontrolável", nas palavras de lideranças do partido. A opção por
Nogueira não só quer dizer uma atuação 100% alinhada com o governo, mas também
"profissional".
Isso
porque o MDB, que deverá ter direito a três membros, indicou que pretende
apontar três senadores experientes e que têm feito oposição a Bolsonaro: Renan
Calheiros, de Alagoas, Jader Barbalho, do Pará, e Eduardo Braga, do Amazonas.
Calheiros é, hoje, um forte candidato a presidir a CPI.
Calheiros
e Barbalho são também pais de governadores e devem se opor à ampliação do
escopo da CPI. O filho de Jader, Helder Barbalho, do Pará, foi inclusive alvo
de uma operação da Polícia Federal em setembro passado, numa apuração de desvio
de recursos destinados ao combate à Covid.
No
campo da oposição, todos os movimentos têm sido calculados para evitar
tentativas de melar a CPI. Para o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), um
dos autores do pedido que deu origem à liminar de Barroso, a própria natureza
da CPI restringe a margem de manobra do governo. Isso porque, diferente das
CPIs mistas, como a das fake news, em que também há deputados entre seus
membros, ela será composta apenas por senadores.
"É
um grupo mais restrito, diferente da CPI das fake news, que virou um
zoológico", comenta Vieira. "Ali havia uma fauna variada,
bolsonaristas e oposicionistas, era mais fácil tumultuar os trabalhos. A forma
de atuação parlamentar do Senado é diferente. A grande maioria tem compreensão
dos desdobramentos que a CPI terá na política e na nossa sociedade."
Para
tentar anular a acusação de que a CPI visa perseguir Bolsonaro, que vinha tendo
a adesão de parte dos senadores, Vieira (Cidadania-SE) declarou que atos
conexos ao objeto central da investigação — erros cometidos pelo governo
federal e as responsabilidades pelo colapso no Amazonas — podem ser alvo
da CPI. "Mas tem que ter relação com o objeto da comissão, não pode ser
algo aleatório".
Randolfe
Rodrigues (Rede-AP), líder da oposição e autor do requerimento para a criação
da CPI, avalia que será difícil para o presidente "bagunçar a
investigação", porque o caso do colapso do Amazonas deverá ser apurado
primeiro.
“Se o governo quer convocar governadores, então comecemos pelo do Amazonas. Ou ele confessa a sua responsabilidade pela falta de oxigênio em Manaus ou ele admite a culpa do ex-ministro Eduardo Pazuello. Vamos ouvi-lo”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário