- O Globo
A discriminação racial é um problema que
acompanha a população negra desde o século XVI, com o início do tráfico de
pessoas escravizadas e o fundamento moral e religioso de que o negro não tinha
alma. Com o passar do tempo, nossa condição de ser humano passou a ser
reconhecida pela sociedade, mas, infelizmente, não atingimos o mesmo patamar de
acesso a direitos e bens da vida que compreendem a dignidade da pessoa humana,
previstos em nossa Constituição Federal.
Nesse percurso até os dias atuais, a forma de demonstração do racismo também foi evoluindo. Novas técnicas surgem e novas formas de exclusão nascem com elas. Em outras palavras, quando uma realidade é restrita na sua criação, quando há um foco para agradar um público específico, outro sem-número de pessoas fica de fora de todo o processo, restando prejudicado.
A título de exemplo, temos as fotos que
todos gostamos de fazer e postar nas redes sociais, que tendem a representar de
modo mais exato pessoas de pele mais clara que as de pele mais escura. Isso
quer dizer que as máquinas fotográficas são racistas? Claro que não, mas elas
foram feitas por seres humanos, e sua tecnologia acabou se tornando excludente
de parcela significativa da população.
O uso de computadores, inteligência
artificial e outras novidades técnico-científicas é muito importante, mas não
pode ter um status de ser imparcial, infalível ou incontestável, porque se
trata de uma construção com base num critério que exclui a população negra.
Um documentário extremamente interessante,
“Coded Bias”, conta a história de uma pesquisadora do MIT, Joy Buolamwini, que
descobriu falhas na tecnologia de reconhecimento facial. Basicamente, os
programas desse tipo não identificam com precisão rostos de pessoas negras, o
que levanta uma série de questionamentos acerca do uso dessa tecnologia pelo
Estado e pela iniciativa privada. O principal ponto: qual seria a extensão de
dano que esses algoritmos podem gerar em nossas vidas?
Outro ponto de grande repercussão sobre a
população negra acerca do tema é a utilização desses programas para o
reconhecimento de criminosos. Que tipo de acuidade é aceitável para isso ser um
legítimo braço investigativo e punitivo do Estado?
Outro caso interessante, que não diz
respeito à etnia, mas sim ao gênero, foi um relativo a certo cartão de crédito.
Marido e mulher, casados em comunhão total de bens, sendo titulares das mesmas
contas, tinham autorização para abertura de limite de seus cartões
absolutamente díspares, chegando o homem ter duas vezes mais crédito que a
mulher. A justificativa era que o algoritmo fazia esse trabalho.
Há outros tantos exemplos, como seleção de
emprego, que expõem esse tipo de tratamento desigual exercido pelo programa.
Então, o que acontece?
O computador processa as informações disponíveis na sociedade e replica aquilo que aprende de maneira mais rápida tão somente. Portanto é preciso nos modificarmos enquanto sociedade antes de botarmos nossa fé nas máquinas.
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