O Globo
As crianças brasileiras de 5 a 11 anos
poderiam voltar às aulas em fevereiro já vacinadas, com duas doses, mas o
governo não quis e continua não querendo vaciná-las. A entrevista de ontem no
Ministério da Saúde em que, derrotado, o governo teve que incluir essa faixa
etária no Programa Nacional de Imunização, foi um show de hipocrisia e
dissimulação. Rendidos, ainda assim os integrantes da cúpula do Ministério,
Marcelo Queiroga à frente, continuavam tentando espalhar as mesmas mentiras,
incutir o medo, criar exigências descabidas.
O secretário de vigilância em saúde,
Arnaldo Medeiros, mostrou dados para explicar que o número de infecções em
crianças caiu. Ora, caiu porque houve um aumento da vacinação na população em
geral e, portanto, queda da circulação do vírus.
A secretária extraordinária de Enfrentamento à Covid do Ministério da Saúde, Rosana Leite disse que houve muitas “demandas” e por isso eles “abriram o debate". Na verdade, eles inventaram uma audiência pública que nunca ocorreu no Programa Nacional de Imunização (PNI) para protelar ao máximo a vacinação das crianças. A secretária também disse que é “imprescindível” que se consulte um médico antes de vacinar. Não exigiram porque sabiam que a Justiça derrubaria, mas ela usou estrategicamente a palavra “imprescindível”. Nesse Brasil desigual, consultar um médico é fácil para os ricos e a classe média, mas não para os pobres."
A bula estabelece três semanas de espaço
entre as doses, e o governo estabeleceu quase o triplo do tempo. A secretária
levantou mais um fantasma. Disse que o risco de “miocardite” é menor se o
intervalo for de oito semanas. O ministro Queiroga disse e repetiu que a Anvisa
é que tem a competência da avaliação, e que as grandes agências reguladoras do
mundo aprovaram a vacinação das doses pediátricas. Ora, se é isso, por que ele
inventou tantos obstáculos?
O governo nos fez perder a hora certa. As
crianças precisavam ser vacinadas antes do novo ano letivo. Se não houvesse
tanta manobra protelatória, o país voltaria às aulas muito mais seguro. O
presidente Jair Bolsonaro e o ministro Marcelo Queiroga foram derrotados no
jogo de cena da consulta pública, e ontem tiveram que anunciar que elas estão
incluídas no PNI. Era isso ou a Justiça iria impor, porque o STF já havia
estabelecido prazos para o governo explicar por que não tinha ainda incluído as
crianças.
A cronologia dos eventos é impressionante.
No dia 16 de dezembro, a Anvisa aprovou a vacinação de crianças. No mesmo dia,
o presidente Bolsonaro, em uma live, ameaçou divulgar os nomes dos técnicos da
Anvisa. Deu a senha para os ataques de ódio dos fanáticos da sua rede.
No dia 17, Queiroga disse que o assunto não
era consensual. No dia 19, disse que iria fazer uma análise pública, e que só a
autorização da Anvisa não era suficiente. “Eu sou a principal autoridade
sanitária do país e não abro mão de exercer as minhas prerrogativas, porque
elas decorrem de decisão do mandatário máximo”.
No dia 20 disse que não era preciso
açodamento, porque houve em 2021 “menos de 150 óbitos” de crianças. Afirmou que
não estava menosprezando a vida, mas era exatamente o que fazia. E continuou
fazendo inclusive ontem. No dia 23 disse que era necessária autorização dos
pais, e depois falou em exigir prescrição médica e, por fim, inventou uma
consulta pública.
Perdeu o debate, e perdeu a compostura. O
presidente sempre jogou contra a saúde de todos os brasileiros, desde o início
dessa pandemia. No caso da vacinação de crianças, mais uma vez, Bolsonaro
divulgou mentiras e espalhou temores infundados nos pais e nas crianças. De
Bolsonaro se espera qualquer perversidade. Marcelo Queiroga é médico, em algum
momento da sua vida ele fez o juramento de Hipócrates.
Que ganho político Bolsonaro e Queiroga
pensam que terão falando para a sua seita de fanáticos? Queiroga disse que a
compra da vacina vai depender da adesão dos pais. Ele ainda joga contra a
vacinação. O ministro faz isso por sabujice, seus secretários lhe seguiram nos
modos. Pelo grau de dissimulação da fala de ontem de Queiroga, ele deve pensar
que o país esquecerá o que ele fez neste verão.
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