O Estado de S. Paulo
Previsão do Boletim Focus para a variação
do produto deste ano vem caindo, e a queda desta semana foi bem mais forte.
O primeiro Boletim Focus, do Banco
Central, de 2022, publicado na segunda-feira passada, revelou cenário mais
difícil para o Produto Interno Bruto (PIB) deste ano do que o observado em
2021. O boletim é semanal e suas previsões são colhidas de analistas do mercado
financeiro, na sexta-feira anterior à sua publicação.
A previsão para a variação do PIB de 2022
deste boletim é de apenas 0,36% – na semana anterior, estava em 0,42%, e há
quatro semanas era de 0,51%. Ou seja, vem caindo, e esta última queda foi bem
mais forte.
Quanto a 2021, a previsão é de uma taxa de 4,5%, mas é enganosa quanto ao desempenho do PIB dentro do ano. Ela é calculada usando o PIB previsto para 2021 relativamente ao de 2020, ou seja, entre esses dois anos. Como em 2020 o PIB caiu 3,9%, essa queda faz com que a comparação entre 2021 e 2020 leve a uma taxa bem mais alta do que a que ocorreria se o PIB houvesse permanecido estável em 2020. Vista de outra forma, a taxa de 4,5% é mais determinada pela queda do PIB de 2020 do que pelo seu fraco desempenho em 2021.
Resumindo, fiz cálculos sobre o assunto e
concluí que o crescimento do PIB medido apenas dentro de 2021 foi estimado em
apenas 0,9%, o que contrasta fortemente com o referido aumento de 4,5%, que
o Boletim
Focus apresenta.
Acrescente-se que em 2020 o crescimento do
PIB foi bem maior no primeiro do que no segundo semestre, em larga medida
impulsionado pelo desempenho do agronegócio no primeiro trimestre, que coincide
com o auge das colheitas no meio rural. Mas, em seguida, o desempenho da
economia foi se deteriorando até chegar à situação já mencionada, em que os
analistas do mercado financeiro viraram o ano reduzindo, ainda mais e
fortemente, a sua visão do crescimento do PIB em 2022.
Ainda sobre o PIB, os dados do IBGE de 2019
e de 2020, mais as previsões do Boletim Focus para 2021 e 2022, já permitem
obter uma visão do PIB durante todo o governo Bolsonaro. As taxas anuais do PIB
obtidas dessas fontes são: 2019 (1,2%), 2020 (-3,9%), 2021 (4,5%) e 2022
(0,4%), o que leva à média de 0,6%, inferior ao crescimento da população,
estimado em 0,7% ao ano. Assim, o PIB total cresceu muito pouco e o PIB per capita
caiu. Bolsonaro deverá ser cobrado por isso nos debates eleitorais deste ano.
O que fazer? Sou economista, mas entendo
que o principal problema da economia brasileira é na esfera política. Nossos
políticos, em particular no momento em curso, estão longe de se preocupar com
os problemas econômicos do País, ressalvadas exceções cada vez mais
excepcionais. Começando pelo presidente da República, é como se não tivéssemos
um. E, pior, nem se pode dizer que seja algo como um zero à esquerda. É pior do
que isso, pois seu comportamento tem efeitos econômicos negativos. Não tem
capacidade nem demonstra interesse por uma gestão presidencial eficaz, a ponto
de ter designado o ministro Paulo Guedes como seu “Posto Ipiranga” para
questões sobre a economia. Mas parece que o próprio presidente não se interessa
mais por seus conselhos ao decidir.
Também não o vejo interessado em liderar
uma pauta política de discussões centradas nos principais problemas econômicos
do País. Frágil politicamente, e obsessivamente focado só em sua reeleição,
optou pelo Centrão para se sustentar no poder e obter um novo mandato a um
custo brutal para a economia, pois esse aliado só sabe atuar para atender aos
interesses paroquiais dos congressistas, cuja maioria também não está aí para servir
o País. Matéria de página inteira deste jornal no dia 26/12/2021 teve este
título: Congresso
controla mais de 50% dos investimentos do Orçamento. Entrevistado
sobre o assunto, o deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) afirmou: “Num sistema
presidencialista, é complicado ter um Orçamento parlamentarista”.
Um dos resultados é o agravamento do
endividamento público, pelo qual o mercado financeiro passou a cobrar mais
caro, o que também agrava a dívida. Título de matéria no jornal Valor de
ontem ilustra essa dificuldade: Risco fiscal piora e juros disparam. E as
preocupações quanto à solvência do governo pressionam, também, a taxa de câmbio
e geram efeitos inflacionários.
O que precisa acontecer em 2022 para o
Brasil seguir por um caminho ao menos não tão ruim como este evidenciado pelo
péssimo desempenho do PIB? Primeiro, é preciso que Bolsonaro não seja reeleito,
pois, a julgar pelo que faz no seu mandato, não se credencia a um novo. É
preciso que os eleitores atentem para essa questão. Quem ainda o apoia precisa
examinar o mal que ele trouxe ao País, que poderia ser sintetizado na
expressão um período
de desgoverno. Quem ao seu redor ainda o chama de mito e seus
apoiadores em geral precisam perceber que ele é mito noutro sentido, de que não
é verdadeiro, ao não governar conforme prometeu. E quem não o apoiou ou se
desiludiu com o seu desempenho precisa atuar no seu meio social para mudar as
crenças dos incautos que ainda pensam em reelegê-lo.
*Economista (UFMG, USP e HARVARD),
professor sênior da USP, é Consultor econômico e de Ensino Superior
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