Valor Econômico
Lula diz que não é candidato do PT mas de
um “movimento”. Adesismo só não é maior que a resistência à conta a pagar
Foi com ares de Arenão que o União Brasil
foi anunciado. Alçaria à condição de maior partido da Câmara pela junção do
PSL, legenda que elegeu o capitão, com o DEM, herdeiro do partido de
sustentação da ditadura dos generais. Quatro meses depois, a UB, que ainda não
foi formalizada, passou de legenda disputada pela terceira via, para
agrupamento dos que têm dinheiro e TV mas é incapaz de canalizar um ou outro
para a conquista do poder.
Também foi com pompa de partido oficial que o PL de Valdemar Costa Neto filiou o presidente da República. Com os planos de arregimentar os candidatos do bolsonarismo raiz à Câmara, passou a acalentar o sonho de fazer uma bancada robusta o suficiente para suceder ao deputado Arthur Lira (PP-AL) em 2025 - sim, porque não colocavam em dúvida a recondução do presidente da Câmara na próxima legislatura.
A robustez não tem sido capaz de blindar a
Pasta mais importante do PL, a Secretaria-Geral de Governo. A ministra Flávia Arruda
é responsabilizada por restos a pagar, que o Centrão estima ser de R$ 1 bilhão,
das emendas parlamentares de 2021. Por isso, está com a cabeça a prêmio.
E, finalmente, o PP, partido que coroa esta
trinca, assumiu, com a Casa Civil, o coração do governo, salvou as emendas de
relator da investida do Supremo e da tesoura no Orçamento. Ainda arrancou do
ministro da Economia um Auxílio Brasil de R$ 400 e do presidente, um decreto
que lhe permite fazer uma rachadinha com Paulo Guedes nas chaves do cofre.
Tudo isso, porém, não tem sido suficiente
para o partido de Lira e do ministro Ciro Nogueira assegurar aos seus
correligionários que o futuro lhes pertence. Fosse assim o PP não estaria ávido
em avançar sobre a sacrossanta vedação, nos 90 dias que antecedem as eleições,
ao repasse de recursos para emendas parlamentares.
A brecha que se busca, no relato de
consultores do Orçamento, é a de uma súmula do Tribunal Superior Eleitoral que
permite o repasse para obras que já tenham tido sua execução iniciada. Coisa
que um terreno aplanado, sob um fiscalização displicente, consegue provar.
O partido vê o café esfriar nos bules do
poder numa velocidade maior do aquela com a qual tem conseguido auferir os
derradeiros benefícios da coabitação. Por isso os correligionários que queiram
fechar alianças com o lulismo nos Estados são tolerados - e até estimulados. É
com esse jogo duplo que se constroem bancadas parlamentares. Desde que, é
óbvio, não apareçam adversários locais eficientes na denúncia do oportunismo.
Com a fila do confessionário aumentando a
cada dia, o maior beneficiário da crise da trinca de partidos bolsonaristas é
Lula. O PT custa a formar uma federação partidária para reduzir sua dependência
do Centrão. O PSB teme ficar a reboque dos petistas no Congresso e nas alianças
locais, mas com o irrefreável adesismo do Centrão o ex-presidente reduz o preço
que precisa pagar pela federação.
Quem mais trabalha contra a federação entre
PT, PSB, PCdoB e o PV são os partidos que não a integram. Suas lideranças
argumentam que Lula, se eleito, forma a maioria - até com o PSDB - e elege o
presidente da Câmara que quiser.
Mesmo aqueles que não seguirão com o PT no
primeiro turno, como PSD, MDB e Republicanos, por problemas regionais, já
sinalizam com aliança futura. Já há sinais do Centrão de que haveria disposição
para encaminhar reformas, como a administrativa, antes de sua posse.
É de um deles uma história sobre a política
como ela é: corria o governo Dilma Rousseff quando um ministro recebeu a visita
de três integrantes do DEM. Não queriam acompanhar a então presidente da
República na disputa pela reeleição mas tampouco iriam com Aécio Neves,
candidato pelo PSDB, a quem negariam o tempo de televisão. Em troca, pediram
uma ajuda ao governo para desatar o nó na coligação de alguns Estados e
facilitar a reeleição de parlamentares do DEM.
Passada a eleição, Dilma os convidaria para
um café, eles pediriam um tempo para conversar, espalhando a “contrariedade da
base” até que, por fim, fosse anunciada a adesão ao governo. Levada adiante, a
proposta foi arquivada nos autos do impeachment com o voto daqueles
parlamentares - “Se fosse Lula, no outro dia ele apareceria pra tomar uísque
com a gente e selar o acordo”.
É este o “movimento” a que Lula diz
pertencer sua candidatura e não ao PT. Nem mesmo os parlamentares com
interlocução no mercado financeiro têm recebido acenos por resistência. O
movimento é de capitulação.
Os “movimentistas” são solidários na
vitória eleitoral mas não nas contas a pagar. O próprio Lula já lembrou que a
proposta de reforma tributária costurada no seu governo teve apoio de todos os
governadores, federações patronais e sindicais, lideranças partidárias e, ainda
assim, não andou.
Sem aumentar imposto, o pobre só vai entrar
no Orçamento, como diz o petista, se houver cortes. A ministra Rosa Weber,
derrotada na tentativa de enquadrar as emendas de relator estará na presidência
do Supremo e já é lembrada como parte da solução. Mais robusta que os R$ 16,5
bilhões das emendas de relator, porém, é a dotação das renúncias tributárias.
No Orçamento de 2022 o valor é de R$ 371 bilhões.
A Federação das Indústrias de São Paulo já
começou a montar, com o Tribunal de Contas da União, uma programação de
“diálogos fiscais”. A entidade é presidida por Josué Gomes, filho do vice de
Lula por oito anos de governo. O volume de recursos em questão, porém, deixa
claro que se trata de um movimento defensivo.
A antecipação de posições pressupõe um
resultado eleitoral ainda desconhecido. Como joga parado, Lula não erra. Na
hora que tiver que repassar todas as bolas que recebe é que será possível saber
como todos os “movimentistas” vão integrar o time sem fazer corpo mole.
A aproximação com o PSDB não se limita a
uma Carta ao Povo Brasileiro II. Por meio de Geraldo Alckmin, Lula tem buscado aproximação
com economistas que participaram da campanha do tucano em 2018 e da formulação
do Plano Real, como Persio Arida. É uma maneira de conferir um selo de
confiabilidade ao mesmo tempo em que demonstra querer partilhar os desgastes
das soluções a serem encontradas.
Em 1994, os economistas do PT garantiram a
Lula que o Plano Real daria errado e lhe fizeram acreditar que aqueles mais de
40% nas pesquisas a quatro meses da eleição se manteriam. Lula perdeu no 1º
turno. A ver se agora conseguirá escrever novo epílogo para aquela história.
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