Valor Econômico
Quem se dará melhor no casamento do
presidente com o PL e o Centrão?
Jair Bolsonaro já virou a página. Sabe que
as condições que o levaram ao Palácio do Planalto em 2018 não se repetirão
neste ano. Os gritos de “Mito! Mito!” nos aeroportos não são mais uníssonos,
sendo entrecortados por “Genocida!” dependendo da localidade visitada. As redes
de proliferação de mensagens, embora ainda atuantes, vêm sendo combatidas pelas
mídias sociais. A Lava-Jato acabou e, com ela, o sentimento antipolítica
arrefeceu. Acima de tudo, Lula teve seus processos anulados pela Justiça e
lidera as pesquisas.
Bolsonaro se elegeu em 2018 rasgando todas
as páginas do manual das campanhas eleitorais no Brasil: sem doações
milionárias de campanha, sem marqueteiros, sem coligações ou palanques
regionais, sem tempo relevante nos programas eleitorais no rádio e na TV.
Passados quase quatro anos de governo, com o desgaste natural que o cargo traz, agravado pelos efeitos da pandemia e da guerra na Ucrânia, Bolsonaro correu para colar com fita adesiva as folhas dilaceradas há tão pouco tempo.
O presidente bem que tentou
institucionalizar na forma de partido político o movimento criado em torno de
seu nome - o termo “bolsonarismo”, se ainda não virou verbete no dicionário,
com certeza já está inscrito nas principais referências bibliográficas que
analisam estes nossos tempos.
A primeira alternativa, que seria a
natural, seria se apossar do PSL, a legenda pela qual foi eleito. Graças única
e exclusivamente a Bolsonaro, o partido saiu de apenas um deputado federal
vitorioso em 2014 para se tornar a segunda maior bancada em 2018, com 52
parlamentares. Mas acontece que o PSL tinha um dono: Luciano Bivar, raposa
velha formada na cartolagem do futebol, empresário bem-sucedido nas operações
do DPVAT.
Sem conseguir destronar Bivar do comando do
PSL, Bolsonaro a princípio cogitou criar o seu próprio empreendimento
partidário. Com pompa e circunstância, e até logotipo cravejado com balas de
revólver, o presidente e seus seguidores lançaram o Aliança pelo Brasil com a
pretensão de disputar as eleições municipais de 2020.
Não se sabe se por incompetência para
gerenciar a logística de coleta das mais de 500 mil assinaturas necessárias
para o registro da nova agremiação ou se pela constatação de que o novo partido
só teria direito a fundo eleitoral e partidário a partir de 2024, ninguém mais
fala no projeto de se criar “o verdadeiro partido de direita conservadora do
Brasil”.
Acossado pela ameaça de abertura de
processos de impeachment pela sua gestão no combate à pandemia e pela
participação em atos antidemocráticos, Bolsonaro fez um giro de 360 graus e
voltou às suas origens: o Centrão da velha política que ele tanto criticou na
campanha de quatro anos atrás, mas ao qual pertenceu desde que se elegeu
vereador no Rio de Janeiro em 1988.
Filiado ao PL de Valdemar da Costa Neto e
tendo ao seu lado o PP de Arthur Lira e Ciro Nogueira e o Republicanos -
legenda comandada pela Igreja Universal, mas que congrega lideranças de outros
segmentos evangélicos -, Bolsonaro definiu o núcleo duro de sua estrutura
política em 2022.
O megaevento realizado ontem em Brasília,
com dezenas de filiações de ministros, políticos e celebridades à chapa
bolsonarista, comprova que sua estratégia neste ano seguirá o script das
campanhas tradicionais, com alianças regionais, puxadores de voto e muito
dinheiro no marketing político.
A aliança de Bolsonaro com o PL, PP e
Republicanos é um bom negócio para todas as partes, mas os políticos do Centrão
têm mais a ganhar nesse acordo.
De sua parte, o presidente conta com os
três partidos, principalmente sua estrutura nas prefeituras do interior de
Minas, do Nordeste e nas margens do Rio Amazonas, para alavancar votos em
regiões que ficaram em peso com os petistas em 2018, conforme mostram os mapas
abaixo.
É tarefa complicada, dado que muitos desses
políticos já fizeram parte da base lulista no passado - e isso justifica a
injeção de recursos dos orçamentos público e secreto nas regiões nos últimos
meses.
Se de um lado não há garantias de que a
estratégia do “capitão do povo” (esse foi o slogan do evento de ontem) vai dar
certo, para os caciques do Centrão, porém, é um jogo de ganha-ganha.
A migração de políticos bolsonaristas já tornou
o PL de Valdemar da Costa Neto o maior partido da Câmara dos Deputados. O PP e
Republicanos também cresceram desde a abertura da janela partidária.
Com Bolsonaro puxando votos, é de se
esperar uma avalanche de votos em candidatos do Centrão para a Câmara e o
Senado em outubro, turbinando suas bancadas e também o valor que PL, PP e
Republicanos receberão dos bilionários fundo eleitoral e partidário no próximo
quadriênio.
Se o presidente conseguir se reeleger, o
Centrão terá muito mais poder no próximo governo; caso Bolsonaro seja
derrotado, também.
*Bruno Carazza é mestre em
economia e doutor em direito, é autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as
engrenagens do sistema político brasileiro” (Companhia das Letras)”.
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