Paulo Fábio Dantas Neto diz que Lula terá, sim, um papel importante na campanha de Jerônimo Rodrigues
Guilherme Reis e Paulo Roberto
Sampaio /
Salvador - Para o cientista político e professor da
Universidade Federal da Bahia (Ufba) Paulo Fábio Dantas Neto, a disputa pelo
Senado, uma vez confirmada a polarização entre os candidatos Otto Alencar (PSD)
e João Leão (PP) tende a ser mais acirrada do que a eleição para governador
“pela rivalidade entre PSD e PP no interior onde há anos emulam, com relativo
equilíbrios de forças municipais, no âmbito da hoje cindida aliança governista
estadual”. “Essa rivalidade agora tem conexão nacional pela batalha renhida que
esses dois partidos travam, além de outros, para turbinar suas bancadas
federais”, pontua, em entrevista à Tribuna.
Em relação à disputa para o governo da Bahia, Dantas diz que Lula terá, sim, um papel importante na campanha de Jerônimo Rodrigues (PT). “Essas incertezas todas não anulam o fato de que Lula aparece hoje, sim, como o grande influenciador de votos para Jerônimo e é plenamente racional que a campanha governista aposte nesse potencial. Sem subestimar a capacidade de transferência de votos de Lula, avalio que fazer Jerônimo pular, de fato, de 4 para 37% é um desafio e tanto”, avalia.
As pesquisas mostram que Lula poderá influenciar muito na escolha do eleitor por Jerônimo. Em que medida o sr. acha que isso se confirmará nas urnas? Lula terá de fato uma influência relevante na eleição estadual?
Esse desafio está feito a Lula, mas também
ao próprio candidato do PT a governador. Vejamos, por exemplo, mais uma vez, a
pesquisa do Genial Quaest. Nela está mensurado em 37% o patamar que Jerônimo
Rodrigues poderá alcançar se sua vinculação a Lula for bem feita e tiver
sucesso. Não se trata, portanto, de
intenção de voto atual, espontânea ou estimulada pela exposição ao entrevistado
da lista de prováveis candidatos a governador. Penso que a marca de 37% quer
dizer que o candidato do PT tem, além dos 4% que dizem ter intenção de votar em
si, um contingente de 33% do eleitorado baiano que admite votar nele pelo fato
de ser apoiado por Lula. A missão de Jerônimo é, além de conservar os 4% que já
tem, cativar esses 33 % para conquistá-los de fato e também conseguir avançar,
para além do apoio de Lula, sobre uma parte dos outros 63% do eleitorado. Desse
total, a maior parte (43%) diz ter intenção de votar em ACM Neto mesmo se ele
for um candidato independente e mesmo se Lula apoiar o adversário. Outros 9% de
eleitores dizem o mesmo sobre votar em João Roma ao saberem que ele terá o
apoio de Bolsonaro. Para que se confirme essas projeções, Jerônimo, assim como Roma,
precisará crescer, enquanto Neto precisará perder 23 dos 66% de intenção de
voto que no momento detém, conforme a mesma pesquisa. Nessa conta sobre o
futuro (43+37+9 e mais cerca de 2% para o candidato do PSOL) restam 9 % como um
terreno em tese mais neutro para Jerônimo, se alcançar os 37%, ir além.
Essas incertezas todas não anulam o fato de
que Lula aparece hoje, sim, como o grande influenciador de votos para Jerônimo
e é plenamente racional que a campanha governista aposte nesse potencial. Sem
subestimar a capacidade de transferência de votos de Lula, avalio que fazer
Jerônimo pular, de fato, de 4 para 37% é um desafio e tanto. A vinculação efetiva
de cada candidato a governador a cada candidato presidencial é uma questão de
política prática e será confirmada, ou não, durante a campanha. A eficácia de
tal ou qual associação é, na verdade, questão a ser pesquisada e não uma
espécie de premissa de pesquisa, como muitas vezes a divulgação enviesada de
dados pretende afirmar. Começa a virar costume querer calcular a eficácia do vínculo
mesmo antes da campanha começar para valer, portanto, sem saber como essas
vinculações vão se dar, ou não, na prática. É um malabarismo vizinho ao território
das fakenews. Não vejo nisso um sentido informativo, ou mesmo de prospecção
segura.
ACM Neto e João Roma poderão dividir o
eleitorado que votou (ou vota) em Bolsonaro? Ou são perfis distintos de
eleitor?
A mesma pesquisa que estamos comentando sugere
que a parcela do eleitorado baiano que, hoje, está disposta a votar em Bolsonaro
mal ultrapassa a casa dos dois dígitos. Em 2018 essa marca ficou em cerca de um
quarto dos votos. Claro que isso pode mudar, seja por tentos marcados na
campanha do presidente pela reeleição, seja por consequências de decisões
tomadas por seus adversários na política estadual. Mas se os erros não se
tornarem hábito creio que essa questão tende a não se colocar. Explico: Na
atual situação a disparidade entre os dois candidatos a governador que você
cita na pergunta é alta, seja em intenções de voto neles mesmos ou em conexão
com candidaturas presidenciais. Então me parece que João Roma não tem como dividir
qualquer fatia mais importante do eleitorado. Não vi se a pesquisa desce a esse
detalhe, mas é razoável supor que entre as intenções de voto captadas para ACM
Neto haja, tanto eleitores com perfil de preferências políticas próximo ao dos
eleitores de Bolsonaro e mesmo parte deles (Roma não tem fôlego eleitoral,
hoje, para se assenhorar de todo o legado, mesmo sendo esse um legado modesto)
assim como uma ampla maioria de eleitores com perfil distante e até mesmo
antagônico ao do eleitor bolsonarista. Mas essa será uma questão talvez
relevante para o candidato do União Brasil só no caso de haver, na Bahia,
segundos turnos simultâneos para presidente e governador. Nessa hipótese, hoje
não verificada em pesquisas de intenção de voto, Neto poderá sofrer pressões para
apoiar Bolsonaro, sob o argumento de que não pode desprezar essa fatia do
eleitorado. Assim como sofrerá pressões em sentido contrário, sob o argumento
de que não pode confrontar seu eleitorado de centro e mesmo fatia do de centro
esquerda que se afastou da órbita do PT e há anos interage com ele.
Intuitivamente as pressões contra o apoio a Bolsonaro devem pesar mais, pelo
risco de desagradar quem tem opção, no caso o eleitor de centro e
centro-esquerda e antibolsonaristas, em geral, que podem migrar para o candidato
do PT. Já ao eleitorado bolsonarista restará votar em Neto, mesmo pouco satisfeito,
ficar em casa ou viajar. Mas repito que para esse dilema entrar na agenda real
será preciso que os adversários do ex-prefeito de Salvador consigam levar a
eleição ao segundo turno.
Tudo indica que a disputa pelo Senado se
dará entre Leão e Otto, que está à frente nas pesquisas. Considerando que ACM
Neto lidera para governador, há a possibilidade de vermos eleitos governador e
senador de chapas diferentes? Leão tem densidade suficiente para crescer ainda?
A frente de Otto Alencar mostra-se quando o
entrevistado é posto simultaneamente diante de mais de uma candidatura da
oposição liderada por ACM Neto (além de João Leão, Zé Ronaldo ou Marcelo Nilo,
ou Bispo Marinho ou até todos eles juntos). Não há elementos seguros para dizer
que essa frente existirá e que margem terá no caso mais que provável de que
desses todos, só Leão concorra ao Senado. Para essa pergunta ser respondida com
alguma objetividade temos que aguardar nova pesquisa, que já leve em conta o
cardápio real.
Por enquanto acho possível adiantar duas
suposições e uma mera impressão. As suposições são: a) confirmada a polarização
entre Otto e Leão, o pleito para o Senado tende a ser mais acirrado do que o
que se dará para o cargo de governador, pela rivalidade entre PSD e PP no
interior onde há anos emulam, com relativo equilíbrios de forças municipais, no
âmbito da hoje cindida aliança governista estadual. Essa rivalidade agora tem
conexão nacional pela batalha renhida que esses dois partidos travam, além de
outros, para turbinar suas bancadas federais. b) essa polarização intensa em
vários municípios pode oferecer a Bolsonaro janelas de oportunidade para se
imiscuir nessa disputa em favor do PP, na medida em que o governo estadual de
fato entre de cabeça na campanha de Otto Alencar. Esse envolvimento pode
passar, ou não pela candidatura de João Roma, a depender das relações práticas
entre Neto e Leão na campanha. Se a liga ficar frágil e nos desvãos municipais
Neto piscar para Otto, ou vice-versa Leão poderá vestir nesses mesmos
municípios, traje de passeio completo. Enfim será uma batalha em universos
micro dos quais as campanhas de Lula e de Neto terão que prestar atenção para
evitar surpresas fora do script do esfriamento, que os favorece.
A mera impressão é de que o governador Rui
Costa e o senador Otto Alencar podem mais adiante concluir que fizeram escolhas
erradas. Otto por não ter pensado com mais simpatia na ideia de aceitar a candidatura
ao governo, cheia de riscos, mas não sei até que ponto maiores do que aqueles
que correrá nessa guerra do fim do mundo pelo Senado. O governador por não ter
usado, até as últimas consequências, seu poder de pressão sobre o partido para
impor sua candidatura ao Senado. Além de se eleger com relativa facilidade,
espantaria concorrentes e livraria Lula dos riscos que a disputa que se aproxima
traz para que ele obtenha na Bahia a goleada de que precisa para compensar as
dificuldades que enfrenta de montar alianças ao centro em estados onde o PT esteve
isolado nos últimos anos. Como conteve seu ímpeto diante dos movimentos
contundentes do senador Jacques Wagner, Rui Costa, sem mandato a partir de
janeiro, precisa confiar agora, primeiro na confirmação da vitória de Lula,
segundo na possibilidade de adentrar ao ministério, ao lado de Wagner (se a
Bahia tiver força para tanto) ou no lugar dele, o que parece no mínimo,
duvidoso.
Muitos se perguntam por que Wagner
desistiu. Com base apenas em análises da conjuntura, o sr. vê uma explicação
plausível para isso?
Creio que não é bem o caso de explicar algo
(a desistência) que suponho não ter ocorrido. O que se teria de explicar muito
bem era a candidatura, caso tivesse acontecido. Minha impressão é de que Wagner
jamais foi, de fato, candidato. Ele tem
mais quatro anos de mandato assegurados no Senado, não vejo porque se exporia a
essa empreitada tendo como adversário um jovem político hábil e muito próximo
do próprio Wagner nos métodos de fazer política. Além disso, como o próprio
Wagner recentemente disse, Lula precisa dele em outro lugar e, como ele não
disse - mas certamente sabe - sua candidatura amarraria Lula, amigos próximos
que são, numa disputa acirrada com Neto por votos para governador. Nas atuais condições de temperatura e pressão
nacionais e estaduais, em que se descartou a candidatura de Otto Alencar ao
governo (de longe a melhor opção para um candidato presidencial que afirma
querer ir ao centro) o que de menos Lula precisa é de jogos de soma zero como
seria uma disputa entre Neto e Wagner. Hoje Lula tem que lidar com uma
candidatura ao governo pouco competitiva e inteiramente dependente dele. Mas
pior seria se a vitória estadual fosse uma obrigação para o PT e para o próprio
Lula.
Resta talvez a curiosidade de saber porque
Wagner deixou as especulações sobre sua candidatura irem tão longe a ponto de a
retirada espalhar frustração. É provável que a resposta possa ser encontrada
numa crônica futura sobre as relações entre o atual governador e o ex. Como
sobre isso só tenho impressões e só poderia fazer ilações sem base em
informações, prefiro parar por aqui
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