O Globo
Ciro Gomes concorre pela quarta vez à
Presidência da República (candidatou-se antes em 1998, 2002 e 2018). Ele está
consolidado no terceiro lugar nas pesquisas de intenção de voto, distante de
Lula e Bolsonaro, mas bem à frente de Simone Tebet e dos outros candidatos
menores. A missão de Ciro é, ao mesmo tempo, romper a polarização política e
defender um ambicioso projeto nacional de desenvolvimento.
Ao contrário das outras candidaturas, não
se pode acusar a de Ciro Gomes de não apresentar um plano detalhado. Em 2020,
dois anos antes das eleições, ele publicou um livro apresentando sua visão
sobre os desafios do desenvolvimento brasileiro, acompanhado de um minucioso
plano de ação. Agora, na última terça-feira, seu partido, o PDT, submeteu ao
TSE um plano de governo que resume algumas das ideias do livro.
Ciro defende interromper o longo ciclo de baixo crescimento econômico brasileiro com uma série de intervenções do Estado na economia. Ele defende ampliar o poder de compra das famílias resgatando sua capacidade de crédito, comprometida pela inadimplência. A ideia é que o Estado compre com grande deságio as dívidas das famílias e que o valor com o abatimento seja refinanciado em até 36 vezes, com juros baixos, pelos bancos públicos. Ele também defende ampliar a capacidade de investimento das empresas capitalizando o BNDES com parte das reservas cambiais.
Para ampliar o emprego, Ciro propõe
reiniciar rapidamente obras públicas já licitadas. No âmbito da política
social, pretende implementar um amplo programa de renda mínima integrando o
Auxílio Brasil, o seguro-desemprego e a aposentadoria rural. Para controlar a
alta do preço dos alimentos, quer retomar as compras governamentais de grãos,
criando estoques reguladores que permitam conter os aumentos. Ciro também
pretende acabar com a paridade internacional dos preços dos combustíveis,
alterando a política de preços da Petrobras.
Todas essas medidas, e outras que ele
pretende implementar, exigem recursos que Ciro quer conseguir com uma grande
reforma tributária que desonere a produção, o trabalho e o consumo e se
concentre na renda e na propriedade. Em particular, Ciro quer taxar grandes
fortunas, lucros e dividendos, além de fazer um duro corte de 20% nas
desonerações.
É de tirar o fôlego a simples enumeração
desse amplo e ambicioso conjunto de medidas. Embora muitas façam sentido, elas
também levantam muitas questões.
Ciro não foi capaz de construir uma
coalizão política para sua candidatura, tendo como único apoio seu próprio
partido, o PDT. A primeira questão que surge analisando esse programa amplo e
heterodoxo é como faria para aprová-lo, já que não dispõe de apoio político.
Ciro diz que quer mandar para o Congresso um amplo pacote de medidas para ser
aprovadas logo nos primeiros seis meses e que, havendo impasse com o
Legislativo, recorreria a um plebiscito, contando com o voto direto da
população. A expectativa é completamente irrealista, uma vez que a convocação
de um plebiscito também precisaria do voto do Congresso.
Contra as propostas de Ciro, também joga a
memória recente do governo Dilma, o último em que se tentou uma intervenção do
Estado para indução do desenvolvimento econômico. Embora as propostas de Ciro
sejam diferentes das de Dilma Rousseff, o fracasso retumbante das políticas
econômicas da ex-presidente gerará ainda mais resistência de empresários e
economistas para as propostas heterodoxas do projeto nacional de
desenvolvimento.
Ciro também enfrenta reservas pelo
temperamento explosivo e por ser visto como um “coronel”. A pecha de “coronel”
é preconceituosa e se deve ao fato de Ciro vir de uma família de políticos
nordestinos. O termo jamais seria utilizado para se referir ao ex-presidente do
Congresso Rodrigo Maia ou ao falecido prefeito de São Paulo Bruno Covas,
políticos do Sudeste que também vieram de influentes famílias de políticos.
A fama de explosivo é mais pertinente. Ciro
se envolveu em muitos bate-bocas e perde a cabeça com facilidade. Para além de
adotar uma postura pouco “presidencial”, há temor de que tome decisões
impensadas, movido por impulso.
Ciro é o candidato com o mais elaborado e mais minucioso plano de ação entre os presidenciáveis. É o único entre os principais candidatos a presidente que defende claramente um modelo de desenvolvimento induzido pelo Estado. Ciro tem um ótimo histórico como gestor público, mas suas propostas ambiciosas e heterodoxas enfrentariam muitas resistências no meio político e empresarial.
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