Em meio à investida de governistas contra institutos, Arthur Lira (PP-AL) colocou em votação a urgência de projeto que impõe até dez anos de prisão a quem "errar" resultado
Por Natália Portinari / O Globo
BRASÍLIA - A menos de duas semanas para o
segundo turno das eleições de 2022, a Câmara dos Deputados aprovou, nesta
terça-feira, a urgência para votar projetos de lei que criminalizam a
divulgação de pesquisas que não correspondam ao resultado das urnas. Essas
propostas serão, agora, priorizadas na fila de proposições que aguardam
apreciação da Casa.
Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara
dos Deputados, colocou em pauta a votação da urgência nesta terça-feira, mas
ainda não há data para a votação do mérito, quando o conteúdo da proposta será
debatido pelos parlamentares. Na sessão, ele disse que não há um texto definido
e que o projeto será discutido entre os líderes, negando se tratar de uma
"punição" aos institutos de pesquisa.
— O que está acontecendo hoje no Brasil e
nos estados é um absurdo que deve ser combatido — disse o líder do PP, André
Fufuca (MA), partido que compõe a base do governo Bolsonaro.
Em reunião de líderes na residência de Lira
na tarde desta terça-feira, foram discutidas versões mais "brandas"
do projeto. Uma seria a responsabilização cível — obrigando ao pagamento de
indenização, por exemplo — de institutos que fizerem sondagens em que o
resultado das urnas ficar muito longe da margem de erro. Outra seria a
proibição da divulgação de pesquisas 15 dias antes do pleito.
Não se chegou a um acordo entre os líderes
e, por isso, foi votada apenas a urgência de projetos já existentes, com o
compromisso de debater um novo texto após o segundo turno das eleições.
Base do governo a favor
A urgência foi aprovada com 295 votos
favoráveis e 120 contrários. O PP, PL, União Brasil, PSD, Republicanos, PSDB,
Podemos, PSC, Novo, Solidariedade, Cidadania, Avante, Patriota, PROS, PV e PTB
orientaram os deputados de suas bancadas a votar a favor da proposta. No
sentido contrário, foram o PSOL, a Rede e o PT.
Há dois projetos previstos. O primeiro, de
2011, de Rubens Bueno (Cidadania-PR), estabelece multa de até R$ 1 milhão para
o crime de divulgação de pesquisas fraudulentas e altera o que, hoje, é
considerado fraude. A sondagem seria "fraudulenta" quando o resultado
das eleições estiver acima da margem de erro registrada, no caso em que a
sondagem seja realizada e divulgada até cinco dias antes do pleito.
O outro, do líder do governo Ricardo Barros
(PP-PR), apresentado após o primeiro turno deste ano, prevê reclusão de quatro
a dez anos e multa para quem publicar, nos 15 dias anteriores à eleição,
pesquisas em que o resultado seja divergente da margem de erro. As duas
proposições estão apensadas, o que significa que serão votadas em conjunto.
Na prática, seriam criminalizadas pesquisas
mesmo em casos em que muitos eleitores mudarem ou definirem seu voto logo antes
das eleições — em 2018, 18% escolheram o candidato para presidente no final de
semana da eleição, segundo o Datafolha. Para governador e cargos do
Legislativo, a indefinição costuma ser ainda maior.
Se o projeto for aprovado, responderá
criminalmente o estatístico que assina a pesquisa divulgada, o responsável
legal do instituto de pesquisa e o representante legal da empresa contratante
da pesquisa, mesmo se não houver intenção de fraudar a pesquisa.
Já se não houver intenção de fraude, a pena
é reduzida em 25%, segundo o texto. A proposta quer ainda obrigar veículos a
publicarem todas as pesquisas registradas no mesmo dia e no dia anterior àquela
que se pretende divulgar, para evitar suposta predileção a dados
"deturpados".
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco
(PSD-MG), disse que o projeto é "absolutamente inadequado". Ele
apontou que a pena prevista seria maior do que em crimes de peculato e
corrupção e lembrou que já existe crime quando há a intenção de manipular os
dados.
Rubens Bueno diz que é contrário ao projeto
de Barros, mas é a favor da urgência, já que seu texto está tramitando em
conjunto. Ele discorda da pena sugerida pelo líder do governo e de estender a
punição criminal aos estatísticos. Hoje, quando uma pesquisa é considerada
fraudulenta, respondem apenas os institutos e as contratantes.
— Voto contra (o projeto de Barros). Voto a
favor da urgência porque é meu projeto, mas vou falar do absurdo de isso ser
pautado agora às vésperas do segundo turno.
Na sessão, Bueno disse que o fato de o
projeto ser analisado agora, durante as eleições, traz insegurança jurídica. Em
plenário, após a aprovação da urgência, Barros disse que o texto deve sofrer
alterações e será debatido antes de ser aprovado.
A lei atual pune apenas pesquisas
deliberadamente enviesadas, quando o formulário direciona as respostas para um
determinado candidato, por exemplo, ou quando o recorte dos entrevistados é
propositalmente distorcido, situações em que diversas empresas já foram
punidas.
A medida proposta por Barros obrigaria
jornais e demais veículos de comunicação a publicarem dezenas de sondagens com
metodologias obscuras. Em setembro, a Associação Brasileira de Empresas de
Pesquisa (Abep) alertou para o grande número de CNPJs que hoje produzem
pesquisas autofinanciadas ou que ocultam seus patrocinadores, e divulgam
estudos com números "diversos e desiguais".
Como mostrou o GLOBO, quase quatro em cada dez pesquisas eleitorais registradas no TSE entre janeiro e junho deste ano foram pagas, supostamente, com recursos das próprias empresas. Entre os institutos que financiam suas próprias sondagens, há empresas de terraplanagem, organização de rodeios e até vaquejadas, além de pesquisa a preço de R$ 0,01. O Ministério Público Federal (MPF) está investigando esses levantamentos, segundo o jornal "Estado de S. Paulo".
Um comentário:
Um absurdo total!
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