Folha de S. Paulo
Profissional experiente, onívoro, fluente
no dialeto dos porões
Formado por academia militar. Revela ser
ex-adepto de sexo com animais, pois "naquele tempo não tinha mulher como
tem hoje em dia". Mostra interesse
em consumir carne humana, pois "comeria um índio sem problema
nenhum". Num episódio com "menininhas
de 14 anos, bonitas, arrumadinhas" conta que "pintou um clima".
Costuma dizer "minha frase foi deturpada", "brincadeira",
"narrativa". É seu reflexo verbal.
Tentou abortar seu quarto filho, mas
garante lutar contra a prática. Discreto, prefere sigilo para assuntos
familiares. Já planejou atentado a bomba. Já esteve preso.
Conhecedor da micro-corrupção, "sonego
o que for possível": sabe expropriar salário de funcionário e superfaturar
gasto de gasolina. Ensina a família. Conhecedor da macro-corrupção, compra
centrão com dinheiro público não rastreável e fecha instituições de
combate à corrupção. Manda desmatar. Não reajusta merenda escolar, corta em
farmácia popular. Corta em futuro.
Proprietário residencial, usa auxílio-moradia para "comer gente" (comer, veja bem, no sentido figurado, não canibalístico). Comprou 51 imóveis com dinheiro vivo.
Tem ojeriza a pobres: "não sabe fazer
nada, o pobre só tem uma utilidade nesse país: votar com diploma de burro no
bolso". "Irresponsáveis e aproveitadores." Tentou dificultar
transporte de pessoas pobres na eleição.
Tem ojeriza a negros: "O
afrodescendente mais leve pesava sete arrobas. Não fazem nada."
"Não seria operado por médico cotista". Curioso em história, leu que
"eram os negros que entregavam os escravos".
Dotado de certo ódio a nordestinos, os
"pau de arara": "Só tá faltando crescer um pouquinho a
cabeça." "Dentre os governadores da ‘paraíba’, o pior é o do
Maranhão." Atribui derrota eleitoral na região a nordestinos incultos e
analfabetos.
Amedrontado pelo feminino: "mulher
deve ganhar salário menor porque engravida". Mente invulgar, vincula
estupro a mérito: "não te estupro porque não merece". O Brasil, para
ele, é "uma virgem que todo tarado de fora quer". Mas "quem
quiser vir fazer sexo com mulher, fique à vontade".
De sexualidade incerta, afirma sua potência
sexual amiúde. Num "país de maricas", é fascinado pelo homossexual:
"começa a ficar meio gayzinho, dá coro que ele melhora"; "seria
incapaz de amar filho homossexual"; "prefiro morto". Em sua
cosmovisão, "minorias se adequam ou desaparecem". Direitos devem ser
"rasgados e jogados na latrina".
Desejou extermínio indígena: "A
cavalaria brasileira foi incompetente. Competente, sim, foi a cavalaria
norte-americana, que dizimou seus índios." Guia-se pelo ultraje a rigor.
Não acredita nos fatos do racismo,
homofobia, fome e morte de criança por Covid. Na pandemia, lutou por
aglomeração sem máscara e atrasou compra de vacina. Mortes
com assinatura. "Dei uma aloprada."
Entre seus talentos expressivos, imita
gente morrendo sem ar (ar que sonegou em Manaus). Empurra remédio ineficaz
produzido pelas Forças Armadas. Não visitou hospitais, incitou invasão a UTIs.
Dá boas-vindas a vírus. "Minha especialidade é matar". Não é coveiro.
Tem força de vontade para tirar férias e
passear de jet ski no pico da pandemia. Tem determinação para trabalhar pouco.
Tem propósito de terceirizar responsabilidades. "A culpa não é
minha." Tem foco na liberdade de desobedecer a lei. "E daí?"
Apreciador da fraseologia nazista, dali
tira slogans para o país: "Brasil acima de tudo" ("Deutschland
über alles"); "Uma nação, um povo, um líder" ("Ein Volk,
ein Reich, ein Führer"); "Trabalho liberta" ("Arbeit macht
frei", de Auschwitz). Toma
leite em aparições públicas, na tradição do supremacismo branco.
"Vocês são razão da existência de meu mandato", escreveu a
neonazistas.
Frequentador de loja maçônica, garantiu que
vai lá só pedir voto. Fez
do funeral da Rainha da Inglaterra ato de campanha. E da Assembleia Geral
da ONU. E do Círio de Nazaré (seu "sírio"). E no Santuário de
Aparecida, agrediu bispo e católicos em geral. Cristão peculiar.
Cartas de recomendação podem ser
solicitadas ao ex-ator Guilherme de Pádua, ao ex-goleiro Bruno, ao ex-assessor
Queiroz e ao ex-amigo Adriano (in memoriam).
Fluente nos dialetos dos porões,
regozija-se com o verbo "fuzilar" e a expressão "ponta da
praia", lugar onde fardados desovavam corpos. Seu passado místico.
Seu livro de cabeceira foi escrito por torturador de mães nuas e desfiguradas na frente dos filhos. O torturador asseverou: "Agi com consciência tranquila. Nunca ocultei cadáver." Segundo se diz, a frase que o define foi proferida por pensador francês: "Seus filhos e seus bons amigos constituem para ele a totalidade da espécie humana" (Tocqueville, 1835)
*Professor de direito constitucional da USP, é doutor em direito e ciência política e membro do Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade - SBPC
10 comentários:
Jair Messias Bolsonaro, em carne, osso e MALDADE! Esta última mais que qualquer coisa... Parabéns ao colunista pelo excelente texto, e também ao blog que divulga seu trabalho!
Gostaria de assinar embaixo.
Tb assino.
Acreacento q nenhuma palavra q contém "intelig", de inteligente, inteligência etc aparece no texto.
Isso mostra q o autor fez, de fato, uma descrição muitíssimo real.
Faltou destacar a capacidade de escolher auxiliares: Abraham Weintraub, Eduardo Pazuello, Ricardo Salles, Carlos Decotelli, Milton Ribeiro, Ernesto Araújo, Damares Alves, presidente assediador da Caixa Federal, Onyx Lorenzoni, Mário Frias, astronauta Marcos Pontes, etc.
Caro, Conrado. Como é possível um ser desse jaez, dessa espécie, um ser tão abominável, tão execrando estar tranquilamente fazendo história? Só pode ser por uma razão. O "populismo" que engloba Trump, Bolsonaro, Orbán. É a atual solução para a continuidade do capitalismo selvagem (perdão pelo oxímoro). O capitalismo tem planos para o futuro que já começou: metaverso, bitcoin... Mas o pior são os planos para o presente. Como todas as máscaras já foram usadas liberalismo, neoliberalismo, socialdemocracia. E como o capitalismo é incompatível com o avanço da democracia: por supuesto quando a maioria de fato se fizer ouvir, ou seja quando a democracia for realmente democrática. Essa desigualdade bilionários versus moradores de rua vai acabar. Mas o capitalismo dos bilionários de hoje tem planos e não pretendem sair de cena tão cedo. E a solução que está sendo posta em prática é o fascismo reciclado em populismo. Aquilo que Luiz Sérgio Henriques chamou de "corrupção populista da democracia". Vide As Palavras e o Tempo.
Trump nos EUA levou uma rasteira, mas já se apruma, sacode a poeira e pretende dar a volta por cima. Aqui no Brasil o boçal conseguiu uma proeza, associar os símbolos e instituições nacionais ao projeto de poder da orcrim familiar (Gabinete do Ódio, Escritório do Crime, Milícias, etc.). Eu gostava de ver a Simone Tebet abraçada com nossa bandeira dizendo que ela pertence a todos os brasileiros e não deve ser confundida com nenhuma campanha eleitoral. Parece que o capitalismo hodierno está a depender de uma situação em que as pessoas se encontrem como na piada em que se chama "urubu" de "meu louro". Só num estado mental desses a gente suporta viver numa sociedade dividida entre bilionários e moradores de rua. Vamos apostar no NO PASSARAN!
Conrado Mendes,grande colunista.
Excelente texto, descreve com exatidão o perfil nefasto de Jair e explica as raízes do seu mau-caratismo.👏👏👏
O texto é muito bom, muito bem escrito.
Tão vívido que me deu enjoos ao reviver todos esses fatos
Sábias palavras do colunista! Resume grande parte da obra do Minto.
Poderia ter incluído: aliado do atirador Roberto Jefferson e concedeu anistia ao miliciano Daniel Silveira.
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