quinta-feira, 20 de outubro de 2022

Maria Cristina Fernandes - Último voto será contado em Minas

Valor Econômico

Mais do que uma síntese, Estado se transformou num “copia e cola” da disputa nacional

 “Quem ganha em Minas, ganha no Brasil” vale desde a redemocratização. O que nunca se havia visto era um “copia e cola” tão fidedigno quanto aquele do 1º turno. O percentual de votos dos dois finalistas foi exatamente o mesmo no Estado e na Federação: 48% (Lula) x 43% (Bolsonaro). O presidente já esteve quatro vezes no Estado neste 2º turno e o ex-presidente chega para sua segunda visita nesta sexta. Os movimentos que lá se sucedem explicam o estreitamento entre ambos exibido pela última rodada do Datafolha e confirmam que a disputa seguirá cada vez mais apertada até o dia 30.

Nenhum governador reeleito arregaçou tanto as mangas pelo presidente da República quanto Romeu Zema (Novo). É claro que a perspectiva de poder sinalizada nesta parceria é um ativo de Jair Bolsonaro, mas a causa e efeito desta aliança não é o que parece.

Zema resistiu à abordagem de pelo menos dois emissários, um empresário e outro do PSDB, para se manter neutro na disputa e se preservar para ser o candidato liberal à Presidência em 2026.

E a razão é porque ele depende mais de Bolsonaro do que o inverso. Isso ficou claro na sua queda de braço com policiais militares do Estado, que não se rebelaram como em outros momentos porque foram contidos por emissários bolsonaristas.

A dependência se confirmou na eleição. No 1º turno, o governador desfrutou do material de propaganda do Avante, do deputado André Janones. O partido subscreveu o voto Luzema, e fez campanha desviando de Lula e com a artilharia focada em Fernando Pimentel, a quem sucedeu no governo. Com isso, conseguiu tirá-lo da disputa por uma cadeira na Câmara e se beneficiar do voto lulista. No 2º turno, o governador pulou no bote bolsonarista de olho na governabilidade.

O governador reelegeu-se com 56% dos votos, mas não convenceu como puxador de votos. O Novo, em Minas, não fez um único deputado federal. Dos três que tinha na Assembleia Legislativa não reelegeu nenhum. Dois estrearão na Casa - um herdou mais votos de sua dinastia política do que do governador ou do partido.

Para a maioria na Assembleia Legislativa, enrosco do primeiro mandato, Zema vai precisar dos eleitos nas asas do bolsonarismo. A começar pelo vice-presidente da Casa, que deixou o PSDB pelo PL, e já anunciou a disposição de disputar o comando da mesa diretora. Maior partido da Casa, o PT (12 deputados) polariza com o PL de Bolsonaro (9), e não com o Novo de Zema (2).

Essa polarização prossegue na Câmara. O vereador youtuber Nikolas Ferreira (PL), deputado federal mais votado do país, puxou seis cadeiras para seu partido, mas a maior legenda da bancada será a do PT (10), que terá como aliadas uma deputada trans (Duda Salabert) e uma indígena (Celia Xakriabá),

Outro sinal de que a antipolítica passa muito bem, obrigada, foi que o PL, além de eleger os deputados federal (Nikolas) e estadual (Bruno Engler) mais votados do Estado, ainda fez o senador Cleitinho, todos youtubers.

Foi com truques dessa gente que o comício de Bolsonaro em Montes Claros foi filmado e compartilhado, o que não significa que o presidente não tenha se espraiado na região que é a mais beneficiada pelo Auxílio Brasil no Estado. No Datafolha, Bolsonaro avança para além da margem de erro entre os beneficiários.

No mesmo palanque juntaram-se Bolsonaro, Zema, os youtubers e Humberto Souto, o prefeito de Montes Claros, de 88 anos, um hiperconservador que estreou na política pela Arena, em 1962, exerceu sete mandatos de deputado federal, um dos quais como líder do governo Fernando Collor e foi presidente do TCU antes de se eleger, duas vezes, para comandar a cidade com o discurso anticorrupção.

Lula ganhou na cidade que é o principal polo da região, mas por uma diferença de 1,7 ponto percentual. Vinte anos atrás, o petista teve o dobro dos votos que José Serra e Anthony Garotinho somaram no município. Paulo Guedes, o deputado federal petista da região, foi reeleito mas com uma votação menor do que a de 2018, que ele atribui a uma concorrência desvantajosa face aos contemplados pelo orçamento secreto.

Guedes estima que a diferença de Lula para Bolsonaro possa chegar a 1 milhão de votos (foram 560 mil no 1º turno), mas não está claro de onde virão. Juiz de Fora e Teófilo Otoni, as duas maiores prefeituras petistas, serão visitadas por Lula nesta sexta.

O petista conta ainda com o vice-governador, Paulo Brant, do PSDB, excluído da chapa de Zema à reeleição, além do prefeito de Belo Horizonte, Fuad Noman, do PSD, que é pressionado a adotar, no segundo turno, o passe livre do qual se esquivou no primeiro. O movimento ganhou corpo a partir das pressões do governo estadual contra o uso, previsto em lei, de ônibus escolares para o transporte de eleitores.

Lula perdeu na capital mineira em 2 de outubro, mas só a votação da senadora Simone Tebet, que o acompanhará ao Estado, já compensaria a diferença. Apesar de derrotado na disputa pela reeleição, o senador Alexandre Silveira é considerado hoje a liderança do PSD mais ativa na campanha lulista no Estado.

Pesa contra Lula a hegemonia bolsonarista no empresariado. Não importam pelo número de votos que têm, mas pelo peso de seus negócios nas cidades que atuam e na pressão que são capazes de exercer sobre funcionários e fornecedores.

Um velho político mineiro, com trânsito no empresariado, não tem dúvida de que o agronegócio mineiro está todo com Bolsonaro. E dá uma dica preciosa para Lula sobre como lidar com o fato.

Não há como convertê-lo, basta não amedrontá-lo, diz. Recomenda que o petista se valha do Código Florestal como a bíblia de seu programa para o agronegócio e diga que o Estado tem instrumentos para dissuadir o conflito no campo - “O medo é um motor que ativa as pessoas e a meta deve ser desmobilizá-lo”.

A julgar pelos números oficiais das contribuições de campanha, tão importante quanto essa mobilização é aquela que junta dinheiro e fé. Como mostrou Ricardo Mendonça, no Valor, vem de um investidor e pastor, Fabiano Zettel, da igreja evangélica Bola de Neve, de BH, a maior doação para Bolsonaro. Não poderia haver coquetel mais representativo da sedimentação bolsonarista no país. Precisa mais do que o esquadrão digital de Janones, outro mineiro e evangélico, para contê-lo.

2 comentários:

Mais um amador disse...

Perfeito !

ADEMAR AMANCIO disse...

Lula ganhando por um voto está bom,mas não tenho certeza de nada,ninguém deve ter.