Folha de S. Paulo
Projeto vai dar dinheiro aos mais ricos e
aumentar o problema da dívida pública
Manter o valor
do Auxílio Brasil em R$ 600 é inevitável, por motivos sociais e
políticos, embora o programa seja muito ruim e precise de reforma urgente.
Aprovar a isenção
de Imposto de Renda para quem recebe até R$ 5.000 por mês é um tiro no
pé que vai provocar sangramento durante Lula 3.
Mas o governo
de transição já discute de fato colocar o projeto no pacote que quer
aprovar no Congresso até o final do ano.
A medida é socialmente injusta. As pessoas
que recebem até R$ 5.000 de fato deixariam de pagar Imposto de Renda. Apenas
a Receita
Federal tem os dados mais precisos, mas, com tal teto de isenção,
talvez apenas 7 milhões de 31 milhões de contribuintes ou declarantes
continuariam obrigados a declarar ou também pagar IR.
Parece alcançar muita gente e, portanto, parece justo. Mas há cerca de 100 milhões de pessoas que trabalham no país. A maioria, portanto, não seria beneficiada (para nem mencionar os que procuram emprego e não o conseguem e os cronicamente desempregados).
A isenção beneficiaria também aqueles que
continuariam a pagar o IR, as pessoas mais ricas do país. Não importa a renda
da criatura, todo mundo deixará de pagar imposto sobre R$ 5.000 que recebe.
Pode-se argumentar que, mais adiante, Lula
3 e associados vão inventar algum modo de cobrar mais imposto dos mais ricos,
talvez por meio de alíquota maior sobre lucros, dividendos, outras rendas ou
sobre patrimônio.
Sabe-se lá. O fato é que o governo vai
trocar uma perda de receita certa e enorme por uma incógnita.
Não se sabe também exatamente de quanto
seria a perda de receita. Os cálculos atuais, além de meio chutados a partir de
dados genéricos, são apenas contábeis, sem levar conta efeitos econômicos.
Suponha-se que a perda de receita fique em
torno de R$ 150 bilhões. É o custo anual aproximado do Auxílio Brasil a R$ 600
por mês, mais um tanto de novos beneficiários. Parece justo? Não é.
A tabela do IR talvez precise de reajuste,
mas até isso é discutível. Impostos sobre renda são dos mais justos (e, sim, os
mais ricos precisam pagar muito mais).
Lula 3 tem grandes pretensões sociais.
Sabe-se lá quais tentará levar à prática. Para tanto, precisará de dinheiro que
já não tem ou vai ficar sem, gastando mais já no Orçamento de 2023. Isto é, de
cara, o governo já estará tomando mais dinheiro emprestado, fazendo mais dívida
pública e pagando juros de quase 14% ao ano (juros que vão, claro, para os mais
ricos, os credores do governo).
Uma das prioridades nacionais é melhorar a
escola das crianças. Creches e escolas infantis maravilhosas poderiam fazer com
que as crianças mais pobres chegassem à fase de alfabetização em condições
parecidas com as das filhas dos ricos.
Seria um lugar onde poderiam ficar seguras,
alimentadas e acompanhadas. Mães e pais poderiam trabalhar com tranquilidade. É
um programa com efeitos no curto, no médio e no longo prazo. Não é atribuição
da União, mas o governo federal poderia bancar o custo, assim como poderia
contribuir para o aumento da rede de escolas em tempo integral para crianças
maiores.
Lula 3 também quer aumentar o investimento
público. Vai precisar colocar dinheiro na melhoria do SUS. Quer gastar em
bobagens, também, como subsídio para grande empresa, de novo. Mesmo que fique
apenas no meritório, essencial e urgente e socialmente justo, mal tem dinheiro.
Além de remanejar os gastos, Lula 3 precisa de aumento de receita. Perder R$
150 bilhões é, pois, piorar o problema fiscal (crescimento sem limite da
dívida), assunto para o qual não tem até agora solução alguma e que pode
solapar seu governo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário