Valor Econômico
“Lula não faz só o que quer”, diz aliado
sobre ministério
Em tom de desabafo, o presidente eleito
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou na quinta-feira que é “mais difícil
montar o governo do que ganhar as eleições”. Foi, evidentemente, um arroubo,
porque na hipótese mais razoável montar um governo deve ser tão difícil quanto
vencer as eleições.
O desassossego de Lula em relação aos
aliados que não conseguiu acomodar, sendo alguns deles quadros que o acompanham
há décadas, é tão cristalino que ele mandou um recado aos aflitos: “a quem está
aqui, que ainda vai ser ministro, espere que a sua vez chegará”.
Um dos destinatários deste recado é o líder do PT, deputado Reginaldo Lopes, que fez intensa campanha para Lula em Minas Gerais, e desistiu de concorrer ao Senado para viabilizar a aliança com o PSD no Estado. A vaga coube ao senador Alexandre Silveira (PSD), aliado do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que não se reelegeu, mas será ministro.
Lula vem sendo lembrado de que sua vantagem
sobre o presidente Jair Bolsonaro (PL) em Minas foi de 600 mil votos no
primeiro turno. Caiu para 49 mil no segundo turno, após o apoio do governador
reeleito Romeu Zema (Novo) ao adversário. Desse total, 40 mil votos vieram dos
eleitores de Juiz de Fora, cidade governada pela prefeita do PT, Margarida
Salomão, aliada de Lopes.
Lula precisa de espaço para alojar representantes
de pelo menos dez tendências do PT, dos movimentos sociais, dos partidos de
esquerda e dos aliados que chegaram após a vitória nas urnas. Estes vieram no
fim da jornada, mas são necessários para a frente ampla que o petista tenta
construir para governar. “Lula não faz só o que quer, faz o que pode ser
feito”, diz um interlocutor do presidente eleito.
A escolha do futuro ministro da
Secretaria-Geral da Presidência, Márcio Macedo, ilustra a angústia
presidencial. Ele disputava a vaga com o advogado e fundador do Grupo
Prerrogativas, Marco Aurélio de Carvalho, e com o ex-prefeito de Osasco,
deputado estadual reeleito e coordenador da campanha de Fernando Haddad, Emídio
de Souza.
A opção por Macedo implicou vários
critérios. Integrante da Executiva Nacional, pesou ele ser aliado de primeira
hora da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, uma das mais influentes na definição
dos ministros.
Além disso, Macedo aproximou-se de Lula nos
últimos anos. Em 2017, foi o coordenador das Caravanas da Cidadania e percorreu
com Lula os Estados do Nordeste, da Região Sul, além de municípios do Rio de
Janeiro, Espírito Santo e Minas Gerais. E foi o tesoureiro da campanha
presidencial.
Pelo lado pragmático, a nomeação de Macedo
abre uma vaga na Executiva Nacional do PT, porque ele terá de se afastar da
vice-presidência da sigla para assumir a pasta. Ao mesmo tempo, desponta como
um dos cotados para a sucessão de Gleisi nos próximos anos.
Diante da decisão de Lula, Emídio cogita
permanecer em São Paulo para exercer o mandato de deputado estadual. Em
paralelo, o nome dele começou a circular para um dos cargos estratégicos do
segundo escalão: diretor-geral da Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de
São Paulo (Ceagesp), vinculada ao Ministério da Economia.
Embora os três sejam próximos a Lula, Marco
Aurélio era visto por uma ala do PT como o perfil mais adequado para o
ministério, que fará a interlocução com os movimentos sociais. A principal
missão da pasta será resgatar as conferências nacionais temáticas, que discutem
políticas públicas para cada setor e tornaram-se uma das obsessões de Lula para
o terceiro mandato.
Advogado na área empresarial, Marco Aurélio
é, simultaneamente, um militante social há mais de 30 anos. Ele é um dos
organizadores frequentes do “Natal com os catadores”, em que Lula confraterniza
com a população de catadores de material reciclável de São Paulo e vem sendo
reeditado desde o primeiro mandato do petista.
Marco Aurélio é filiado ao PT há 29 anos e
foi uma das raras vozes na advocacia que defenderam o partido no escândalo do
mensalão em 2005. Quando saiu em defesa de Lula na Lava-Jato, já não era uma
voz isolada.
Aos 12 anos, Marco Aurélio ouviu Lula
discursar na Praça Charles Miller, na campanha de 1989, e desde então, passou a
seguir de perto o líder petista. Aos 16 anos, assinou a ficha de filiação ao
PT. Aos 21 anos, encontrou-se com Lula pela primeira vez. Recebeu das mãos dele
o prêmio por fazer parte da “equipe de jovens mais alegre” da campanha de 1998.
Era um boneco inflável do Lula.
Depois de militar na juventude do PT,
migrou para a militância social. Na faculdade de Direito da PUC-SP, estagiou na
Central dos Movimentos Populares, na Unificação de Luta dos Cortiços.
Recentemente, aproximou a Coalizão Negra por Direitos do PT, numa fase de distanciamento
da sigla de sua base social.
Atualmente, sócio de uma banca bem sucedida
na advocacia empresarial, Marco Aurélio se notabilizou como um quadro do PT que
fala, ao mesmo tempo, “com a Faria Lima e com o Capão Redondo”.
Por essa qualidade, o ministro das Relações
Institucionais, Alexandre Padilha (PT), o sondou para assumir a presidência do
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o “Conselhão”, outra obsessão
de Lula. O órgão reúne trabalhadores, empresários e sociedade civil para discutir
projetos para o país. Para não ter de se desligar da sociedade, Marco Aurélio
aceitou fazer parte do colegiado, mas não será o presidente.
Ao fim, ele terá uma missão muito mais
sensível do que se estivesse à frente da Secretaria-Geral, pasta que já foi
comandada por Gilberto Carvalho na gestão de Dilma Rousseff. No ministério,
Marco Aurélio se ocuparia apenas com os movimentos sociais, função que
desempenha desde a juventude.
No “Conselhão”, terá que ajudar a manter os
movimentos próximos de Lula. Mas, sobretudo, terá de falar a língua mais
difícil, dominada por poucos no campo da esquerda. Ele será um dos
interlocutores preferenciais do governo Lula com os empresários, em parceria
com o vice eleito e futuro ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio,
Geraldo Alckmin (PSB).
3 comentários:
Lula precisa de espaço pra empregar boquinhas de pelo menos 10 tendências do PT... É, depois de anos longe do Poder, os petistas de carteirinha (e mensalão) precisam de muito abrigo... Mas Lula vai conseguir arranjar todos!
Andrea Jubé...
Ô 'minina' danada, sô!
A jornalista está mais próxima do poder que se possa imaginar.
Ou é competência mesmo para urdir esta trama toda ?
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