O Globo
Atenção ao artigo 4º da Lei Orçamentária
Anual (LOA) de 2023. A redação final confirma o que se desenhava desde o
parecer de Elmar Nascimento — atenção também a esse personagem — para a PEC da
Transição. Que, movendo-se, a estrutura operacional do orçamento secreto
permaneceria, driblado o Supremo Tribunal Federal (STF).
Para os que ainda tinham dúvida, aprovada a
emenda à Constituição que resolveu o fim do governo Bolsonaro e o início do de
Lula, a LOA confirma: a PEC também assegurava tranquilidade às reeleições de
Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, mantido o sistema autoritário e obscuro do
orçamento secreto e, claro, contornado o STF.
Esta é a constante: fintado o STF. A LOA
confirma.
O relator-geral do Orçamento, Marcelo Castro, é objetivo e transparente na jogada. Informa-nos — por meio de gato à lei orçamentária — que não seria na vez dele que a figura que ora encarna, agente-pivô no exercício do orçamento secreto, seria esvaziada em seu poder. Era previsível. Que se ajeitaria para que nada mudasse.
O homem deu um jeito. A segunda
complementação de voto que armou formaliza a gambiarra que acusáramos no artigo
“PEC do orçamento secreto”, ao vedar o cancelamento, sem aval do relator, de
dotações de despesas discricionárias que decorram de indicações do relator; e
assim dispondo — avalie-se — sobre dinheiros que caberiam ao Executivo.
Viva o relator!
O puxadinho é obra-prima. No acordo pela
PEC da Transição, e já estava dado o que viria a seguir, costurou-se para
deslocar quase R$ 10 bilhões, outrora sob emenda do relator (rubrica RP9), às
RP2, sob guarda do Executivo, explicitado, no entanto, que a destinação dos
recursos ficaria sujeita a indicações apresentadas pelo relator-geral do
Orçamento. A brecha tinha texto nada oculto.
O desenho estava traçado na PEC. E o
relator-geral então veio, aos 48 do segundo tempo, para preencher o espaço e
colorir a cousa na lei orçamentária. Venda casada. A grana vai para RP2,
rubrica, no papel, sob gestão dos ministérios, morta a emenda do relator e
atendido o Supremo, mas, na prática, a distribuição não poderá ser dirigida
pelo governo, senão com o aval do relator.
Cumpre-se o estabelecido pelo STF
ludibriando o estabelecido pelo STF.
A grana vai para RP2, sob o que seria
controle formal do governo, mas não poderá ser designada pelo governo. Castro
fixou que a destinação de verbas deslocadas para sob as asas do Executivo
mantenha o rachuncho definido pelos donos do Congresso antes de o Supremo haver
declarado a inconstitucionalidade das emendas do relator.
É um esculacho. O homem, porém, não agiu
(não esculachou) sozinho. Tem lastro. Isso é engenharia de sociedade. Sendo
óbvio que o gabinete de transição — que Lula — concordou com a manobra. Uma
solução pela governabilidade. Né?
Afinal, o relator minou a discricionariedade
do governo na administração de cerca de R$ 10 bilhões que um acordo — pela
aprovação da PEC, certo? — teria transferido ao Executivo; e minou de modo a
manter sob direção do Parlamento, relator como fachada, o futuro dos dinheiros.
Seria — lógica elementar — quebra de
palavra; isso se o acordo não fosse exatamente por esse fim. Não há bobos nem
traídos. Também porque, cabendo a execução das emendas aos ministérios, o
governo guarda o controle — o tempo — das liberações. Um amarrando o outro. A
mesma estrutura de atividade do orçamento secreto.
Verbas realocadas, finada a emenda do
relator, para as mesmas destinações apontadas pelo Parlamento quando ainda
funcionava a emenda do relator. Verbas realocadas, finada a emenda do relator,
para o que seria cota dos ministérios — proibidos os ministérios, na LOA, de
alterar o destino das emendas, cabendo-lhes, contudo, soltar as pratas. A mesma
estrutura de exercício do orçamento secreto.
A negociação pela permanência do esquema é
séria, profissional mesmo, conforme exibe a possibilidade de o supracitado
Elmar Nascimento se tornar ministro da Integração Nacional.
O deputado, relator da PEC da Transição na
Câmara, parceiro de Lira na solução pela continuidade do orçamento secreto, é
senhor da Codevasf, uma das superfícies preferenciais para aplicação da bufunfa
do orçamento secreto, companhia que provavelmente ficará sob o Ministério da
Integração Nacional, pasta cujo orçamento, ainda na forma atual de
Desenvolvimento Regional, foi robustecido com a expansão fiscal promovida pela
emenda à Constituição relatada por Nascimento.
Ciclo perfeito, perfeitamente fechado. Pura
arte.
Faltaria ainda, por justiça a essa pintura,
um ministério para Davi Alcolumbre, aquele que fez os vales dos rios São
Francisco e Parnaíba chegarem ao Amapá. O União Brasil — a união pelo Brasil! —
merece.
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