sábado, 24 de dezembro de 2022

Hélio Schwartsman - Envelhecimento e pênaltis

Folha de S. Paulo

Ele não assimilou as lições do biólogo Peter Medawar sobre a senescência

Qual a semelhança entre a senescência, o processo de envelhecimento que leva à morte, e a escalação dos batedores numa disputa de pênaltis?

Gosto de futebol. Assisti, de esguelha, a boa parte dos jogos da Copa. Mas não sou muito assíduo na leitura do noticiário esportivo. Não porque eu desacredite das análises dos especialistas ou desconsidere o talento dos jogadores, mas porque estou convencido de que, ao fim e ao cabo, é o acaso quem dá as cartas. Para saber com algum rigor qual é o melhor de dois times parelhos, eles precisariam se enfrentar centenas de vezes. Basta lembrar que, se a diferença de competência for de cinco pontos percentuais (55% a 45%), o time mais fraco vencerá o mais forte em 9 de cada 20 partidas que não terminarem em empate.

Foi com atraso, portanto, que descobri que Tite vem sendo crucificado pela escalação dos batedores de pênalti na disputa contra a Croácia. Ele teria errado por não ter posto os goleadores mais eficazes para chutar antes. Gosto de Tite, mas creio que ele pisou mesmo na bola. Ele não assimilou as lições do biólogo Peter Medawar sobre a senescência.

Por que envelhecemos? Em princípio, não seria necessário. As células do corpo se renovam o tempo todo e não seria impossível que o fizessem sem piorar a performance. Mas a lógica da evolução é implacável. Uma vez que a morte pode chegar a qualquer instante, são maiores as chances de alguém ser jovem do que de ser velho (é mais fácil completar 10 anos do que 20 ou 80). E seria um erro "enfraquecer" alguém de 20 anos com vistas a facilitar-lhe a vida aos 40. Assim, genes que fortalecem organismos jovens à custa dos mais velhos são favorecidos pela aritmética e pela biologia e se acumularam ao longo da evolução. O envelhecimento é um capricho estatístico.

O mesmo vale para a disputa de pênaltis. De nada adianta guardar um bom batedor para o final se há risco de morrer no caminho.

 

2 comentários:

Anônimo disse...

Parece que é o acaso mesmo quem dá as cartas...
Encerrar jogos de copa e a própria Copa por disputa de pênaltis é o fim da picada, azar puro...

ADEMAR AMANCIO disse...

Alguém já disse que o ''acaso'' é Deus,pode ser,quem decide tudo é ele mesmo,rs.