sábado, 24 de dezembro de 2022

Ricardo Henriques - Novos ares para políticas públicas

O Globo

Despedida de 2022 marca o fim de um ciclo político em que nossas instituições democráticas foram testadas ao limite

Fim de ano é sempre época de encontros, reencontros, e de renovação de esperanças. Mas a despedida de 2022 tem ainda mais simbolismo por marcar também o fim de um ciclo político em que nossas instituições democráticas foram testadas ao limite.

Individual e coletivamente, chegamos exaustos ao fim do ano, mas com o desejo de que encontraremos um caminho de pacificação, com desenvolvimento social e econômico, pautado sobretudo pela equidade. Não será uma tarefa fácil, mas é possível vislumbrar novos ares para políticas públicas essenciais para o desenvolvimento social e ambiental.

Um desses sinais positivos é o retorno do Bolsa Família. Primeiro, por se tratar de uma política de transferência de renda de caráter permanente, e com valores atualizados, algo que será crucial para o alívio da pobreza no curto prazo.

Segundo, há boas expectativas de recomposição do CadÚnico, um instrumento de monitoramento do público-alvo do programa que foi menosprezado no Auxílio Brasil, mas que é essencial para fazer o pêndulo de coordenação da política social de forma integrada, aumentando a probabilidade de mobilidade social das famílias vulneráveis no médio prazo.

Terceiro, as perspectivas de aumento de um valor adicional para famílias com crianças e de maior atenção às condicionalidades contribuirá mais para a redução da reprodução intergeracional da pobreza. Vale dizer, no entanto, que sua efetiva superação dependerá também da capacidade do governo em criar condições para a inclusão produtiva dos beneficiários.

Há boas perspectivas também para o ecossistema de inovação brasileiro. Além da necessária recomposição do orçamento das instituições federais de ensino técnico e superior, órgãos como a Finep (Financiadora de Estudos e Projetos) e a Embrapii (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial), apenas para citar dois exemplos, poderão ser fortalecidos por meio da ampliação e diversificação de agentes e instituições envolvidos na produção de ciência no Brasil.

Isso poderá conferir maior robustez à inovação do país, maximizando o aproveitamento da janela de oportunidades trazida pelo enfrentamento à emergência climática, por exemplo.

Neste campo, há uma grande oportunidade de a política externa brasileira adotar o posicionamento altivo e ativo, voltando a ser protagonista internacional da agenda ambiental e climática. Para além de o clima ser um dos principais compromissos do futuro governo, será fundamental investir na educação e nos sistemas de formação profissional, de forma a construir uma ponte que viabilize a instalação de uma economia de baixo carbono e que transforme nossas vantagens comparativas em competitivas em relação aos países desenvolvidos.

Para tanto, conforme tenho argumentado de maneira ainda mais enfática neste espaço, a educação, da creche à pós-graduação, será chave. No curto prazo, a recomposição da aprendizagem e a redução da evasão escolar são urgentes e devem ser priorizadas pelos novos governos.

É preciso, no entanto, olhar para o futuro, o que significa aperfeiçoar a governança de nossa política educacional. Será fundamental a retomada do diálogo com todos os entes federativos e atores do campo educacional, o que pode ser facilitado pela aprovação do Sistema Nacional da Educação (SNE), em tramitação no Congresso.

Com efeito, será dada maior organicidade ao regime de colaboração, tanto na educação básica quanto no ensino superior, na medida em que toda a formação dos professores se dá nessa etapa educacional, impactando a qualidade da educação básica.

Os parágrafos acima focam, todos, em áreas vitais para o desenvolvimento social. Isso não significa dizer que outros setores não são estratégicos. Por exemplo, sem crescimento econômico de qualidade, todas as tarefas descritas e muitas outras ficam dificultadas ou até inviabilizadas.

Mas a relação entre a economia e o social precisa ser encarada não como uma disputa de prioridades, mas, sobretudo, como partes indissociáveis de uma estratégia coerente que, ao fim, tenha como objetivo melhorar as condições de vida de toda a população, especialmente da mais vulnerável.

Nesse sentido, é digno de registro que, pela primeira vez na história, teremos um ministro da Fazenda que já ocupou a pasta da Educação, além de ter sido prefeito da maior cidade do país. Além disso, a equipe ministerial já anunciada, formada por mulheres e homens experimentados e que trabalham com evidências, tem capacidade e sensibilidade para executar políticas norteadas por esses princípios.

Isso obviamente não é suficiente para garantir que entraremos em rota positiva de desenvolvimento econômico e social, mas é uma indicação positiva que concede esperança. Há muito trabalho a ser feito, mas este é um período em que, mais do que qualquer outro, nos permitimos sonhar com um futuro próspero.

 

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