Valor Econômico
A única despesa que espera-se que caia é
com o pagamento dos juros que recaem sobre a dívida, que passaria a assumir
trajetória decrescente
O novo arcabouço fiscal, anunciado ontem
pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é bastante gradual e seu impacto na
dívida não é de queda, ao contrário, a dívida bruta do governo geral é
crescente, mas não de forma explosiva.
Estabelece-se um compromisso de sair de um
déficit primário de 0,50% do PIB neste ano - podendo variar 0,25 ponto
percentual para mais ou para menos - para um superávit de 1 % do PIB, sujeito à
banda de variação citada acima, em 2026.
“O
atual teto de gastos passa a ter banda com crescimento real da despesa primária
entre 0,6% a 2,5% ao ano (mecanismo anticíclico), com Fundeb e piso [de
salários dos profissionais] de enfermagem excluídos dos limites (regras
constitucionais já existentes)”, segundo o texto divulgado pelo Ministério da
Fazenda.
O crescimento da despesa fica limitado a 70% da variação da receita primária dos últimos 12 meses, terminados em junho de cada ano. Se o resultado primário for superior ao teto da banda, os recursos excedentes poderão ser gastos em investimentos - sendo que estes têm um piso.
Já se os esforços do governo para aumentar
as receitas e reduzir as despesas não forem bem-sucedidos e o resultado das
contas primárias ficarem abaixo da banda inferior, o governo só poderá contar
com o crescimento da despesa equivalente a 50% do crescimento da receita no
exercício seguinte.
No caso da trajetória do resultado
primário, obedecendo o esquema desenhado pelo governo, saindo de 0,5% do PIB de
déficit neste ano para um equilíbrio das contas em 2024, superávit de 0,5% do
PIB em 2025 e de 1% do PIB em 2026, a dívida como proporção do PIB sai de
75,11% este ano para 76,54% em 2026. Esta é a alternativa número 1. A de número
2 é no caso de a trajetória do resultado primário ser 0,25 ponto percentual
para menos. Aí, com o superávit de 2026 em 0,75%, e não 1% como consta do
primeiro cenário, a dívida sai dos mesmos 75,11% do PIB neste ano para 77,34%
em 2026.
O mercado reagiu positivamente ao anúncio
do novo arcabouço para o controle das contas públicas. Entendeu-se que a área
econômica do governo puxou até onde dava para puxar e estabeleceu uma
estratégia transparente que deverá ser rigorosamente cumprida. A despesa
cresce, mas de forma moderada, avalia uma fonte da área financeira.
A única despesa que espera-se que caia é
com o pagamento dos juros que recaem sobre a dívida. E esta, então, passaria a
assumir uma trajetória decrescente. Aí vão dois exercícios: no caso de se obter
um fechamento da taxa de juros de um ponto percentual e outro que é na hipótese
deste ser de dois pontos percentuais.
Isso equivaleria a ter uma taxa de juros
neutra de uns 3% a 3,5%, menor, portanto, que os 4% de juros neutros estimados
pelo Banco Central, o que será possível se o governo conseguir, finalmente,
aprovar uma reforma tributária.
No primeiro cenário, de fechamento dos
juros de um ponto percentual, a dívida sairia de 75,07% do PIB neste ano para
75,70% do PIB no próximo e terminaria 2026 em 75,05% do PIB. Já no caso do
fechamento dos juros de dois pontos percentuais, a queda da dívida/PIB é mais
pronunciada: sairia de 75,03% este ano para 73,58% em 2026, último ano de
mandato do governo Lula. Isto, levando em conta o superávit primário
estabelecido como compromisso pelo governo, sem considerar a banda de variação.
No Congresso, o arcabouço fiscal deve
chegar em uma semana na forma de projeto de lei complementar e a expectativa do
governo é que ele seja rapidamente aprovado. Em maio, com o arcabouço fiscal
aprovado, o governo se debruçará sobre a reforma tributária, de forma que seja
votada na Câmara ainda em junho.
Com esses dois temas sendo tocados, ficará
claro que o governo de Lula tem rumo e, assim, haverá chance de a economia
recobrar suas cores. Com a economia rodando, sem a explosão do desemprego, o
governo Lula finalmente poderá baixar sua taxa de ansiedade e começar a
trabalhar no que realmente interessa.
Mais importante, agora, é não perder o
momento e focar na reforma tributária, que poderá ser votada na Câmara no fim
do primeiro semestre e, no Senado, em setembro. A esperança é que a reforma
desobstrua a economia e libere energia para o país voltar a crescer.
Nesta quinta-feira foi dado um importante
passo pelo governo ao definir qual será a sua política fiscal que substituirá a
do teto para o gasto público que vigorou até então, com quebras aqui e ali.
Pode-se achar que o governo foi pouco ousado no controle do gasto público, mas
ninguém esperava que fosse.
Recado importante
Ao mesmo tempo em que Haddad expunha os
contornos do arcabouço fiscal, no Banco Central o presidente, Roberto Campos
Neto, dava entrevista sobre o Relatório Trimestral de Inflação. E, durante esse
evento, Campos falou algo bastante importante para os que, no governo,
pretendem constrangê-lo a baixar os juros: Ele disse que para enquadrar a
inflação na meta neste ano os juros deveriam estar em 26,5% ao ano, e não em
13,75%. Ou seja, o Copom está suavizando o cumprimento da meta e, portanto,
considerando o mercado de trabalho, o emprego.
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