sexta-feira, 31 de março de 2023

Lu Aiko Otta – Proposta tenta equilibrar gasto e divida

Valor Econômico

A proposta do novo arcabouço fiscal apresentada nesta quinta-feira (30) pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, consegue achar um equilíbrio entre o desejo do governo Lula (PT) de recompor gastos e a necessidade de evitar o crescimento da dívida. Além disso, aponta em direção à necessária melhoria da qualidade do gasto público.

Porém, não é certo que tudo será concretizado. O governo conta com a aprovação, pelo Congresso Nacional, de novas medidas que elevarão as receitas entre R$ 100 bilhões e R$ 150 bilhões para dar “consistência” aos resultados fiscais projetados, disse o ministro.

Que medidas são essas, não foi revelado. Segundo Haddad, são destinadas a “fechar ralos do patrimonialismo brasileiro”. Eliminar tratamentos a setores favorecidos, muitos dos quais já caducaram. A equipe técnica já identificou “grandes jabutis”, comentou. “Talvez, um dos maiores rebanhos.”

Segundo o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, o alvo são os gastos tributários. Essa é uma conta de R$ 450 bilhões, composta por mais de 80 regimes especiais para setores que não pagam ou arcam com menos impostos. Todos passaram pelo crivo do Congresso Nacional. A reversão de parte deles é uma pauta que se discute há mais de duas décadas.

“É um momento incontornável”, diz Haddad

Haddad avaliou que é hora de enfrentar essa agenda. “É um momento incontornável”, afirmou. “Não temos alternativa.” Reconheceu, por outro lado, que essa é uma agenda “exigente” que demandará um longo trabalho de convencimento.

Está no próprio arcabouço uma resposta sobre por que deputados e senadores concordariam em rever tratamentos especiais que ajudaram a criar. Pelas regras apresentadas nessa quinta-feira, as despesas primárias (que não incluem juros) crescerão ao ritmo de 70% do aumento das receitas líquidas reais. Ou seja: quanto maior a arrecadação, maiores podem ser os gastos.

Como as emendas de parlamentares ao orçamento estão incluídas nesse limite para despesas, está aí um bom argumento para angariar apoio político.

No momento, porém, o Congresso ainda não apreciou sequer as Medidas Provisórias (MPs) enviadas pelo governo em janeiro. Elas deram base para melhorar o resultado esperado para as contas públicas deste ano em R$ 110 bilhões. O impasse entre Câmara e Senado em torno do rito de apreciação dessas propostas traz o risco de as MPs perderem a validade.

Se as medidas de aumento de arrecadação não forem aprovadas, será necessário reduzir gastos correntes para adequá-los ao limite de crescimento de 70% da variação da receita.

Caso a despesa estoure os limites e o resultado primário (diferença entre receitas e despesas, exceto juros) fique menor do que a meta estabelecida para o ano, a “punição” é limitar os gastos do ano seguinte a 50% (e não mais 70%) do crescimento das despesas.

O arcabouço ainda inova ao determinar que os investimentos terão um piso. Ficarão, em termos reais, no patamar dos R$ 70 bilhões de 2023. Historicamente vítimas preferenciais dos programas de aperto nas contas públicas, desta vez eles ficarão protegidos.

O que significa que, quando for necessário conter os gastos, os cortes recairão sobre gastos correntes. Para evitar que programas prioritários sejam atingidos, entrará em cena a revisão de gastos.

Tocado pelo Ministério do Planejamento, esse trabalho buscará aperfeiçoar ou eliminar ações que não estejam dando resultado, abrindo espaço para uma melhor alocação de recursos. É outra pauta espinhosa à frente.

A ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) diz que o Banco Central analisará, além do desenho do novo arcabouço fiscal, sua tramitação (no Congresso) e sua implementação.

Haddad reconheceu serem “legítimos” os questionamentos sobre a possibilidade de cumprimento do plano. Acrescentou que a apresentação do arcabouço é apenas o início do trabalho. Mas afirmou que, a seu ver, não há nada que impeça o Brasil de receber investimentos a partir de agora.

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