Valor Econômico
A reação positiva do presidente do Banco
Central, Roberto Campos Neto - “Quero reconhecer o esforço da Fazenda em um
projeto que é duro em um governo que tem bastante divisões” -, sinaliza que o
arcabouço fiscal se aproxima de um de seus objetivos, que é o de mostrar uma
trajetória crível para a sustentabilidade do gasto público e, assim, obter
trégua do Comitê de Política Monetária.
O presidente do conselho de administração
do Bradesco foi na mesma linha. A nota de Luiz Carlos Trabuco empilha elogios:
criativa, flexível e simples. A nota da Febraban, assinada pelo presidente da
federação dos bancos, Isaac Sidney, reprisa o tom: “É um avanço na busca da
trajetória sustentável da dívida pública”.
Economistas dos bancos reagiram com mais ceticismo. A maioria chama atenção para a dependência excessiva do desempenho da receita e reclama do mecanismo anticíclico que, ao prever um aumento de gasto de pelo menos 0,6%, mesmo sem crescimento da arrecadação, aumentará a dívida.
O comportamento do mercado, porém, esteve
mais para Campos Neto, Trabuco e Febraban que para o ceticismo dos economistas,
na linha do “pelo menos agora temos uma regra”: dólar e juro caíram. Bolsa
subiu. Haddad, pasme, caiu nas graças do mercado.
Na linha inversa do ceticismo dos
economistas, um dirigente das finanças pondera que não havia como esperar que
um governo do PT radicalizasse na contenção das despesas depois de quatro anos
em que o bolsonarismo manteve o gasto social deprimido.
O relato é de quem tirou o chapéu: Haddad
virou o jogo e assumiu a narrativa econômica do governo depois de assumir o
cargo derrotado na prorrogação da desoneração; ele construiu um modelo que
atrela o gasto ao incremento de receita com uma meta de superávit. Ainda
lembrou os estudos marxistas do ministro antes de concluir que o arcabouço está
de muito bom tamanho.
Era com um entusiasmo mais ou menos neste
tom que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), vinha se conduzindo em
relação à negociação do arcabouço. Reagiu ao seu anúncio, porém, sem qualquer
gordura efusiva. Foi direto ao ponto ao dizer que, para o arcabouço depende do
que o governo vai mandar para elevar receita sem aumentar imposto, cortando
incentivo e isenções e aumentando a base de tributação.
O anúncio do arcabouço coincide com duas
más notícias para Lira: a rejeição, pelo Senado, da proposta que aumenta o
número de deputados nas comissões mistas por onde tramitam as medidas
provisórias e a formação de um bloco na Câmara reunindo PSD, MDB e
Republicanos. O bloco, com 142 deputados, é o maior da Câmara e tem viés
governista.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco
(PSD-MG), beneficiário dos dois revezes de Lira, foi quem reagiu com incontido
entusiasmo “Percebi de todos os líderes, inclusive de oposição, um compromisso
com uma pauta que é fundamental para o Brasil, que é a disciplina e o
equilíbrio fiscal”, disse. “É uma agenda civilizatória.”
Lira promete tramitação rápida para o
arcabouço, mas é precipitado apostar como as regras sairão da Câmara. A
flexibilidade do modelo, corretamente saudada por Haddad como sendo o atributo
que faltava ao teto de gastos, é também a porta de entrada para intervenções
legislativas.
Se o Congresso quiser recuperar o clímax do
poder que usufruiu na vigência do teto de gastos, se servirá desta
flexibilidade para aumentar o arrocho sobre os gastos do Executivo. Foi assim
que os parlamentares se assenhoraram do Orçamento. Mudaram a Constituição sete
vezes para abrigar puxadinhos mas o fizeram mediante acertos sobre a divisão do
butim. A desabrida adesão de Pacheco ao arcabouço, porém, demonstra que, se a
Câmara armar esse jogo, o Senado pode desfazê-lo.
O entusiasmo do setor financeiro, lembravam especialistas em Orçamento no Congresso, não pode ser dissociado da negociação da reforma tributária, em que se desenrola uma guerra surda contra o aumento de tributação. Ouviu-se de tudo na recepção ao arcabouço menos da ameaça que chegou da Flórida. O ex-presidente Jair Bolsonaro, de volta ao Brasil, foi um não assunto. O destinatário das joias sauditas não foi lembrado nem mesmo quando Haddad disse que elevaria a base de tributação investindo contra as fraudes fiscais.
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