Valor Econômico
Ninguém sairá vendendo ações da Petrobras
por causa da taxação das exportações, o que foi, portanto, uma boa solução, diz
José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator
Depois de dias de intenso tiroteio da ala
política do governo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, obteve uma vitória
sofrida e cheia de condicionantes em torno da tributação de combustíveis.
Mas venceu. De quebra, reafirmou sua
estratégia de retomada do crescimento econômico. E colocou pressão sobre o
Banco Central, ao apontar para as nuvens no horizonte alimentadas pelos juros
altos: o risco de recessão e as dificuldades de crédito enfrentadas pelas
empresas.
A senha do desfecho favorável a Haddad no caso dos combustíveis estava dada no final da manhã de segunda-feira, quando ele convenceu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a lhe garantir os R$ 28,8 bilhões esperados com a volta da cobrança dos tributos federais sobre gasolina e etanol. O próprio presidente resistia à ideia de elevar os preços nas bombas. Seus conselheiros políticos defendiam uma volta gradual dos impostos.
Ao decidir que o Ministério da Fazenda não
perderia um só centavo do que planejava receber, o presidente não tratou só de
combustíveis e tributos. Deu um sinal de apoio à estratégia traçada por Haddad.
Isso foi percebido pelo mercado, que reduziu juros futuros na segunda-feira -
mas voltou a elevá-los nessa terça-feira, 28, na falta de detalhes sobre como a
medida seria implementada.
Haddad levou o que queria dentro de uma
conciliação. O impacto para o consumidor foi o menor possível, como exigia
Lula; a taxação sobre gasolina e etanol voltou apenas em parte, como demandava
o entorno do presidente.
Para preservar a arrecadação, decidiu-se
taxar as exportações de óleo cru pelo período de quatro meses. Essa solução,
proposta por Haddad e bancada por Lula, não está livre de polêmica.
“Copia a Argentina”, sentencia a economista
Elena Landau, que durante a campanha de 2022 elaborou o programa econômico da
candidata Simone Tebet (MDB). Era melhor, acrescentou ela, voltar a cobrar os
tributos integralmente, como era antes.
O economista-chefe do Banco Fator, José
Francisco de Lima Gonçalves, acredita que ninguém sairá vendendo ações da Petrobras por
causa da taxação das exportações. Assim, considera que foi uma boa solução. E
acha também que essa medida não deverá virar precedente.
Haddad ainda introduziu, na reoneração dos
combustíveis, uma pegada ambiental. Essa é uma vertente que escolheu para
integrar seu programa. Instituiu uma tributação mais pesada na gasolina do que
no álcool, para desestimular o uso de combustíveis fósseis. E disse que os
órgãos de defesa do consumidor precisarão entrar em campo para garantir que
essa diferenciação se reflita nas bombas.
Não perder receitas federais, como foi
feito, é condição colocada pelo Banco Central para iniciar a queda dos juros,
comentou o ministro. Ele disse esperar a harmonização entre as políticas fiscal
e monetária em torno de um projeto de desenvolvimento.
Essa diplomacia que Haddad usou no caso dos
combustíveis já foi vista em outra discussão espinhosa, a mudança da meta de
inflação e seu impacto na taxa de juros. O ministro conseguiu evitar que o tema
fosse pautado na reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN) de fevereiro,
como queriam os conselheiros políticos de Lula.
Ao mesmo tempo, afirmou que anteciparia
para este mês o anúncio do arcabouço fiscal. Um plano que dê à dívida pública
uma trajetória de sustentabilidade criará condições para que a redução dos
juros ocorra de forma crível.
Evitou outro tema espinhoso. A indicação de
um novo diretor de Política Monetária para o Banco Central, que deveria ter
sido feita até ontem, não ocorrerá nesta semana.
Assim, aos trancos e barrancos, o ministro
vai consolidando sua estratégia. O lançamento do Desenrola, prometido para a
próxima semana, deverá contribuir para dar visibilidade ao programa de Haddad.
O mesmo ocorre a partir dos primeiros movimentos no Congresso para a apreciação
da reforma tributária.
Avaliação de resultados
A ser apresentada este mês, a proposta do
novo arcabouço fiscal deverá privilegiar a qualidade dos gastos como um
critério. No poderoso Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), que
movimentará R$ 84 bilhões em 2023, o trabalho no momento é de construção de
indicadores que apontarão os resultados das politicas públicas, disse a esta
coluna a presidente do fundo, Fernanda Pacobahyba.
Passam por suas mãos os recursos do Fundo
Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e do Programa Nacional
de Alimentação Escolar (Pnae), por exemplo.
A medição de resultados é particularmente
difícil após anos de dependência de emendas do orçamento secreto, comentou. Por
causa desse mecanismo, políticas públicas foram executadas conforme o desejo de
quem enviou a verba, e não necessariamente por priorizarem os municípios mais
carentes do apoio federal. “Emenda parlamentar é bem-vinda, mas não pode ser a
sustentação da política”, argumenta.
Nos últimos anos, a União abdicou de seu
papel coordenador de políticas públicas em educação, afirma a presidente. A
retomada de um relacionamento construtivo com Estados e municípios está no
centro de seu trabalho.
Pacobahyba falará sobre qualidade nos
gastos com educação no I Seminário Internacional de Finanças dos Entes
Subnacionais, promovido pelo Tesouro Nacional e pela Escola Nacional de
Administração Pública (Enap), nos dias 6 a 8 de março.
A fragilidade fiscal de algumas unidades da
federação é um dos problemas herdados pelo atual governo. Eles têm consumido
cerca de 70% do tempo da equipe econômica, queixou-se Haddad.
Está em fase final a negociação na qual a
União recomporá as perdas sofridas em 2022 pelos Estados, devido ao corte do
ICMS sobre combustíveis, energia, transportes e comunicações.
Isso resolve o orçamento dos Estados apenas em 2023. Ainda resta o futuro a equacionar.
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