O Estado de S. Paulo.
Entre cobranças no Congresso e pressões
petistas, Lula perde tempo com tropeços políticos, alimenta incertezas
econômicas e demora a pôr o governo em movimento
Carregado de promessas e já envolvido em
ações importantes, como a defesa da igualdade salarial para homens e mulheres,
o novo governo pouco fez até agora, no entanto, para elevar a expectativa de
crescimento econômico neste ano e no próximo. Só os mais otimistas se atrevem,
por enquanto, a apostar numa expansão de 2% para o Produto Interno Bruto (PIB)
em 2023. Nada permite esperar um desempenho muito melhor em 2024. Enquanto o
roteiro econômico permanece enevoado, o presidente se desgasta com decisões
custosas, como a nomeação de um ministro inadequado e sem currículo para uma
função de primeira linha no Executivo federal.
Para o nomeado, foi um momento de extraordinária projeção nacional. Tirado da obscuridade pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, carregado por aviões da FAB e empenhado na busca de cavalos de raça, o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, conquistou as capas da grande imprensa, acusado de usar meios públicos para negócios pessoais.
Como deputado federal, já havia destinado
recursos do orçamento secreto a obras no município maranhense de Vitorino
Freire, governado por sua irmã. As obras incluíram o asfaltamento de uma
estrada de acesso a sua fazenda. Como ministro, usou viagem de trabalho, com
avião militar, para comparecer a um leilão de cavalos no Estado de São Paulo. O
presidente decidiu mantê-lo no cargo, para evitar problemas no Congresso,
segundo se explicou em Brasília. O detalhe é notável e pode surpreender quem
desconhece a política brasileira: um ministro de imagem comprometida tornou-se
condição de governabilidade, no presidencialismo de coalizão.
Sabe-se, portanto, por que Juscelino Filho
foi mantido no posto. Mas ninguém apontou um bom motivo para sua ascensão a um
ministério, mesmo tendo sido recomendado pelo senador Davi Alcolumbre, do União
Brasil. Não poderia o presidente, se estivesse de fato preocupado com a
administração, ter negociado um nome com melhores credenciais? Mas o acordo foi
feito, e a nomeação do parlamentar maranhense, uma figura sem peso político e
sem preparo para a nova função, foi mais um tropeço, mais um desperdício de
tempo e mais uma queima de capital político.
Com esse e outros equívocos, Lula chegou ao
terceiro mês de mandato com muita confusão e pouca administração, sujeito ao
poder dos chefões do Congresso e pressionado pelos defensores das velhas
bandeiras petistas.
Mas também o presidente se mostra
prisioneiro do antigo petismo. Já se dispôs a mexer nos preços de combustíveis
e criticou a distribuição de dividendos pela Petrobras. Admitiu tributar a
exportação de petróleo, durante alguns meses, como se isso pudesse conter, no
mercado interno, os preços dos derivados. Com isso, reeditou, comicamente, um
erro cometido várias vezes na Argentina, onde governos tentaram combater a
inflação onerando as exportações de alimentos. Além disso, o presidente insiste
na ocupação política das estatais, menosprezando critérios técnicos e valores
empresariais.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem
procurado pacificar a relação do Executivo com a diretoria do Banco Central
(BC), hostilizada por Lula, e promete apresentar em breve um arcabouço de
política fiscal, isto é, de administração das finanças públicas. Há sinais de
otimismo, no mercado, em relação a esse arcabouço e à evolução dos juros. Um
programa confiável de condução das contas federais – por enquanto apenas uma
promessa – será essencial para um cenário tranquilo e para uma redução sensível
dos juros a partir deste ano.
Além de um compromisso fiscal, ainda falta
uma clara indicação de como trabalhará o Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES). O BNDES pode ser um poderoso instrumento de
prosperidade e de modernização econômica e social, como já se comprovou muitas
vezes. Mas também pode produzir distorções e desperdício, quando o governo
abusa de subsídios e se permite escolher campeões nacionais.
Políticas de financiamento mal concebidas
podem resultar em custos para o Tesouro e em desarranjos fiscais. Também esses
desacertos compõem a história petista e o desastre final do governo da
presidente Dilma Rousseff. Há mais de uma forma de arrebentar as finanças
oficiais. Desmandos parafiscais, cometidos por meio de bancos públicos, podem
ser devastadores.
Se o governo quiser usar o BNDES para
redução de juros, numa jogada contrária à política do BC, cometerá enorme
imprudência. Seria um erro menosprezar essa possibilidade, quando há inegável
divisão no PT e fortes pressões contra a seriedade financeira.
O risco de um retorno aos padrões da gestão Rousseff é evidente quando líderes petistas e membros da equipe econômica defendem gastança e subsídios. Além disso, o presidente já admitiu a importância de um bom – e muito custoso – entendimento com os caciques do Congresso. Se insistir em cuidar da saúde fiscal, o ministro Haddad terá como principais desafios sobreviver no cargo e conter seu chefe. Nenhum manual de finanças públicas tem respostas para esses problemas.
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