Educação é o melhor de todos os programas sociais
O Globo
Estudo concluiu que melhoria no ensino
poderia ter impacto anual no crescimento superior a dois pontos
Brasileiros e sul-coreanos tinham o mesmo
nível de vida nos anos 1960. Seis décadas depois, o PIB per capita da Coreia do
Sul é mais que o triplo do brasileiro. Ressalvadas as características
intrínsecas, a maior diferença nas duas trajetórias está num fator conhecido: a
educação. A Coreia do Sul investiu pesadamente na formação de sua população e
apresenta desempenho bem superior ao Brasil e a países ricos em testes
internacionais como o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa).
Tal comparação é usada com frequência por economistas quando querem chamar a atenção para a relevância da educação no crescimento. Como seria o Brasil se tivesse, ao longo dos anos, dado a ela a importância que merece? Numa palavra: bem mais rico. É essa a conclusão de uma análise de várias pesquisas sobre o tema feita na Escola de Economia da FGV de São Paulo a pedido da Fundação Lemann. “A qualidade da educação está positivamente associada com maiores taxas de crescimento econômico”, diz o estudo.
Comparando pesquisas desde os anos 1990, a
equipe liderada pelo economista André Portela concluiu que, se o desempenho
médio dos brasileiros em testes padronizados como o Pisa subisse até a menor
nota dos 16% melhores — em estatística, o equivalente a um desvio padrão —, o
crescimento do PIB per capita aumentaria entre 1 e 2,2 pontos percentuais por
ano.
É fundamental entender que o crescimento é
a província dos pequenos números. Uma diferença de décimos nos índices tem
impacto enorme. Crescendo 1% ao ano, uma economia leva 70 anos para dobrar o
padrão de vida da população. Crescendo 2%, metade disso: 35 anos. Quando se
fala em acabar com a pobreza, portanto, nenhum programa social tem efeito
comparável a investir em educação.
Infelizmente, segundo Portela, o Brasil
está nas últimas posições do ranking dos 79 países que participaram do Pisa em
2018, atrás até daqueles em estágio comparável de desenvolvimento, como México,
Costa Rica ou Uruguai. De lá para cá, o fechamento das escolas na pandemia só
deteriorou a situação. Em 2020, os alunos aprenderam menos de um terço do que
teriam aprendido com ensino presencial. A competência de estudantes do 9º ano
do ensino fundamental recuou ao nível de 2015 em matemática e ao de 2017 em português.
Isso em São Paulo, estado mais rico do país.
Os gastos em educação aumentaram por 15
anos, nos governos do PSDB e do PT. O Estado hoje destina ao setor 7% do PIB,
percentual comparável ao dos países da OCDE (embora o investimento per capita
seja menor). Mas isso não se traduziu na melhoria necessária na qualidade — e a
qualidade, medida pelos testes, é mais importante para o crescimento que a
quantidade de horas que o aluno passa na escola. De acordo com Portela, é
preciso investir mais na primeira infância e distribuir melhor os recursos,
ainda concentrados desproporcionalmente no ensino superior.
Um estudo do Banco Mundial concluiu no ano
passado que o PIB per capita brasileiro seria dois terços maior se o país
oferecesse educação e saúde de qualidade para a população. A pesquisa da FGV
corrobora tudo o que já se sabia sobre os benefícios para a sociedade de um
sistema de ensino eficiente. O que o Brasil fez até agora no setor não foi
pouco, mas ainda é insuficiente.
Violência nos estádios de futebol exige
ação da polícia e dos clubes
O Globo
Cenas de selvageria como as do clássico
entre Vasco e Flamengo infelizmente se tornaram comuns
São inaceitáveis as cenas de selvageria
protagonizadas por torcedores do Flamengo e do Vasco nas imediações do estádio
do Maracanã no domingo 5 de março. Antes do início do clássico, baderneiros
armados com pedaços de pau e pedras se enfrentaram nas ruas. Ainda fizeram
questão de postar nas redes sociais vídeos das agressões e de suas vítimas.
Pelo menos sete feridos foram levados para o hospital, dois em estado grave.
Infelizmente, tais cenas de violência não
são exceção no conflagrado futebol brasileiro. Tanto entre torcidas rivais
quanto entre apoiadores de um mesmo time. Em fevereiro do ano passado, depois
da derrota do Palmeiras para o Chelsea no campeonato mundial de clubes, em Abu
Dhabi, a confusão tomou conta das imediações do Allianz Parque, onde
palmeirenses estavam concentrados para acompanhar o jogo. Um torcedor morreu
depois de ser baleado.
Entre as atrocidades cometidas em nome do
futebol, ainda está na memória de todos a batalha entre torcedores do Flamengo
e do Botafogo nos arredores do Estádio Nilton Santos em fevereiro de 2017. Em
meio a um tumulto em que não faltaram tiros disparados a esmo, um botafoguense
morreu depois de atingido por golpes de espeto de churrasco. Seis torcedores
ficaram feridos, dois à bala.
Situações assim não são normais. O
confronto expõe torcedores que vão aos estádios pacificamente ou mesmo quem
nada tem a ver com a briga. É preciso ajustar os esquemas de policiamento à
temperatura dos jogos e corrigir falhas como as que permitiram a torcedores de
Flamengo e Vasco se encontrar na estação de trem. Dado o risco de selvageria, é
fundamental manter as torcidas separadas.
Não se trata apenas de policiamento. É
fundamental proibir as torcidas organizadas de frequentar os estádios. Fez bem o Ministério
Público do Rio, antes do Fla-Flu de quarta-feira, em obter na Justiça a
proibição temporária. O MP cogita pedir a implantação da
torcida única nos clássicos, sistema que já vigora em alguns estados. A medida
é de eficácia duvidosa. Primeiro, porque não impede os confrontos — não faltam
exemplos de brigas entre torcedores do mesmo time. Segundo, por prejudicar
aqueles que vão aos estádios incentivar seus times. Em São Paulo, que adotou o
novo esquema, os clubes pressionam as autoridades para voltar ao antigo.
O mais importante é banir dos estádios os bandidos travestidos de torcedores, que vão às arenas apenas em busca de confusão. Não deve ser tão difícil identificá-los. As redes sociais estão repletas de vídeos de trogloditas ostentando suas armas. A tarefa não pode ficar apenas nas mãos da polícia. Os clubes têm sido por demais condescendentes. Precisam ajudar apontando e banindo os agressores. Os dirigentes deveriam ser os primeiros interessados em resolver o problema, que se volta contra os próprios clubes. Ninguém vai querer ir ao estádio sob o risco de se expor a tiros e bombas. O Brasileirão e as fases decisivas da Copa do Brasil e da Libertadores vêm aí. Melhor que as autoridades se mexam desde já.
Seguro contra partidos
Folha de S. Paulo
Demagogia de Lula o impede de admitir que a
autonomia do BC é aliada do governo
"Apoiar bancos centrais independentes
não é de todo alheio à política progressista, dado que a inflação é uma
importante fonte de desigualdade econômica". Quem o assevera é Mario Marcel,
ministro da Fazenda do governo esquerdista de Gabriel Boric, no Chile.
Em seus 33 anos de autonomia, a autoridade
monetária chilena já conviveu com presidentes conservadores e socialistas.
Decerto os governantes discordaram pontualmente das decisões sobre juros, mas
não reverteram a sua prerrogativa de arbitrar com independência as taxas de
curto prazo.
Na mensagem, crítica a uma reportagem
recente da revista britânica The Economist, Marcel vai além e afirma que seu
governo reforçou as linhas de atuação do BC na tarefa de estabilizar os preços.
Comemora a obtenção de um superávit fiscal equivalente a 1,2% do PIB em 2022,
revertendo déficit de 8,8% no ano anterior.
Outro país em que esquerda e direita
alternaram-se no poder sem tisnar a independência do banco central, conquistada
em 1960, foi a Austrália. Grande exportadora de commodities como Brasil e
Chile, e portanto sujeita a solavancos cambiais, a nação da Oceania nem por
isso se desviou do compromisso de longo prazo com o BC.
O jovem estatuto de autonomia do BC
brasileiro, fixado em lei em 2021, já mostrou a sua efetividade. Descasar o
ciclo político dos mandatos de presidente e diretores da autoridade monetária
escudou a economia de uma crise de desconfiança como a que fez disparar o dólar
em 2002, na primeira eleição de Luiz Inácio Lula da Silva.
Desta vez o câmbio mal se mexeu diante do
favoritismo do candidato do PT, e isso mesmo após os experimentos desastrosos
dos aprendizes de feiticeiro do partido, que produziram a gigantesca recessão
de 2014-2016.
Há 20 anos, Lula foi socorrido por um
executivo da banca internacional sem ligação com a esquerda, Henrique
Meirelles, que por sua vez teve de demonstrar engajamento com a estabilização
monetária elevando a Selic para 26,5% ao ano no início da gestão.
Em 2023, a institucionalidade fez o serviço
sozinha, sem a necessidade de elevação dos juros básicos de 13,75% ao ano. Quem
impulsionou os juros da praça foi a boca
incontida do presidente, justamente ao ameaçar a autonomia do BC.
A demagogia do mandatário o impede de
admitir que o Banco Central autônomo é um dos principais aliados do seu
governo. A instituição protegeu o país e o chefe de Estado das ideias econômicas
amalucadas e destrutivas do PT.
O elo perdido
Folha de S. Paulo
Capacitar agentes de saúde para reconhecer
violência contra mulher salva vidas
A violência contra a mulher é um crime
gradativo e silencioso. Segue um trajeto que vai de abusos psicológicos até
agressões físicas e morte. Por ser mais comum no ambiente doméstico e envolver
dependência econômica, fica escondido. Por isso, exige ações estratégicas para
prevenção e punição.
Segundo relatório da Organização Mundial da
Saúde (OMS) de 2021, uma em cada três mulheres de 15 a 49 anos (cerca de 736
milhões) já foi submetida à violência física ou sexual seja pelo parceiro ou
não.
As agressões prevalentes são as do primeiro
tipo (641 milhões), e os países menos desenvolvidos têm maior incidência de
casos, em média 37% —enquanto a mundial é de 27% e, na Europa, os números
variam entre 16% e 21%.
Pesquisa Datafolha divulgada no
dia 2 deste mês confirma os padrões da OMS: prevalência doméstica e impacto
sobre minorias.
Cerca de 33% das mulheres ouvidas viveu
algum episódio de violência cometida pelo parceiro, e o
índice aumenta quando são negras (48%) ou têm escolaridade até o ensino
fundamental (49%).
Tais características tornam fundamental a
implementação de uma rede pública integrada de identificação e notificação de
casos, e o sistema de saúde exerce papel mediador entre as vítimas e o órgãos
de segurança pública e de justiça.
Não à toa, uma das recomendações da OMS é a
capacitação de profissionais de saúde para reconhecer e comunicar agressões
desse tipo. Contudo, essa área ainda encontra entraves no Brasil.
De acordo com levantamento da Vital
Strategies, em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais,
apenas 19,5% dos
casos são registrados nas unidades básicas de saúde, enquanto 80%
aparecem em hospitais ou prontos-socorros. Com a notificação tardia, perde-se a
oportunidade para evitar casos graves ou a morte da vítima.
Os dados referentes à cidade de Goiânia
expõem o problema de modo flagrante. Dentre as causas de mortes de mulheres
quando houve registro de violência prévia, 64,7% foram externas e 33,1% foram
doenças. Nas externas, 78,9% eram agressões e 16,6% eram acidentes.
Ainda mais preocupante, o tempo médio entre
a notificação e a morte em alguns casos de causas externas foi de 32 dias —25%
nos primeiros dias após a notificação.
É necessário, portanto, capacitar profissionais do setor para identificar agressões, inclusive as mais sutis, e implementar uma rede de notificações ágil e contínua entre os órgãos de saúde, de assistência social e de segurança. Perder tempo pode levar a vidas perdidas.
O salvacionismo lulopetista
O Estado de S. Paulo.
Dino diz que, se Lula falhar, ‘abre espaço para a emergência do golpismo’, como se houvesse o imperativo moral de apoiar o governo. Mas a oposição não é feita só de golpistas
O governo Lula da Silva escolheu o tipo de oposição
que mais lhe apraz. É essa direita radical, ignorante e golpista que, há cerca
de dez anos, deixou de ser uma franja no mosaico político-ideológico da
sociedade brasileira para se tornar uma força política capaz de mobilizar
parcela considerável dos eleitores, culminando na eleição de um inimigo
declarado da Constituição de 1988 para a Presidência da República no ano em que
a Carta “cidadã” completou três décadas de vigência.
Não é novidade para ninguém que tanto o
presidente Lula como seus partidários cultivaram a polarização política com
Jair Bolsonaro com profundo esmero, para desventura do Brasil. As razões para
esse mutualismo e seus efeitos deletérios, em que pesem as muitas diferenças
que há entre o petista e sua nêmesis, já foram escrutinadas muitas vezes por
este jornal, nesta mesma página.
A novidade é a tentativa do governo de
reavivar o discurso da polarização com a direita radical no momento em que os
fatos – notadamente a derrota de Bolsonaro em sua campanha pela reeleição e o
assalto às sedes dos Três Poderes no fatídico 8 de Janeiro – começam a empurrar
os extremistas de volta para o nicho da irrelevância ao qual eles sempre
pertenceram. Tamanhos foram os reveses sofridos pela direita radical que alguns
de seus notórios representantes já começam a dar passos públicos no sentido de
uma certa moderação.
O ministro da Justiça e Segurança Pública,
Flávio Dino, resumiu esse movimento do governo em entrevista ao
Estadão, publicada no dia 25 passado.
Perguntado se o Planalto temia a reorganização dos grupos extremistas a partir
do retorno de Bolsonaro ao País, Dino respondeu, com razão, que “esse ethos
golpista, terrorista, do vale-tudo, continua aí, em um estado de latência”.
Entretanto, o seu reavivamento, disse o ministro, dependerá das respostas dadas
pelo próprio governo às prementes necessidades do País. “A pergunta é: o
governo Lula vai melhorar a vida do povo brasileiro? Se a resposta for sim, o
golpismo tende a ser uma força declinante. Se o governo enfrentar dificuldades
no resultado, aí abre espaço para a emergência do golpismo.”
O busílis está nessa formulação marota
segundo a qual o golpismo será mais ou menos forte no País a depender das
eventuais “dificuldades” que o governo Lula terá de “enfrentar” para levar a
cabo seus planos e, assim, produzir o “resultado” que dele se espera. Subjaz
nesse discurso do ministro da Justiça um imperativo quase moral de a sociedade
brasileira abraçar incondicionalmente a agenda do governo Lula e do PT, nos
seus termos, ou a democracia morre no País. Era só o que faltava.
As críticas que porventura a sociedade
brasileira possa fazer ao governo Lula – e as quais este jornal não se furtará
a fazer quando julgar que é o caso – fazem parte de qualquer democracia digna
do nome. Um eventual fracasso do governo Lula não resultará no fim da
democracia – convém lembrar que outros governos fracassaram e não houve
ruptura. Ademais, se o governo Lula não entregar o que prometeu, será por sua
inteira responsabilidade, e não em razão das críticas que receber.
Para neutralizar a retórica salvacionista
do lulopetismo, no entanto, é dever cívico da direita civilizada e democrática
se recompor. Se, como força política representativa, essa direita será capaz de
gerar uma liderança que conquiste corações e mentes da maioria dos eleitores, o
tempo vai dizer. Para a democracia liberal, no entanto, importa apenas que ela
seja capaz de formular soluções responsáveis para os problemas do País e que
tenha voz. Os valores da democracia devem estar constantemente presentes no
debate público.
A enorme dificuldade que Lula teve para
derrotar Bolsonaro no segundo turno da eleição passada autoriza a inferência de
que, fosse outro o adversário do petista – um representante da direita
responsável, liberal e democrática –, talvez Lula não tivesse saído vitorioso
daquele pleito. O presidente decerto sabe disso, daí seu estímulo à
sobrevivência política do golpismo bolsonarista como espécie de fantasma a
assombrar a democracia brasileira – que só Lula, evidentemente, se julga capaz
de salvaguardar.
A igualdade salarial de homens e mulheres
O Estado de S. Paulo.
Projeto de Lula que tenta reduzir a
desigualdade salarial por gênero será mais um a virar letra morta se não vier
acompanhado de políticas públicas consistentes para valorizar as mulheres
O governo enviou ao Congresso um projeto de
lei que torna obrigatória a igualdade de remuneração entre homens e mulheres
que exercem a mesma função em uma mesma empresa. Pela proposta, apresentada
pelo presidente Lula da Silva no Dia Internacional da Mulher, empresas que
mantiverem uma política salarial discriminatória poderão receber multas
correspondentes a até dez vezes o maior salário pago pela companhia. Embora a
Constituição já proíba todo tipo de discriminação, a desigualdade entre homens
e mulheres é uma realidade no mercado de trabalho brasileiro. De acordo com o
IBGE, as mulheres, em média, recebem 78% do que é pago a um homem na mesma
função.
A proposta do governo ainda terá de passar
por debates no Legislativo antes que entre em vigor. Um projeto de teor
semelhante chegou a ser aprovado pela Câmara, em 2011, mas só recebeu aval do
Senado dez anos depois. A redação final previa uma multa menor, de até cinco
vezes o valor da diferença salarial em relação ao homem que exercia a mesma
função.
Contrário à causa, o então presidente Jair
Bolsonaro disse que faria uma “enquete” para decidir se iria sancionar ou vetar
a proposta. Optou, por fim, pela mais covarde das estratégias e usou de sua
proximidade com Arthur Lira (PP-AL) para se livrar do desgaste. Em uma
descarada manobra regimental, Lira solicitou ao Senado que devolvesse o projeto
à Câmara e não o pautou mais em plenário. O Legislativo, agora, terá nova
oportunidade de debater um tema fundamental para uma sociedade mais justa.
Diversos fatores explicam as desigualdades
salariais entre homens e mulheres. Após o auge do surto de covid19, mulheres
tiveram mais dificuldades para a reinserção no mercado de trabalho. O setor de
serviços, em que a mão de obra feminina é predominante, paga menos que outros
segmentos. A presença de mulheres em áreas que tendem a ser menos valorizadas
financeiramente, como educação e enfermagem, contribui para reforçar o quadro.
A reforma trabalhista aprovada em 2017 já
previa multa de R$ 3.753,75 – o equivalente a 50% do maior benefício da
Previdência Social – para inibir esse tipo de discriminação, mas mostrou-se
incapaz de debelar o problema. Com um valor irrisório, os empregadores foram
estimulados a “pagar para ver”, como disse a ministra do Planejamento, Simone
Tebet, em entrevista à Rádio Eldorado.
Há dúvidas sobre se a penalidade maior será
capaz de induzir os empregadores a adotarem políticas salariais mais igualitárias.
Para que não vire letra morta, será preciso ampla fiscalização por parte do
Ministério do Trabalho, bem como a adoção de avaliações periódicas para aferir
a efetividade da lei – mesmo as políticas públicas mais bem-intencionadas podem
gerar externalidades negativas e agravar situações que almejavam solucionar.
No relatório global de desigualdade de
gênero do Fórum Econômico Mundial de 2022, o Brasil ocupava a 94.ª posição
entre 146 países. O ranking é liderado por Islândia, Finlândia e Noruega,
nações conhecidas por múltiplas e sólidas políticas públicas para mulheres nas
mais diversas áreas, forte defesa dos direitos humanos e ampla presença
feminina nos Legislativos e Executivos locais.
Na Islândia, a lei que obriga a igualdade
salarial entre homens e mulheres data de 1961, mas não havia controle nem
gerava resultados. Desde 2018, uma nova legislação obriga empresas com mais de
25 funcionários a adotar políticas de igualdade remuneratória, sob pena de
multa. O país ainda não registra paridade integral, mas é inegável que a lei
alterou a configuração do mercado de trabalho local. Da mesma forma, a
legislação não teria efeitos se fosse uma ação isolada e sem conexão com outras
políticas públicas.
O Brasil está a léguas de distância dos
países nórdicos, mas vai mal mesmo entre seus vizinhos da América Latina e
Caribe, ocupando a 20.ª posição entre 22 nações no ranking de desigualdade de
gênero do Fórum Econômico Mundial. O caminho rumo à menor desigualdade é longo
e desafiador, mas precisa ser trilhado. Há muito a ser feito e várias
experiências internacionais a inspirar essa necessária jornada.
Uma decisão que respeita o Brasil
O Estado de S. Paulo.
Governo acerta ao retomar a exigência de
visto de turistas de países que exigem visto de brasileiros
O governo tomou a decisão correta ao
retomar a exigência de visto de entrada para turistas da Austrália, Canadá, Estados
Unidos e Japão. Não faz sentido que australianos, canadenses, norte-americanos
e japoneses possam entrar no Brasil sem essa condição, enquanto brasileiros são
obrigados a providenciar o visto para entrar naqueles países. Coisa de país que
não se respeita, não de um Estado soberano que defende os interesses de seus
nacionais.
O princípio da reciprocidade – que, em
resumo, significa que um Estado deve tratar outro Estado da mesma forma como
este lhe trata – sempre foi um dos balizadores da política externa deste e de
qualquer outro país civilizado. Entretanto, logo no início do governo de Jair
Bolsonaro, em março de 2019, esse princípio foi preterido pela adulação doentia
do então presidente brasileiro à sua contraparte norte-americana à época,
Donald Trump.
Na primeira visita como chefe de Estado aos
Estados Unidos, Bolsonaro anunciou o fim da exigência de visto para cidadãos de
“países estratégicos” em caráter “unilateral”. À época, justificou a decisão,
formalizada por decreto, alegando que o suposto aumento do turismo
internacional no Brasil representaria incremento de emprego e renda para os
brasileiros.
Ainda que isso tivesse acontecido, a
decisão do governo Bolsonaro continuaria a ser desrespeitosa em relação aos
brasileiros, como se fossem cidadãos de segunda classe. Mas, além de tudo, não
se tem notícia de que os americanos, australianos, canadenses e japoneses
tenham se animado a vir ao Brasil em larga escala por não haver mais exigência
de visto de entrada. Ou seja, o Brasil de Bolsonaro humilhou-se para nada.
Evidentemente, a eclosão da pandemia de
covid19, em março de 2020, não apenas afetou brutalmente o setor de turismo,
como mudou o mundo tal como o conhecíamos. Porém, mesmo nos anos anteriores à
emergência sanitária, o Brasil já não recebia uma quantidade de turistas
estrangeiros à altura de seus muitos atrativos, sobretudo sua exuberância
natural.
Em média, o Brasil recebe cerca de 6,5
milhões de viajantes estrangeiros por ano, de acordo com a Polícia Federal.
Para dar uma ideia de quão baixo é esse número, a Argentina recebe quase 7
milhões de estrangeiros por ano. Na Europa, apenas a Torre Eiffel, símbolo de
Paris, é visitada por esse contingente de pessoas anualmente (6,7 milhões de
turistas, em média).
Decerto a burocracia para obtenção de visto
pode desestimular a vinda de turistas para o Brasil. Mas isso está longe de ser
a principal causa do descompasso entre a miríade de atrativos do País e a
relativa baixa procura por estrangeiros.
O Brasil revolucionará o turismo externo e
interno se passar a tratar com seriedade os problemas que, de fato, afastam
muitos visitantes que olham para o mapa-múndi e se deparam com outros destinos
mais seguros e organizados. Faltam-nos políticas públicas de segurança eficientes
e desenvolvimento em infraestrutura de serviços e transporte. De nada adiantam
campanhas publicitárias institucionais mostrando um Brasil aos estrangeiros
que, ao chegar aqui, eles não encontram.
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