Folha de S. Paulo
Periferia da capital foi responsável por
formar um cordão sanitário contra o bolsonarismo em 2022
Acompanhar as
tendências políticas da cidade de São Paulo é crucial para compreender os rumos
da política brasileira. Não apenas são parte de sua história
lançamentos de lideranças políticas, criação de partidos, sindicatos,
associações empresariais e movimentos sociais que alcançaram âmbito nacional, como
seu eleitorado eventualmente adianta tendências nacionais.
Marta
Suplicy, por exemplo, foi prefeita na cidade pouco antes
de Lula
conquistar a Presidência pela primeira vez. Já a vitória
de João Doria anunciou a ascensão de lideranças de direita mais
radicais e ideológicas.
A despeito de já ter abrigado candidaturas ideologicamente opostas na prefeitura, como Luiza Erundina e Paulo Maluf, é possível afirmar que existe certa estabilidade no eleitorado paulistano.
Desde os anos 1940, as classes altas e
média altas votam, em sua maioria, de forma mais ideológica em candidaturas de
direita. Na falta destas, recorrem ao voto útil e optam por quem mais se
aproximar da defesa de pautas de direita. Historicamente partidos como UDN,
PSD, Arena, PFL, PP e PSDB receberam os votos dos paulistanos mais ricos.
Assim, não é nenhuma surpresa que um
candidato como Ricardo Salles, advogado de extrema direita formado no
Mackenzie, tenha obtido
votação expressiva no Itaim Bibi, um dos bairros mais abastados da cidade.
Já os moradores e moradoras de antigos
bairros operários passaram a votar de forma mais consistente em candidaturas
conservadoras de apelo mais popular a partir dos anos 1980.
Em 1945, tais bairros foram responsáveis
pela maior votação do Partido Comunista em São Paulo —no entanto, quando o
partido se tornou ilegal, o eleitorado operário optou por Jânio Quadros,
candidato que se apresentava como contrário ao status quo, a despeito de ser
direitista.
Depois, após votarem no MDB nos anos 1970 e
1980, os
residentes dos antigos bairros operários optaram por Jânio novamente em 1985 e
durante os 1990 aderiram ao malufismo. Não foi um acidente que Bolsonaro tenha
obtido suas maiores votações na capital justamente em antigos redutos janistas,
como Vila Formosa e Tatuapé.
Quem habita os bairros periféricos da
capital, por sua vez, tende a optar por partidos e candidaturas que representam
as demandas dos mais pobres. Historicamente, tais parcelas do eleitorado
optaram por agremiações localizadas à esquerda do espectro político, como PTB,
MDB e, atualmente, o PT.
Em situações polarizadas entre esquerda e
direita, os habitantes dos bairros de periferia, sobretudo daqueles mais
afastados do centro da cidade, tendem a escolher a primeira opção em detrimento
da segunda, o que não impossibilita que candidaturas de direita conquistem a
prefeitura, sobretudo em situações de crise da esquerda.
Contudo, a despeito de anos de desgaste
sofrido pelo PT, a
periferia de São Paulo foi responsável por formar um cordão sanitário contra o
bolsonarismo no estado em 2022.
Não só Jair
Bolsonaro perdeu na cidade, como também perderam o senador Marcos
Pontes e até mesmo o governador Tarcísio Freitas, que procura se apresentar
como moderado politicamente.
Ao que tudo indica, Salles vai precisar de
mais que os parcos holofotes da CPI
estapafúrdia contra o MST para ultrapassar os limites do Itaim
Bibi.
*Doutora em ciência política pela USP e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento
Um comentário:
Ave Maria!
Postar um comentário