Folha de S. Paulo
O horror no Oriente Médio magnetiza atenções,
enquanto o nosso não para
A partir da década de 1970 o Rio cresceu em
direção à Barra da Tijuca, bairro mais ou menos planejado que oferecia, além da
beleza natural de praias e lagoas, o conceito publicitário da segurança em
condomínios fechados e shoppings. Uma espécie de paraíso para a classe média
alta. Hoje o perigo mora ao lado.
Na semana passada, a Polícia Federal apreendeu 47 fuzis e centenas de munições calibre 556 escondidos numa mansão de um condomínio de luxo, na Barra. O arsenal veio de Belo Horizonte para abastecer traficantes de drogas, milicianos e bicheiros que estão em guerra na região. O que seria uma ilha de tranquilidade se transformou em palco de assassinatos brutais –como os que vitimaram por engano três médicos num quiosque.
Quem mora na Barra e no Recreio dos
Bandeirantes se acostumou a ver comboios de três veículos, de cor preta e
vidros cobertos por película escura. Dentro não vão executivos nem autoridades;
estão os chefes do crime organizado, responsáveis por uma estatística que
iguala a Baixada de Jacarepaguá à Baixada Fluminense no imaginário da violência.
O número de homicídios quase triplicou entre janeiro e agosto deste ano em
relação ao mesmo período de 2022.
É a prova de que tráfico e milícia,
infiltrando-se na estrutura do Estado, agem livremente. A política de segurança
do governador Cláudio Castro só parece eficaz para produzir chacinas em
favelas. Estima-se que haja 56 mil traficantes e milicianos no Rio, com 28 mil
fuzis a seu dispor. Nos últimos cinco anos, 114 crianças foram baleadas; 32
morreram. Um sofrimento imenso das famílias que, no calor da primeira hora,
afeta a população em geral. Aos poucos, a dor coletiva vai sendo esquecida ou
substituída por outra.
No momento, o horror do conflito no Oriente Médio magnetiza
todas as atenções, sobretudo as ideológicas. Mas nossa guerra –permanente e
gradual– não dá trégua.
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