Valor Econômico
Rodrigo Pacheco ganha forças para retirar o
controle da sucessão estadual das mãos de Zema
É incerto se o acordo de federalização de
ativos de Minas Gerais, em grande medida proposto pelo presidente do Senado,
Rodrigo Pacheco (PSD-MG), irá resolver a incapacidade do Estado em pagar a sua
dívida de R$ 156 bilhões com a União. Sobram dúvidas sobre a extensão da
federalização, a avaliação desses ativos, a constitucionalidade dessas
transferências, e a compatibilidade desse acordo com o regime de recuperação
fiscal (RRF).
A federalização das estatais mineiras precisa vencer obstáculos legais. No caso da Copasa, saneamento não é uma atribuição federal. A Constituição mineira é um complicador em relação à Cemig. O texto atual, que o governador Romeu Zema (Novo) gostaria de mudar, exige referendo para a privatização da estatal de energia elétrica. Essa exigência vale no caso de uma federalização? Há dúvidas no meio político.
Outra dúvida, que já chegou ao presidente da
Câmara, Arthur Lira (PP-AL) é se o acordo proposto por Pacheco não exigiria uma
mudança na lei que instituiu o Regime de Recuperação Fiscal, a lei complementar
159. Na visão do deputado Odair Cunha (PT-MG), exige. “Não é possível um acerto
específico para Minas Gerais. Vamos precisar mudar o RRF. Poderá ser um
Desenrola subnacional”, disse o petista, em uma alusão ao programa de
renegociação de pessoas físicas feito pelo Ministério da Fazenda. “Outros
Estados também querem fazer dação de ativos em pagamento de dívida”, comentou o
deputado Luiz Fernando Faria (PSD-MG), coordenador da bancada mineira, que
conversou com Lira sobre o tema. Faria comentou que há movimentações no Rio
Grande do Sul, que já aderiu ao RRF, para que se faça uma repactuação que
inclua o Banrisul em uma possível federalização.
Para que se sintetize em poucos parágrafos o
tamanho do enrosco em que Zema está: as dívidas estaduais foram federalizadas
nos anos 90. Minas Gerais deixou de ter capacidade de honrar sua dívida durante
a gestão de Fernando Pimentel (PT), antecessor de Zema.
No governo Temer, foi instituído um regime de
recuperação fiscal, pelo qual os Estados quebrados ganham alívio na parcela,
voltam a ter aval para contrair crédito e assumem compromissos de ajustes
fiscal, privatizações sendo uma das ferramentas. Mas é necessário obter a
autorização da Assembleia Legislativa local.
Rio Grande do Sul, Goiás e Rio de Janeiro
conseguiram essas autorizações e entraram no regime. Já em Minas Gerais Zema
não conseguiu articular essa aprovação. Em dezembro do ano passado, no apagar
das luzes do governo de Bolsonaro, que teve em Zema um defensor apaixonado de
sua reeleição frustrada, o governador mineiro conseguiu arrumar no STF uma
liminar, do ministro Nunes Marques, que o autorizou a entrar no regime de forma
provisória, ganhando o prazo de um ano para obter a licença. O prazo vence no mês
que vem e não há sinais de aprovação no horizonte.
Emparedado, Zema cedeu e já no início do mês
começou a mandar sinais de que aceitaria a ajuda de estranhos para que o Estado
não voltasse a pagar uma dívida impagável. Mesmo com o acordo anunciado por
Pacheco, já aceito por Zema, ainda assim, será necessária a chancela da
Assembleia Legislativa dentro de 19 dias, prazo que pode ser inexequível para
um acerto com essa nova complexidade.
Para resolver este ponto, a expectativa é que
Pacheco volte a agir e faça um apelo a Nunes Marques para que seja dado mais
prazo antes de Minas ter que voltar a pagar a dívida. Por uma ironia do
destino, o presidente do Senado talvez tenha que ser atendido por uma decisão
monocrática de um ministro do Supremo. A nessa quarta-feira pelo Senado da
aprovação da PEC 8, que limita decisões monocráticas, deixou Judiciário e
Legislativo à beira de um conflito institucional. Clima, portanto, para um
apelo dessa natureza teria que ser construído. No momento, não existe.
O que está acima de qualquer dúvida razoável
é a constatação de que o futuro eleitoral de Zema tem muitas condicionantes e
limitações, já presentes desde sua chegada ao poder, mas que se tornaram óbvias
agora. “Poucas vezes se viu um governador ser desnudado em sua capacidade
política dessa forma”, comentou um adversário de Zema, o deputado federal Paulo
Abi-Ackel (PSDB-MG).
Ficou claro para os observadores da cena
mineira que Pacheco se fortaleceu para retirar o controle da sucessão estadual
das mãos de Zema, seja para ele próprio concorrer a governador, seja para
cacifar um candidato. Se Zema não controlar a própria sucessão, uma eventual
candidatura presidencial para ocupar o vácuo na direita deixado pela
inelegibilidade de Bolsonaro torna-se um delírio.
Para um governador do Novo, privatizar é um
mantra, uma razão de ser, e, ainda que essa condição não esteja implícita,
federalizar ativos significa entregar as estatais à União e sepultar, durante
seu governo, a possibilidade de desestatização. É muito evidente o contraste
com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que está
prestes a conseguir autorização legislativa para vender a Sabesp, a
meta-síntese de sua gestão. As montanhas de Minas devem prender Zema dentro do
enredo do próprio Estado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário