O Globo
Um libertário sem experiência administrativa
e de um pequeno partido venceu as eleições na Argentina em um dos maiores
acontecimentos políticos da história deste país conhecido pelas sequências de
crises econômicas e decadência crônica. Javier Milei, visto por muitos como um
lunático extremista e por outros como uma solução para décadas de fracassos,
sentará no sillon de Rivadavia, como é conhecida a Presidência da
Argentina, em menos de um mês. Tentará implementar suas políticas para
transformar o país.
O governo Lula precisará lidar com um líder que o critica abertamente. As relações entre os dois países correm enorme risco de se deteriorarem. Para Joe Biden, a Argentina possui pouca relevância, mas será inevitável a comparação de Milei com Donald Trump a um ano da eleição presidencial nos EUA. Muitos comparam a vitória de Milei à do republicano em 2016, e a de Jair Bolsonaro, no Brasil, dois anos mais tarde. Como os dois, Milei surpreendeu o establishment e os partidos tradicionais. Também conseguiu enorme conectividade com seus seguidores em um populismo de direita. Ao mesmo tempo, há grandes diferenças no contexto das eleições de cada um dos três.
Trump era uma figura famosa, com histórico de
empresário rico (ainda que vigarista) e de sucesso na TV. Nunca tinha exercido
cargo político. Bolsonaro sempre foi um deputado do baixo claro e passou pelo
Exército. Já Milei ganhou fama por suas performances em programas de TV como
economista medíocre, mas bom comunicador. Estas não são, no entanto, as maiores
diferenças. Milei, ao contrário dos ex-presidentes do Brasil e dos EUA, não
terá maioria para governar. Trump iniciou seu mandato com maioria na Câmara e
no Senado. Bolsonaro conseguiu o suporte do Centrão, além de ter base forte com
evangélicos, militares e o agronegócio. O argentino leva desvantagem em todos
estes temas que facilitaram as administrações, ainda que fracassadas, dos
líderes de extrema direita em Brasília e Washington.
A coalizão de Milei será minoritária e, mesmo
com o apoio de parte da direita tradicional, não terá maioria no Congresso. No
sistema argentino, assim como no brasileiro, é praticamente impossível governar
sem maioria no Legislativo. Há ainda o agravante de o peronismo ser uma das
agremiações mais hábeis do planeta para sabotar rivais – só Mauricio Macri
terminou o mandato em cerca de um século sem ser peronista e mesmo assim acabou
derrotado quando tentou a reeleição.
Trump e Bolsonaro sucederam governos que não
deixaram heranças catastróficas. Barack Obama conseguiu ao longo dos seus oito
anos no poder reduzir a taxa de desemprego e melhorar a economia depois da
crise no final da administração de George W. Bush. Michel Temer também
recolocou a economia relativamente nos trilhos no Brasil antes de Bolsonaro
assumir. Milei herdará uma economia com inflação descontrolada. Planeja
dolarizar o país, mas deve enfrentar enorme dificuldade, por não ter apoio
político e porque a Argentina já tentou e fracassou com uma espécie de
dolarização (câmbio fixo) com Carlos Menem nos anos 1990. E, mais importante,
porque a Argentina não tem dólares para dolarizar.
Milei tampouco terá o disciplinado suporte
dos evangélicos de que tanto Bolsonaro como Trump desfrutaram. A população
evangélica argentina é muito menor se comparada com as do Brasil e EUA. Para
agravar, o futuro presidente xingou o popular Papa Francisco, que é argentino.
Os militares, enfraquecidos desde a ditadura e o fiasco na Guerra das Malvinas,
tampouco podem ajudá-lo. Será muito mais difícil para Milei implementar sua
agenda do que foi para Bolsonaro e Trump.
Um comentário:
Quem sabe assim ele renuncie,o problema é que a vice é igual,rs.
Postar um comentário