O Globo
Episódio da 'dama do tráfico' abre nova
frente de ataques a ministro, que enfrenta oposição a sua nomeação para o STF
O ministro Flávio Dino (Justiça) tem um
espírito brincalhão e costuma fazer graça quando questionado a respeito das
várias arestas que coleciona desde que assumiu uma das pastas mais empepinadas
da Esplanada sob Lula.
Até tentou submergir nos últimos meses,
quando percebeu que o fogo que o atingia vinha de todos os lados, e não apenas
da oposição bolsonarista com que manteve enfrentamento sobre a democracia ainda
na transição e mais fortemente depois do 8 de Janeiro, episódio em que teve,
com sua pasta, papel central. Mas as controvérsias parecem ir a seu encontro, o
que não é nada circunstancial. Afinal, se fatos de março ou maio têm vindo à
tona agora, é porque há gente buscando e municiando a imprensa de informações.
O episódio da “dama do tráfico Amazonense”, alcunha pela qual Luciane Barbosa Farias é conhecida, é o mais recente a servir para fustigar tanto a capacidade de Dino de conduzir a política de segurança pública do país quanto a possibilidade de Lula indicá-lo para a cadeira vaga desde outubro no Supremo Tribunal Federal.
É inadmissível que uma pasta responsável por
lidar com extremismo, contraterrorismo, combate ao crime organizado e outros
temas explosivos seja tão displicente com quem entra no prédio onde o ministro
despacha para se reunir com seus auxiliares diretos — ou quiçá mesmo com ele. É
perfeitamente possível que não tenha sido checada a ficha de alguém condenado e
incluído em inúmeras investigações por ser elo financeiro de uma das principais
facções criminosas que atuam no Brasil. Mas é assustador que assim seja.
Precisou ser noticiado pela imprensa para que
alguns filtros fossem estabelecidos, não sem que antes os responsáveis tenham
tentado minimizar a revelação. Não se trata de insinuar qualquer ligação ou
complacência dos integrantes da pasta com o crime organizado. Mas a
vulnerabilidade que essas autoridades demonstram é um grande trunfo para
aqueles que apontam a incompetência do governo Lula para lidar com o assunto,
um dos que mais desgastam a imagem do presidente e da esquerda perante a
sociedade.
Por tudo isso, e também pelo que o caso, de
fácil disseminação nas redes sociais e nas rodas de conversa, traz de desgaste
à imagem do ministro, é grave que se tenha comido essa bola. E pode haver mais
minhoca à espera de enxadadas nesse terreno.
\A maioria das brigas que Dino enfrentou era
necessária, e ele o fez com coragem rara em ocupantes de cargos de confiança.
Ex-governador do Maranhão e senador eleito pelo estado, Dino costuma dizer que
age sabendo que, se tudo o mais der errado, tem seu mandato para exercer.
Mas é conhecido em Brasília seu desejo de
integrar o Supremo Tribunal Federal, o que seria a coroação da carreira de
magistrado de que abriu mão para se lançar na política. Acontece que é essa
característica uma das mais usadas contra ele, inclusive pelos que tentam fazer
a cabeça de Lula. Dizem que seria político demais e nem a ida ao STF o faria se
despir de suas ambições eleitorais.
Nem tudo que se diz do ministro em Brasília é
justo ou verdadeiro. Mas nem Fernando Haddad hoje atrai tanto fogo, amigo e
inimigo, quanto o titular da Justiça. Ainda dentro de seu jeito folgazão, ele
diz que sua prioridade é emagrecer 32kg e ter uma vida saudável. Está empenhado
nisso.
Mas a demora de Lula em definir a vaga no
STF, deixando dois de seus ministros numa arena pública em que esse tipo de
ataque atinge mais a um que a outro, faz com que, nem que deseje, Dino não
consiga sair dos holofotes.
A facilidade com que uma dama do tráfico foi
recebida e tirou fotos sorridentes no ministério mostra o tamanho do nó que é
combater o crime organizado, tão entranhado que está nas estruturas
institucionais brasileiras. Para Dino, a tarefa é essa, mas também evitar que a
guerra termine com ele como alvo principal.
Um comentário:
A culpa não é de Dino.
Postar um comentário