domingo, 21 de janeiro de 2024

Vinicius Torres Freire - O Brasil e o futuro dos Carros

Folha de S. Paulo

País planeja e subsidia um mundo de mobilidade que estará morto em uma década

A euforia com o avanço dos carros elétricos no mercado tem levado uns baldinhos de água fria desde o final do ano passado. Alguns dos maiores fabricantes de veículos ocidentais têm anunciado que vão desacelerar planos de expansão de fábricas de elétricos. A Tesla de Elon Musk adiou fábrica nova no México. A Ford americana reduziu a produção da versão elétrica de sua picape F-150. A General Motors também adiou a produção de picapes. A procura de carros elétricos no mundo ocidental não cresce tanto como se previa. Apesar da velocidade reduzida, o negócio cresce.

Nos Estados Unidos, as vendas de automóveis elétricos (apenas a bateria) eram 5,1% do mercado no primeiro trimestre de 2022. No trimestre final de 2023, de 8,1% (no total dos elétricos, perto de 18%), segundo o Kelley Blue Book, da consultoria Cox Automotive. A venda de elétricos (bateria) crescia a 52% ao ano no final de 2022; no final de 2023, a 40%. Na China e na Europa, o avanço dos elétricos é maior.

O mundo rico (EUA, em especial) ou o que cresce muito (China, Índia) definem a adoção e a disseminação de tecnologias —no caso de automóveis, também definem a demanda de materiais e combustíveis. Isso nos interessa.

Também no caso da indústria de veículos ou de mobilidade, ficamos para trás, em vários casos no caminho da obsolescência. A fatia mundial de mercado dos carros elétricos era de 5% do total de vendas em 2020, segundo o "Global EV Outlook 2023" da Agência Internacional de Energia, e de 14% em 2022. Deve ter ficado perto de 18% no ano passado. Mais de 60% das vendas ocorre na China.

carro elétrico custa muito caro. Musk culpa a alta dos juros pela desaceleração da demanda. O presidente da Stellantis, Carlos Tavares, disse nesta semana que reduzir preços a fim de estimular vendas pode causar um "banho de sangue" nas montadoras.

 "Taxas de juros altas e preços elevados podem estar fazendo com que o interesse por veículos elétricos diminua em alguns mercados", lê-se no "2024 Global Automotive Consumer Study", da consultoria Deloitte, apesar de reduções de preços e incentivos do governo. Há preocupações também com autonomia dos carros e oferta de pontos de recarga.

Segundo pesquisa da Deloitte, para 67% dos consumidores americanos, o próximo carro que comprarão ainda será movido a combustível fóssil (ante 58% da pesquisa de 2023), para 16% será híbrido e para 6% a bateria. A redução ligeira de interesse é a mesma na Alemanha. Na China, onde 33% pretendem comprar um carro a gasolina ou diesel, o interesse pelos elétricos é crescente (33% querem um carro a bateria, 18% híbrido), assim como na Índia. A BYD chinesa empatou com a Tesla na participação no mercado mundial.

Pelos ventos da Ásia, vê-se para onde o barco vai. A venda de carros movidos a fósseis estará banida de boa parte do mundo ocidental rico em 2035. Além do mais, pode bem ser que novos tipos de carros não sejam a alternativa de locomoção nas cidades. De qualquer modo, alternativas tecnológicas para os motores de automóveis evoluem rapidamente, como a do hidrogênio. A discussão brasileira, para variar, está atrasada, se não é regressiva.

O governo lança oficialmente nesta segunda-feira um plano industrial baseado em transição verde. Porém, os planos sabidos para carros são mais cinco anos de subsídio para que as montadoras incrementem a eficiência energética de seus produtos. Montadoras que decerto padecem das ineficiências brasileiras, mas que são protegidas por enormes impostos de importação, por subsídios federais e estaduais; que não têm escala para produzir a bom preço e competir no exterior. Estamos enxugando gelo com um lenço bordado a ouro.

 

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