Valor Econômico
Presidente teria ouvido de um ministro não
petista que “o governo tem que ser o maestro da narrativa”
Em determinado trecho da manifestação aos
ministros, na reunião desta segunda-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva afirmou que é preciso melhorar o desempenho e a comunicação do governo
para atrair a fatia da população que considera a sua administração apenas
“regular”.
Pesquisas de três institutos divulgadas nas
duas últimas semanas - Quaest, Ipec e Atlas Intel - atestaram o derretimento da
avaliação do governo. A pesquisa Ipec (ex-Ibope), publicada no dia 8 de março,
mostrou uma queda de 5 pontos percentuais na avaliação positiva da gestão Lula.
Segundo o Ipec, 33% dos entrevistados consideram o governo ótimo e bom (eram 38% em dezembro); 32% classificam a gestão petista como ruim ou péssima (eram 30%); e 33% a avaliam como regular (eram 30%). No contexto dessas pesquisas, Lula observou que as obras de maior visibilidade do governo, como a ampliação do Bolsa Família, o reajuste real do salário mínimo, a retomada de contratos do Minha Casa, Minha Vida voltados para a faixa 1, a volta da Farmácia Popular e programa Pé de Meia (para alunos de baixa renda do ensino médio) são direcionados aos brasileiros com renda mensal de até dois salários mínimos.
De fato, segundo a pesquisa Genial/Quaest,
61% dos entrevistados que recebem até dois salários mínimos aprovam o trabalho
do presidente, enquanto 36% o desaprovam. E entre os que recebem acima de cinco
salários mínimos, 54% desaprovam o governo, e 44% aprovam.
É nessa conjuntura que Lula reconheceu, nas
entrelinhas, que passou da hora de pregar para os não convertidos. Há um
diagnóstico interno de que houve uma migração de segmentos, como mulheres e
jovens, que estavam com Lula na campanha, mas agora veem a gestão como
“regular”.
Um ministro não filiado ao PT avaliou, em
conversa com a coluna, que o governo tem resultados positivos. Citou a menor
taxa de desemprego em anos, o aumento do Produto Interno Bruto (PIB), a
inflação sob controle, o recorde da balança comercial, os investimentos
bilionários da indústria automobilística.
Entretanto, para esse auxiliar, o próprio
governo gera “ruídos” que fazem obnublar a percepção dos brasileiros sobre a
gestão lulista, e dão munição às redes bolsonaristas. “Erro de percepção tem a
ver com estratégia de comunicação”, cobrou.
Para esse ministro, o governo, e o próprio
Lula, têm de conter a geração de “ruídos”. Sustenta que Lula tem de resgatar a
“frente ampla” da campanha que ajudou a elegê-lo, com o vice Geraldo Alckmin,
ex-PSDB, como símbolo principal, encurralar o bolsonarismo para a extrema
direita e afinar o discurso para “ocupar o centro”.
Esse auxiliar criticou “ruídos” que
incendiaram o bolsonarismo, como a manifestação de Lula, em meados do ano
passado, de que o conceito de democracia é “relativo”, ao tratar da Venezuela.
Para esse ministro, uma declaração claramente voltada à bolha de esquerda.
Outro exemplo foi a declaração de que a
ofensiva bélica de Israel sobre a população da faixa de Gaza, assassinando
civis inocentes, inclusive crianças, compara-se à operação de Hitler contra os
judeus. Esse auxiliar observou que Lula não usou a palavra “Holocausto”, mas
deu azo à repercussão negativa, principalmente entre evangélicos. Nesse
segmento, a reprovação ao governo subiu de 56% para 62%, segundo a pesquisa
Quaest.
Para esse ministro, Lula age como se sua
prioridade fosse “concorrer ao prêmio Nobel”, quando deveria ser ocupar o
centro político no Brasil e tentar demonstrar à população, com mais eficácia,
resultados alcançados até agora.
Esse ministro observou que a maioria da
população demonstrou nas pesquisas preocupação com a escalada da violência e da
corrupção. Ele pondera que existe uma “percepção” dos brasileiros de que a
segurança pública anda mal, quando, na verdade, dados do Ministério da Justiça
indicaram declínio das mortes violentas, decorrentes de homicídios e
latrocínios.
Esse auxiliar ressalva que Lula não pode
incorrer em discurso “demagógico” de gestores ligados ao bolsonarismo, como o
do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ao ser
questionado sobre denúncia no Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra
(Suíça), sobre a escalada da violência policial na Baixada Santista. “Pode ir
na ONU, na Liga da Justiça, no raio que o parta, que não tô nem aí”, retrucou.
Esse ministro apontou, todavia, acerto na
fala de Lula de que o crime organizado hoje atua como uma “multinacional”.
Sobre este tema, na reunião ministerial, o ministro da Agricultura, Carlos
Fávaro (PSD), observou que, se o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, tem
de passar dias explicando a fuga de dois condenados da penitenciária de
segurança máxima de Mossoró (RN), caberia ao governo, em contrapartida,
divulgar, com mais frequência, as prisões de bandidos feitas pela Polícia
Federal (PF).
Para além da comunicação, todavia, Lula
tratou de problemas no plano real, e cobrou a ministra da Saúde, Nísia
Trindade. O presidente viu erro na ampla divulgação de uma vacina contra a
dengue sem que houvesse doses disponíveis para todos os brasileiros. E cobrou
falhas na gestão de hospitais públicos, o que culminou na demissão de um
secretário no fim do dia.
“O governo tem que ser o maestro da
narrativa”, cobrou o ministro não petista. Mas também tem de admitir e resolver
problemas no plano da realidade.
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