Valor Econômico
Comitê vai manter a flexibilidade para, de
acordo com a evolução das incertezas e do cenário, tomar a decisão que julgar
necessária
Depois de uma maratona de comunicação de
política monetária no encontro de primavera do Fundo Monetário (FMI), em
Washington, ficou mais claro que os dirigentes do Banco Central procuraram
ganhar mais liberdade para avaliar o cenário econômico antes de decidir o que
fazer a partir de agora com a Selic, num ambiente de maior incerteza provocado
pelo adiamento do corte de juro nos Estados Unidos, conflitos no Oriente Médio
e aumento dos riscos fiscais no Brasil.
Num pronunciamento em um evento da XP Investimentos, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, traçou quatro cenários hipotéticos para a evolução dessas incertezas. “Não é um guidance”, esclareceu em outro evento, do Bank of America. Ou seja: não é uma promessa sobre os juros. “Não estamos dizendo que vamos fazer X ou Y.”
Mas o BC não deixou o mercado completamente
no escuro. Campos Neto deu uma indicação do que dois desses cenários
hipotéticos, caso se confirmem, significam para a Selic que será definida na
reunião de maio do Comitê de Política Monetária (Copom).
Num deles, a Selic, que se encontra em 10,75%
ao ano, poderia cair 0,25 ponto percentual. Se nada mudar em relação ao que
observamos hoje, esse é o tamanho de queda do juro mais provável na reunião de
maio. Um outro cenário hipotético está vinculado a um de corte de 0,5 ponto
percentual. Já foi preponderante, mas as circunstâncias mudaram.
Outros dois cenários estão em aberto e não
representam, de antemão, um movimento específico para os juros, como manutenção
ou alta. Mesmo sem um vínculo com alguma taxa Selic em particular, porém, esses
dois últimos cenários hipotéticos ajudam a entender em que situação estamos na
chamada função de reação do Copom. São importantes também porque dão parâmetros
sobre quanto, na situação atual, a Selic pode cair até o fim do ciclo de
afrouxamento monetário, o chamado “orçamento de corte”.
Na última reunião, em março, o Copom já
procurou diminuir um pouco as amarras. Com o aumento das incertezas, encurtou a
sinalização futura para corte de juros. Passou a dizer que os juros cairiam em
0,5 ponto apenas na sua próxima reunião, em maio. Antes, desde que começou a
cortar a Selic, em agosto, vinha sinalizando baixas de 0,5 ponto percentual
para as suas próximas reuniões, no plural.
Essa sinalização de corte de 0,5 ponto para a
reunião de maio era condicional - ou seja, só seria entregue se os dados
econômicos evoluíssem da forma esperada pelo BC. De lá para cá, porém, a
incerteza aumentou. A ata do Copom de março também já antecipava o que o comitê
faria se a incertezas aumentassem. O ritmo de corte em maio seria desacelerado,
para 0,25 ponto percentual. Um detalhe: a ata dizia que o ritmo de corte
poderia ser reduzido sem que isso significasse uma mudança do orçamento de
cortes. O BC não diz claramente qual é o percentual de juros que acha mais
provável ao fim do ciclo de cortes, mas a sua projeção de inflação sugere que
seria um percentual acima de 9% ao ano.
Campos Neto, no evento da XP, citou esses
dois cenários acima. Disse que, se as incertezas melhorassem e voltassem para a
situação anterior, o BC poderia retomar os seus planos e cortar a taxa em 0,5
ponto. Ou seja: o chamado “forward guidance” segue existindo, o que mudaram
foram as circunstâncias.
Um segundo cenário citado por Campos Neto
descreve a situação atual, em que a incerteza está aumentada, mas não apresenta
piora adicional significativa. Nessas condições, haveria a desaceleração no
ritmo de cortes. Pelo que foi indicado na ata do Copom, o princípio nesse caso
é ir com cautela em meio às incertezas.
O fato de o Copom dizer que vai mais devagar
porque as incertezas aumentaram significa que o orçamento de corte de juro será
menor? Na divulgação do Relatório de Inflação de março, Campos Neto disse o
contrário: indo mais devagar, o BC pode inclusive ir mais longe. De fato, não
faria muito sentido mudar o orçamento de cortes se o cenário-base do Copom não
mudou - ou se, pelo menos, seus membros não consideram que os riscos negativos
para a inflação são preponderantes.
Campos Neto mencionou, em Washington, dois
cenários hipotéticos que detalham sua visão sobre o assunto. Segundo ele, no
cenário três, precisaria uma piora adicional na incerteza para o comitê
considerar que o balanço de riscos para a inflação ficou assimétrico, pendendo
para o lado negativo. Um quarto cenário mencionado por Campos Neto diz que as
incertezas precisaram se materializar para mudar o cenário-base, que hoje ainda
mostra que a inflação vai convergir para a meta.
Naturalmente, os analistas econômicos podem
fazer seus cálculos para checar se, dependendo da piora do balanço de riscos ou
do cenário-base, o BC terá que fazer um ciclo menor, manter a taxa em 10,75% em
maio ou mesmo promover uma alta de juro. O Copom, porém, não atribuiu nenhuma
taxa de juro a cada uma das situações. Vai manter a flexibilidade para, de
acordo com a evolução das incertezas e do cenário, tomar a decisão que julgar
necessária em cada uma das suas reuniões.
Talvez a informação mais importante que o
Banco Central passou, ao citar esses dois últimos cenários, é que hoje avalia
que não chegamos a uma situação tão negativa ao ponto de mudar o balanço de
riscos ou o cenário-base.
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