Folha de S. Paulo
A hiperpolitização da opinião pública em
torno do STF é inédita e sem paralelos nas democracias
Um terço da população avalia o trabalho
do STF como
ruim ou péssimo, enquanto outro terço o faz como ótimo ou bom. O índice de
aprovação é mais alto entre os que aprovam o desempenho do governo Lula (55%)
e, na direção oposta, a taxa de reprovação é mais elevada entre os que o
reprovam (63%) (Datafolha março/2024).
O Brasil não é exceção: a avaliação da Suprema Corte americana é a mais baixa em 50 anos e a brecha entre democratas (46%) e republicanos (68%) nunca foi tão alta: 44 pp. Pela primeira vez, mais gente desaprova (54%) do que aprova a instituição.
O que explica avaliações e sentimentos
díspares em relação às instituições políticas na opinião pública? Na literatura
especializada o principal fator explicativo é o hiato ganhador-perdedor
(winner-loser gap). As taxas de confiança/aprovação de instituições e do
governo, ou de satisfação com a democracia, são muito mais elevadas entre os
"ganhadores" —eleitores que votaram no governo (coalizão) ou
simpatizam com ele— do que entre os "perdedores" (os demais). No caso
do Poder Judiciário, há uma dinâmica peculiar: os apoiadores do presidente ou
primeiro-ministro tendem a avaliar negativamente o Poder Judiciário, o qual
limita a ação do Executivo. E vice-versa.
Estudo com 34 democracias europeias,
intitulado "Between Impartiality and Politicization: Confidence in the Judiciary
among Political Winners and Losers" (2024), traz evidências claras quanto ao hiato
ganhador/perdedor. Estudo similar com 34 países africanos chegou a mesma conclusão.
A avaliação dos governos e do parlamento é muito desfavorável entre os
perdedores. A brecha é menor em relação às Supremas Cortes. No caso europeu,
desagregando-se a informação por tipo de partido, o hiato aumenta entre
eleitores de partidos populistas em relação ao não populistas. É forte no
primeiro grupo, mas inexistente no segundo.
Tratar estas questões como ideológicas ou
doutrinárias, como é comum no debate público, é grave equívoco. Apoiadores
do PT vilipendiaram
o STF durante o mensalão e o impeachment de Dilma (embora os juízes nomeados
pelo PT fossem maioria), quando eram governo. Quando passaram à oposição, a
avaliação mudou radicalmente. E vice-versa: sob Bolsonaro, o STF tornou-se
vilão. Paradoxalmente continua sendo pelo desdobramento das ações.
Dois fatores geram hiperpolitização no
sentimento em relação ao STF: sua a ampla jurisdição criminal e o fato de que
este passou a ser objeto de ataque institucional e individuais, tornando-se
parte do litígio não só arbitro, o que nunca ocorrera antes, como já discuti aqui na coluna. Estes dois aspectos conferem
ao fenômeno características únicas, sem paralelo em outras democracias.
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