O Globo
Regulamentar as redes sociais sem comprometer
a liberdade individual é um desafio. E o futuro da democracia depende desse
equilíbrio
Não se amplia a voz dos idiotas. A frase é do
Millôr, e as autoridades brasileiras, a começar pelo ministro Alexandre de
Moraes, deveriam ter pensado nela antes de se deixar levar por Elon Musk — que,
a despeito de ser o segundo homem mais rico do mundo e um empreendedor genial,
não deixa de ser também um idiota: as condições não são excludentes.
Elon Musk quer plateia. Comprou o Twitter para isso, e o mundo faz a sua vontade quando o transforma em interlocutor sério fora das suas áreas de competência.
O que ele acha ou deixa de achar do ministro
Alexandre de Moraes e da situação política brasileira deveria ser irrelevante;
o Brasil se transforma em república de opereta quando passa recibo, e quando
representantes do poder resolvem defender a “soberania nacional” — que, para
início de conversa, não foi ameaçada.
Ninguém resiste a um bilionário.
Se o X descumprir ordens judiciais, que se
entenda com a lei. Mas seria bom, para início de conversa, saber que leis são
essas, e por que estão sendo invocadas.
Está todo mundo errado nesse furdunço,
inclusive o ministro Alexandre de Moraes, e não só por usar maiúsculas e
exclamação (“AS REDES SOCIAIS NÃO SÃO TERRA SEM LEI! AS REDES SOCIAIS NÃO SÃO
TERRA DE NINGUÉM!”).
O ministro foi um herói quando a nossa
democracia foi ameaçada e merece estátua em praça pública, mas agora deveria
adotar um perfil mais discreto e moderado — como, aliás, todo o STF. Há algo
errado num país que sabe de cor a escalação da Suprema Corte, e dispara nomes
de juízes como se fossem jogadores do time da várzea.
O debate sobre liberdade de expressão se
transformou num terreno minado. Estamos trabalhando com conceitos formulados no
Iluminismo em plena era da internet, e nem sempre é fácil distinguir entre
opinião pessoal e desinformação ou discurso de ódio. Suspender contas
mal-intencionadas talvez seja necessário em momentos críticos, mas quanto tempo
dura um momento crítico? E o que é uma conta mal-intencionada?
Todos têm direito à sua própria opinião.
Quando todos acham que têm direito aos seus próprios fatos, porém, a sociedade
corre riscos: “acho que vacina não funciona” é uma opinião, “vacina aumenta o
colesterol” não é.
Desinformação e fake news são elementos
tóxicos que precisam ser tratados, ou morreremos envenenados; mas asfixia geral
não resolve isso.
É óbvio que as redes sociais precisam ser
reguladas, e que as suas empresas precisam ser responsabilizadas pelo que
publicam. Viver de conteúdo sem ter qualquer responsabilidade por este conteúdo
não faz sentido.
O desafio de um milhão de dólares é fazer a
regulamentação sem comprometer a liberdade individual. O futuro da democracia
depende de encontrarmos esse equilíbrio, respeitando a diversidade de opiniões
enquanto protegemos o tecido social contra a desinformação.
Boa notícia: a regulamentação está no
Congresso.
Má notícia: a regulamentação está no Congresso.
Um comentário:
É bem isto!
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