Correio Braziliense
Segundo relatório da CGU, em mais um exemplo
de patrimonialismo oligárquico, 80% da estrada custeada pela emenda beneficiou
propriedades de Juscelino e de seus parentes
O ministro das Comunicações, Juscelino Filho
(União Brasil), foi indiciado ontem pela Polícia Federal (PF), por crimes como
corrupção passiva, fraude em licitações e organização criminosa. A denúncia é
mais uma dor de cabeça para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mal o
governo acabou de anular um leilão para compra emergencial de estoques de arroz
por suspeitas de fraude. É mais uma assombração que aparece.
Maranhense, Juscelino Filho tem 40 anos e assumiu o cargo desde o início do governo Lula, como parte do acordo com o União Brasil. Responde pela política de telecomunicações, radiodifusão e serviços postais do governo (Correios). É deputado federal desde 2014, tendo sido reeleito em 2018 e 2022.
Juscelino é acusado de desviar emendas
parlamentares quando era deputado federal, destinadas ao município de Vitorino
Freire (MA), cuja prefeita é Luanna Rezende, sua irmã — seu pai, Juscelino
Rezende, foi prefeito local por duas vezes. O dinheiro teria sido enviado por
meio da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba
(Codevasf) para a pavimentação de ruas. A empresa pública é a preferida dos
deputados do Nordeste para destinação de verbas federais, devido à grande
capilaridade e facilidade para contratação de obras e serviços nos municípios.
Segundo relatório da Controladoria-Geral da
União (CGU), em mais um exemplo de patrimonialismo oligárquico, 80% da estrada
custeada pela emenda beneficiaram propriedades de Juscelino e de seus parentes
na região. A obra foi executada pela empresa Construservice, que tinha como
sócio oculto o empresário Eduardo José Barros Costa, conhecido como “Eduardo
DP”. As investigações foram realizadas no âmbito da Operação Odoacro, iniciada
em julho de 2022, para investigar fraudes em licitações, desvio de recursos públicos
e lavagem de dinheiro em contratos da Codevasf no Maranhão.
Desde quando foi indicado ministro, diversas
denúncias contra Juscelino foram ignoradas por Lula, que ainda não se
manifestou sobre mais este caso. Supostamente, o ministro já foi acusado de
esconder do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) um patrimônio de R$ 2 milhões em
cavalos de raça; de apresentar à Justiça Eleitoral, na campanha de 2022, dados
falsos sobre viagens de helicóptero; de usar um voo da Força Aérea Brasileira
(FAB) e diárias para ir a leilão de cavalos de raça; de empregar um piloto
particular de aeronaves e o gerente do haras da família como funcionários da
Câmara, no gabinete de seu suplente, Dr. Benjamim (União-MA) — ambos foram
demitidos.
Outras não conformidades também comprometem a
imagem do ministro: ceder seu gabinete no ministério para o sogro despachar;
utilizar fotógrafo oficial em eventos privados; favorecer aliado na
distribuição de retransmissora de tevê; e beneficiar prefeituras comandadas por
sua irmã e um primo com doação de computadores, via programa do ministério. Em
todas essas denúncias, o parlamentar se justificou, adotou medidas saneadoras
ou simplesmente deixou o assunto sair do noticiário.
Capivara
Um velho ditado do antigo político maranhense
Vitorino Freire, que fez carreira em Minas e empresta o nome ao município
comandado pela família de Juscelino, é que jabuti não sobe em árvore — alguém o
pôs lá. Juscelino é uma espécie de capivara em cima da árvore. Está no cargo de
ministro por indicação do senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), atual
presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, que deve
voltar a presidir o Congresso em 2023, com amplo apoio. Não à toa o União Brasil
saiu em defesa de seu ministro: “Suspeitas são suspeitas”.
A legenda alega que Juscelino sofre
perseguição política da PF e deve ter respeitado seu amplo direito de defesa:
“O União Brasil reforça seu total apoio ao ministro das Comunicações, Juscelino
Filho, diante do indiciamento por parte da Polícia Federal. Suspeitas são
apenas suspeitas, e o partido não vai admitir pré-julgamentos ou condenações
antecipadas sobre o ministro. Indiciamento não deve significar culpa. O
princípio da presunção de inocência e o devido processo legal devem ser
rigorosamente respeitados”, diz a nota, assinada pelo presidente nacional da
legenda, Antônio Rueda.
Em sua própria defesa, o ministro disse: “A
investigação, que deveria ser um instrumento para descobrir a verdade, parece
ter se desviado de seu propósito original. Em vez disso, concentrou-se em criar
uma narrativa de culpabilidade perante a opinião pública, com vazamentos
seletivos, sem considerar os fatos objetivos. O indiciamento é uma ação
política e previsível, que parte de uma apuração que distorceu premissas,
ignorou fatos e sequer ouviu a defesa sobre o escopo do inquérito”.
Segundo Juscelino, “não há nada,
absolutamente nada, que envolva minha atuação no Ministério das Comunicações,
pautada sempre pela transparência, pela ética e defesa do interesse público”.
Como acontece na maioria das vezes, o ministro não pretende renunciar ou se
licenciar do cargo para se defender, o que deixa Lula numa saia justa com os
aliados do União Brasil, de um lado, e a opinião pública, de outro.
Denuncias de malfeitos no governo Lula são
corrosivas, devido à memória de escândalos nos mandatos anteriores, como os do
“mensalão” e do “petrolão”.
Um comentário:
Sei.
Postar um comentário