O Globo
Incompetência eleitoral dos democratas, que
perdurou ao menos até ontem, pode custar caro
Os nomes históricos não estavam lá: George
Bush, Mitt Romney, Mike Pence. No segundo dia da Convenção Republicana de
Milwaukee, um a um, os antigos desafetos de Trump ajoelharam e declararam
lealdade: Marco Rubio, Ted Cruz, Ron DeSantis, Nikki Haley. A convenção pode
ser descrita como espetáculo da unidade. A descrição mais precisa é outra: a
celebração da conquista.
O velho Partido Republicano — conservador, moderado e liberal — não existe mais. Em Milwaukee, assistiu-se ao desfecho de uma trajetória iniciada durante o mandato presidencial de Trump. O movimento Make America Great Again (Maga), nacionalista, populista e ultraxenófobo, fincou sua bandeira no pátio da fortaleza republicana. Lincoln, Theodore Roosevelt, Reagan? Os ícones do passado foram soterrados pela cavalgada dos conquistadores.
A conversão pública de desafetos arrependidos, ritual típico de regimes totalitários, é cena incomum na vida política democrática. No palco da convenção, eles queimaram o que adoravam e juraram adorar aquilo que antes queimavam. Mesmo assim (ou, talvez, exatamente por isso), devem conformar-se com papéis secundários na nova ordem republicana. Nenhum deles foi sequer cogitado para ocupar o posto de vice na chapa de Trump.
O chefe do Maga conseguiu o que era visto
como impossível, disciplinando seu movimento. Durante a convenção, os
jornalistas foram tratados com respeito e até gentileza. O “inimigo do povo”,
como Trump referia-se à imprensa, certamente ressurgirá em algum momento — mas
não na hora da festa da conquista.
A New Republic, publicação tradicional,
ideologicamente ligada à esquerda democrata, fundiu as feições de Trump e
Hitler na capa de sua edição de junho. A “redução a Hitler” é um clássico da
vulgaridade intelectual e um óbvio atentado à objetividade jornalística. Os
textos da “reportagem especial” propunham-se a cartografar o advento do
“fascismo americano”. Será o Maga um movimento fascista?
A mescla entre nacionalismo e populismo
sempre abrange traços superficiais do fascismo. Contudo o recurso a um conceito
hoje rebaixado ao estatuto de bandeira propagandística oculta a singularidade
do Maga.
A síntese do fascismo encontra-se na célebre
máxima de Mussolini: “Tudo no Estado, nada contra o Estado e nada fora do
Estado”. O movimento de Trump não se ajusta a essa prescrição. Numa ponta, sua
defesa de uma Presidência forte, imune à fiscalização judicial, quase imperial,
tem como contrapartida a cessão às legislaturas estaduais da prerrogativa de
anular direitos sociais e individuais. O Maga bate continência à “nação de
colonos”. Na outra ponta, seu populismo econômico, expresso em protecionismo tarifário
e irresponsabilidade fiscal, combina-se com um programa ultraliberal de
desregulamentação.
Imaginava-se que o velho Partido Republicano
ressurgiria de um caixão no dia em que Trump desaparecesse da cena política dos
Estados Unidos. A escolha de J.D. Vance para vice descortina, porém, a hipótese
de uma conquista duradoura. O jovem senador de Ohio, mais que um ímã de votos
nos estados decisivos do Meio-Oeste, tem as feições de herdeiro político.
Vance surgiu como campeão do “americano
esquecido”, o branco da baixa classe média do Rust Belt devastado pelo declínio
industrial, inimigo jurado das “elites cosmopolitas” acusadas de controlar um
“Estado profundo”. Nos idos de 2016, Vance classificou Trump como “heroína
cultural”, indagando se não viria a ser o “Hitler americano”. Foi visto por
liberais progressistas tontos como um achado: a resposta popular à seita
trumpiana. Poucos anos depois, praticou uma conversão de tipo especial,
permanecendo fiel a suas convicções fundamentais.
Vance tem a sofisticação intelectual que
falta a seu líder. O chefe do Maga é um oportunista ideológico: só acredita em
transações, comerciais ou políticas. Seu vice, presumível herdeiro, trafega em
via diversa, articulando uma narrativa ultranacionalista coerente nos domínios
da imigração, da economia e da geopolítica. A ruptura institucional que Trump
ensaiou, sem sucesso, em seu mandato presidencial encontrou seu ideólogo. A
incompetência eleitoral dos democratas, que perdurou ao menos até ontem, pode
custar caro.
5 comentários:
Perfeito !
Há um lamentar permanente da midia tradicional , jornalistas após jornalistas lamentam a derrocada do partido democrata o presidente Biden já vinha dando sinais de demência e senilidade há vários anos e era ocultado pelo governo e pela imprensa Agora como tudo foi revelado na frente de 60 milhões de espectadores do debate passado ao vivo na televisão não tiveram outra coisa que tira-lo da campanha Existe uma máfia por trás governando os Estados Unidos essa mesma máfia que tirou o Biden a contra a vontade dele
Quem vier candidato irá perder até pior do que o atual presidente
Deus salvou a vida do Trump pra ele salvar o povo americano e as democracias ocidentais ameaçadas pelo fundamentalismo autocrático islâmico terrorista Financiado pelo Irã
Se dúvida havia, agora ficou cristalino; o anônimo à direita é mais que um imbecil; é um perigo para a humanidade. MAM
O anônimo acima postou ontem na coluna do Celso Rocha de Barros neste blog:
"Ninguém vai substituir o Biden, não há mais tempo"! Contrariava o colunista, que previa a substituição do candidato democrata ontem!
Cruzes!
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