QUEM MATOU A VELHINHA?
Luiz Carlos Azedo
Ninguém sabe quem é o assassino, mas Raskólnikov sabe: foi ele mesmo. O desfecho da Operação Satiagraha lembra a trama de Crime e Castigo
O delegado federal Protógenes Queiroz é um personagem digno de um romance “noir” americano. Saiu do comando da Operação Satiagraha como um herói e ainda deixou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na maior saia-justa. Sua imagem é a do “cana dura” que não faz trato com bandidos, não aceita propinas, nem se intimida com políticos. Para chegar aos objetivos, usou de subterfúgios, inclusive aquele mais comum: atropelar hierarquia, suspeitos e advogados. No rastro dos crimes que investigava, foi em frente, doesse a quem doesse. Mas talvez tenha faltado ao delegado Protógenes a paciência de um Porfíri Pietrovitch, o perseguidor implacável de Rodion Românovitch Raskólnikov, assassino de uma velhinha e da única testemunha do crime, sua sobrinha, personagens de Crime e Castigo, o clássico romance de Fiódor Dostoiévski, escrito em 1866.
A caçada
O método do policial russo era a paciência e a persistência no cerco aos suspeitos, até que perdessem o controle e acabassem se incriminando. “Assentemos em que eu passei a ter suspeitas deste, daquele ou daquele outro, por me parecer que é o autor de um crime; vejamos: por que hei de eu ir incomodá-lo antes do tempo, embora possua algumas provas contra ele?”, explica Profíri, no genial diálogo com Raskólnikov.
“E veja, se o prendo antes do tempo, embora eu esteja convencido de que é ‘ele’, sou eu próprio que acabo por privar-me do meio de desmascará-lo mais à vontade; e como? Porque dessa maneira lhe destino uma posição, por assim dizer, definida; defino-o psicologicamente e tranqüilizo-o, e ele escapa-se-me e mete-se na sua concha; compreende, finalmente, que está preso”, arremata Porfíri.
O investigador joga com os nervos de um suspeito culto e inteligente: “Já reparou numa borboleta à volta da luz? Bem; pois da mesma maneira se porá ele a dar voltas e voltas em meu redor, como em torno de uma vela; a liberdade deixará de ser-lhe agradável, começará a matutar, a viver numa inquietação, a ficar preso nas suas próprias redes e a sofrer angústias mortais... E isso ainda não é tudo: ele próprio, espontaneamente, me proporcionará alguma prova matemática, do gênero de dois e dois são quatro... assim que eu lhe consinta um intervalo mais longo (…)Não lhe parece?”
A trama
Raskólnikov não responde a Porfíri, fica pálido e imóvel. “Boa lição!”, pensava. “Ah, é absurdo, meu caro, que tu queiras assustar-me e valer-te de estratagemas para comigo! Tu não tens provas (…)” Ninguém sabe quem é o assassino, mas Raskólnikov sabe: foi ele mesmo. Por isso, com os nervos à flor da pele, acaba se entregando. O desfecho da Operação Satiagraha lembra a trama de Crime e Castigo. Por que o Palácio do Planalto, de uma hora para outra, resolveu entrar de sola no caso, quando tudo indicava que a oposição seria a mais prejudicada no episódio?
Porque o responsável pela Operação Satiagraha tentou estabelecer um vínculo entre o principal acusado na operação, o banqueiro Daniel Dantas, e o Palácio do Planalto, envolvendo a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, e o chefe de gabinete do presidente Lula, Gilberto Carvalho. Forçou a barra demais ao levantar suspeitas de que a compra da BrasilTelecom pela Oi, que é fomentada pelo governo Lula, faria parte das operações suspeitas de Dantas.
Gato escaldado por escândalos envolvendo petistas trapalhões, o presidente Lula decidiu dar um novo rumo às investigações. Agora, o foco será nos crimes financeiros de Dantas , jamais as operações comerciais que envolviam a participação do governo e dos fundos de pensão, como era o horizonte das investigações conduzidas por Protógenes. Essa é uma tentativa de salvar a megafusão nas telecomunicações, na qual o presidente Lula sempre apostou e que agora está sob suspeitas. O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, já anda dizendo que a instituição não tem como pegar Dantas. Seria um problema para a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que deveria fiscalizar melhor os fundos de investimentos. O crime da velhinha continua sem solução.
Luiz Carlos Azedo
Ninguém sabe quem é o assassino, mas Raskólnikov sabe: foi ele mesmo. O desfecho da Operação Satiagraha lembra a trama de Crime e Castigo
O delegado federal Protógenes Queiroz é um personagem digno de um romance “noir” americano. Saiu do comando da Operação Satiagraha como um herói e ainda deixou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na maior saia-justa. Sua imagem é a do “cana dura” que não faz trato com bandidos, não aceita propinas, nem se intimida com políticos. Para chegar aos objetivos, usou de subterfúgios, inclusive aquele mais comum: atropelar hierarquia, suspeitos e advogados. No rastro dos crimes que investigava, foi em frente, doesse a quem doesse. Mas talvez tenha faltado ao delegado Protógenes a paciência de um Porfíri Pietrovitch, o perseguidor implacável de Rodion Românovitch Raskólnikov, assassino de uma velhinha e da única testemunha do crime, sua sobrinha, personagens de Crime e Castigo, o clássico romance de Fiódor Dostoiévski, escrito em 1866.
A caçada
O método do policial russo era a paciência e a persistência no cerco aos suspeitos, até que perdessem o controle e acabassem se incriminando. “Assentemos em que eu passei a ter suspeitas deste, daquele ou daquele outro, por me parecer que é o autor de um crime; vejamos: por que hei de eu ir incomodá-lo antes do tempo, embora possua algumas provas contra ele?”, explica Profíri, no genial diálogo com Raskólnikov.
“E veja, se o prendo antes do tempo, embora eu esteja convencido de que é ‘ele’, sou eu próprio que acabo por privar-me do meio de desmascará-lo mais à vontade; e como? Porque dessa maneira lhe destino uma posição, por assim dizer, definida; defino-o psicologicamente e tranqüilizo-o, e ele escapa-se-me e mete-se na sua concha; compreende, finalmente, que está preso”, arremata Porfíri.
O investigador joga com os nervos de um suspeito culto e inteligente: “Já reparou numa borboleta à volta da luz? Bem; pois da mesma maneira se porá ele a dar voltas e voltas em meu redor, como em torno de uma vela; a liberdade deixará de ser-lhe agradável, começará a matutar, a viver numa inquietação, a ficar preso nas suas próprias redes e a sofrer angústias mortais... E isso ainda não é tudo: ele próprio, espontaneamente, me proporcionará alguma prova matemática, do gênero de dois e dois são quatro... assim que eu lhe consinta um intervalo mais longo (…)Não lhe parece?”
A trama
Raskólnikov não responde a Porfíri, fica pálido e imóvel. “Boa lição!”, pensava. “Ah, é absurdo, meu caro, que tu queiras assustar-me e valer-te de estratagemas para comigo! Tu não tens provas (…)” Ninguém sabe quem é o assassino, mas Raskólnikov sabe: foi ele mesmo. Por isso, com os nervos à flor da pele, acaba se entregando. O desfecho da Operação Satiagraha lembra a trama de Crime e Castigo. Por que o Palácio do Planalto, de uma hora para outra, resolveu entrar de sola no caso, quando tudo indicava que a oposição seria a mais prejudicada no episódio?
Porque o responsável pela Operação Satiagraha tentou estabelecer um vínculo entre o principal acusado na operação, o banqueiro Daniel Dantas, e o Palácio do Planalto, envolvendo a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, e o chefe de gabinete do presidente Lula, Gilberto Carvalho. Forçou a barra demais ao levantar suspeitas de que a compra da BrasilTelecom pela Oi, que é fomentada pelo governo Lula, faria parte das operações suspeitas de Dantas.
Gato escaldado por escândalos envolvendo petistas trapalhões, o presidente Lula decidiu dar um novo rumo às investigações. Agora, o foco será nos crimes financeiros de Dantas , jamais as operações comerciais que envolviam a participação do governo e dos fundos de pensão, como era o horizonte das investigações conduzidas por Protógenes. Essa é uma tentativa de salvar a megafusão nas telecomunicações, na qual o presidente Lula sempre apostou e que agora está sob suspeitas. O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, já anda dizendo que a instituição não tem como pegar Dantas. Seria um problema para a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que deveria fiscalizar melhor os fundos de investimentos. O crime da velhinha continua sem solução.
Nenhum comentário:
Postar um comentário