quarta-feira, 23 de julho de 2008

DEU NO JORNAL DO BRASIL


FRENTE AMPLA:
UM FRAGMENTO IMPERDÍVEL DA HISTÓRIA RECENTE

Sergio Bruni
Economista, Presidente do Conselho Municipal de Desenvolvimento da Prefeitura do Rio de Janeiro e Surperintendente do Centro de Estudos Estratégicos da FGV
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O livro Renato Archer – diálogo com o tempo é fruto de 25 encontros que o ministro Renato Archer teve com profissionais do Centro de Pesquisa e Documentação Contemporânea da Fundação Getúlio Vargas (Cpdoc/FGV), resultando em 33 horas de gravação, que foram criteriosamente organizadas pela pesquisadora Regina da Luz Moreira e senhora Leda Soares, contando com o decisivo patrocínio da prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro.

Renato Bayma Archer da Silva, maranhense de nascimento, cursou a Escola Naval, entre 1941 e 1945, tendo servido a bordo de navios que patrulhavam a costa brasileira durante a 2ª Guerra Mundial. Elegeu-se deputado federal, em 1954, por seu Estado, na legenda do Partido Social Democrático (PSD), licenciando-se, assim, do serviço ativo da Marinha, onde chegou ao posto de capitão-de-fragata, sendo transferido para a reserva em 1961. Foi reeleito em 3 pleitos consecutivos, permanecendo na Câmara dos Deputados de 1955 à 1968, quando foi cassado pelo AI-5. Posteriormente, já com seus direitos políticos reestabelecidos, participou da fundação do MDB, hoje PMDB, foi ministro da Ciência e Tecnologia (1985/1987) e da Previdência Social (1987/1988) no governo José Sarney, e presidente da Empresa Brasileira de Telecomunicações (Embratel) no governo Itamar Franco.

Sua última atuação pública ocorreu em 1996, poucos meses antes de falecer, quando dirigiu o Comitê Rio 2004, que organizou a campanha pela realização da Olimpíada maranhense, nacional e internacional.

Nas quatro décadas, por ele abordadas, relata interessantes episódios, agora trazidos à tona, que tiveram como protagonistas personalidades como Eurico Gaspar Dutra, Getúlio Vargas, Vitorino Freire, senador José Sarney, almirante Álvaro Alberto, Walter Moreira Salles, Juscelino Kubitschek, Carlos Lacerda, Flores da Cunha, Aliomar Baleeiro, embaixador João Carlos Muniz, Leonel Brizola, João Goulart, José Maria Alckmin, Oswaldo Aranha, Gustavo Capanema, Café Filho, Carlos Luz, Generais Lott, Flores da Cunha, Fiúza de Castro e Mascarenhas de Moraes, Nereu Ramos, Celso Furtado, Amaral Peixoto, Burle Marx, Vinícius de Moraes, Rubem Braga, Pablo Neruda, Milton Campos, José Aparecido de Oliveira, Afonso Arino de Mello Franco, comandante Carlos Borba, Antônio Callado, Cid Rojas Américo de Carvalho, Lindolfo Collor, Villas-Boas Corrêa, Armando Falcão, Chagas Freitas, Lincon Gordon, Che Guevara, Ulisses Guimarães, John Kennedy, Danusa Leão, Clemente Mariani, Hélio Jaguaribe, Franco Montoro, Oscar Niemayer, Richard Nixon, Petrôneo Portela, Luis Carlos Prestes, Mário Henrique Simonsen, Miguel Arraes, Ivete Vargas, dentre outras dezenas de ecléticas personalidades com as quais conviveu.

No livro, ele relata diversos episódios que se iniciam lembrando suas fortes raízes maranhenses, passando pela Escola Naval, sua carreira militar, a política maranhense, entrando na questão nuclear, onde deu grande contribuição como discípulo do seu então professor de química, o almirante Álvaro Alberto da Mota e Silva, especialista no assunto e fundador, em 1951, do CNPQ.

Também aborda com desenvoltura, elegância e desprendimento, o período JK, o governo João Goulart, durante o gabinete parlamentarista de Tancredo Neves, onde foi subsecretário das Relações Exteriores, tendo ajudado a refinar, juntamente com o ministro San Thiago Dantas, a chamada Política Externa Independente, oriunda do governo Jânio Quadros, passando pelo período do regime militar, onde aborda, com precisão e maestria, aspectos extremamente interessantes, de todos os governos dos generais-presidentes.

Exemplo são suas observações do governo Costa e Silva, nas quais, com riqueza de detalhes relata o expurgo radical dos chamados castelistas, o caso Marcio Moreira Alves, a acefalia no poder e a constituição da junta militar.

Nos brinda, também, com sua visão da formulação, caminhos e descaminhos da Frente Ampla, na qual, sem dúvida, exerceu um importante papel na busca da consolidação da mesma, que unia atores com posturas político-ideológicas distintas, e às vezes, até mesmo, antagônicas, como as de Juscelino Kubitschek, Carlos Lacerda, João Goulart, Leonel Brizola, Jânio Quadros, dentre outros.

No livro ele aborda inúmeras passagens por ele vivenciadas, muito interessantes e de conhecimento restrito até então, finalizando seu depoimento abordando "a dura face do regime militar", que lhe cassou os direitos políticos e o prendeu três vezes, sendo que na última passou 20 dias incomunicável, fechando sua contribuição com as observações que fez na condição de "paisano" e a nova feição do Brasil, nos quais avaliou, com precisão cirúrgica, o momento político vivenciado pelo país, merecendo o registro de que em 1978, o ministro Renato Archer concedeu sua última entrevista ao Cpdoc.

Era o momento em que o governo Geisel enfrentava, ao lado das contradições internas do regime, representadas pela forte oposição à escolha do general Figueiredo como candidato à sucessão, também o crescimento da luta pela anistia, apoiada por importantes setores da sociedade, e se verificava os primeiros sinais de reanimação do movimento operário.

Jornal do Brasil, 20 de julho de 2008.

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