Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Sem a mais remota intenção de pregar o arremedo, os acontecimentos em curso nos Estados Unidos nesse período de campanha presidencial servem como aprendizado quando expostos ao cotejo com os usos e costumes políticos brasileiros.
Já tratamos aqui do processo de escolha de candidatos dentro dos partidos - uma eleição direta prévia, se comparada às nossas decisões restritas às conveniências das cúpulas partidárias - e ontem mesmo falamos sobre a consistência dos temas abordados lá, em contraposição às futilidades ditas cá por todos os candidatos sob o beneplácito de um eleitorado culturalmente refratário a cobranças insistentes.
O leitor José Augusto Neves percebe e sugere a abordagem de outro ponto de comparação: os termos da negociação do pacote de US$ 700 bilhões com o qual o governo George Bush pretende socorrer a quebradeira das instituições financeiras.
A despeito da urgência da situação, da proximidade das eleições e da condição sem nenhum conforto do candidato oficial, John McCain, as dificuldades para um acordo que permita a liberação do dinheiro vêm justamente do Partido Republicano.
Não porque os parlamentares pretendam criar dificuldades para individualmente “vender” facilidades à Casa Branca. Simplesmente está no DNA republicano a rejeição à interferência do Estado ao custo de dinheiro público.
Negar a autorização ao presidente está fora do cenário, mas o aval requer o estabelecimento de regras e garantias prévias, cuja negociação se dá à luz do dia. Existem, claro, detalhes atinentes à política interna e ao próprio momento eleitoral que nos escapam à compreensão.
Mas, grosso modo, o que se vê é um Poder Legislativo exercendo seu papel de contrapeso ao peso de eventuais arbítrios do Executivo. Os parlamentares, feios ou bonitos, “cuidam” do uso do dinheiro público antes de cuidar de seus próprios interesses.
Por critérios brasileiros, o primeiro deles seria a submissão inquestionável ao presidente, talvez não para preservar com ele as melhores relações, visto que Bush termina seus dois mandatos com altíssima rejeição popular. Mas, por isso mesmo, para “arrancar” benefícios individuais no momento difícil.
O segundo critério a ser levado em conta por aqui seria o fruto eleitoral: ninguém ia querer se arriscar a pagar a fatura da derrocada por causa de uma discussão árida sobre destinação de recursos públicos sem pagar um charmoso tributo a velharias ideológicas.
Terceiro ponto que não se vê lá é a criminalização do pensamento. Por aqui, nessas alturas, resistências e ponderações já estariam sendo qualificadas como crimes de lesa-pátria. No caso dos EUA, lesa-humanidade.
Isso sem contar que, se debate houvesse, seria sobre a medida provisória já devidamente editada ao arrepio da ilegalidade da concessão de créditos suplementares via MP. A Constituição proíbe, o Supremo recentemente convalidou a regra. Mas, o “vamos que vamos” local não leva em conta esses detalhes.
Balão
Gestos e palavras em defesa da liberdade de expressão têm sempre uma serventia. Mais não seja, a de reafirmar a eventuais incautos a consolidação desse valor na democracia brasileira.
Ainda assim, não se justifica o receio dos promotores de atos públicos e autores de artigos contrários à proposta do governo de quebrar o direito constitucional ao sigilo das fontes de informações, como forma de conter a onda de escutas telefônicas ilegais.
O governo não pretende de verdade investir na “mordaça”. Quando o ministro da Defesa, Nelson Jobim, falou disso na CPI dos Grampos, estava pressionado a provar que a Abin poderia ter grampeado o telefone do presidente do Supremo Tribunal Federal, e queria apenas mudar de assunto.
Tal proposta não passa no Congresso nem ao governo interessa esse inútil desgaste nas esferas mais informadas da sociedade, agora que a popularidade do presidente Lula entra de sola no patamar acima da classe média.
Causa própria
Não há nada de estranho no fato de o governador José Serra atuar nas campanhas de aliados do PSDB País afora, enquanto se mantém na encolha no primeiro turno em São Paulo.
As escaramuças paulistanas só lhe rendem confusão, mas quando aparece no programa de Fernando Gabeira, por exemplo, marca presença no Rio desde já pensando na eleição de 2010.
É claro que Serra não pretende orientar o voto do carioca, assim como Aécio Neves não acredita exercer influência sobre o eleitor quando anda pelas ruas de São Paulo na companhia de Geraldo Alckmin.
Não são os únicos a aproveitar a eleição municipal para aumentar seus respectivos índices de conhecimento no Brasil inteiro. Dilma Rousseff faz o mesmo em seu périplo de “ajuda” aos candidatos do PT.
De forma mais contida, copiam o modelo de Lula que há seis anos alimenta a própria fama.
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Sem a mais remota intenção de pregar o arremedo, os acontecimentos em curso nos Estados Unidos nesse período de campanha presidencial servem como aprendizado quando expostos ao cotejo com os usos e costumes políticos brasileiros.
Já tratamos aqui do processo de escolha de candidatos dentro dos partidos - uma eleição direta prévia, se comparada às nossas decisões restritas às conveniências das cúpulas partidárias - e ontem mesmo falamos sobre a consistência dos temas abordados lá, em contraposição às futilidades ditas cá por todos os candidatos sob o beneplácito de um eleitorado culturalmente refratário a cobranças insistentes.
O leitor José Augusto Neves percebe e sugere a abordagem de outro ponto de comparação: os termos da negociação do pacote de US$ 700 bilhões com o qual o governo George Bush pretende socorrer a quebradeira das instituições financeiras.
A despeito da urgência da situação, da proximidade das eleições e da condição sem nenhum conforto do candidato oficial, John McCain, as dificuldades para um acordo que permita a liberação do dinheiro vêm justamente do Partido Republicano.
Não porque os parlamentares pretendam criar dificuldades para individualmente “vender” facilidades à Casa Branca. Simplesmente está no DNA republicano a rejeição à interferência do Estado ao custo de dinheiro público.
Negar a autorização ao presidente está fora do cenário, mas o aval requer o estabelecimento de regras e garantias prévias, cuja negociação se dá à luz do dia. Existem, claro, detalhes atinentes à política interna e ao próprio momento eleitoral que nos escapam à compreensão.
Mas, grosso modo, o que se vê é um Poder Legislativo exercendo seu papel de contrapeso ao peso de eventuais arbítrios do Executivo. Os parlamentares, feios ou bonitos, “cuidam” do uso do dinheiro público antes de cuidar de seus próprios interesses.
Por critérios brasileiros, o primeiro deles seria a submissão inquestionável ao presidente, talvez não para preservar com ele as melhores relações, visto que Bush termina seus dois mandatos com altíssima rejeição popular. Mas, por isso mesmo, para “arrancar” benefícios individuais no momento difícil.
O segundo critério a ser levado em conta por aqui seria o fruto eleitoral: ninguém ia querer se arriscar a pagar a fatura da derrocada por causa de uma discussão árida sobre destinação de recursos públicos sem pagar um charmoso tributo a velharias ideológicas.
Terceiro ponto que não se vê lá é a criminalização do pensamento. Por aqui, nessas alturas, resistências e ponderações já estariam sendo qualificadas como crimes de lesa-pátria. No caso dos EUA, lesa-humanidade.
Isso sem contar que, se debate houvesse, seria sobre a medida provisória já devidamente editada ao arrepio da ilegalidade da concessão de créditos suplementares via MP. A Constituição proíbe, o Supremo recentemente convalidou a regra. Mas, o “vamos que vamos” local não leva em conta esses detalhes.
Balão
Gestos e palavras em defesa da liberdade de expressão têm sempre uma serventia. Mais não seja, a de reafirmar a eventuais incautos a consolidação desse valor na democracia brasileira.
Ainda assim, não se justifica o receio dos promotores de atos públicos e autores de artigos contrários à proposta do governo de quebrar o direito constitucional ao sigilo das fontes de informações, como forma de conter a onda de escutas telefônicas ilegais.
O governo não pretende de verdade investir na “mordaça”. Quando o ministro da Defesa, Nelson Jobim, falou disso na CPI dos Grampos, estava pressionado a provar que a Abin poderia ter grampeado o telefone do presidente do Supremo Tribunal Federal, e queria apenas mudar de assunto.
Tal proposta não passa no Congresso nem ao governo interessa esse inútil desgaste nas esferas mais informadas da sociedade, agora que a popularidade do presidente Lula entra de sola no patamar acima da classe média.
Causa própria
Não há nada de estranho no fato de o governador José Serra atuar nas campanhas de aliados do PSDB País afora, enquanto se mantém na encolha no primeiro turno em São Paulo.
As escaramuças paulistanas só lhe rendem confusão, mas quando aparece no programa de Fernando Gabeira, por exemplo, marca presença no Rio desde já pensando na eleição de 2010.
É claro que Serra não pretende orientar o voto do carioca, assim como Aécio Neves não acredita exercer influência sobre o eleitor quando anda pelas ruas de São Paulo na companhia de Geraldo Alckmin.
Não são os únicos a aproveitar a eleição municipal para aumentar seus respectivos índices de conhecimento no Brasil inteiro. Dilma Rousseff faz o mesmo em seu périplo de “ajuda” aos candidatos do PT.
De forma mais contida, copiam o modelo de Lula que há seis anos alimenta a própria fama.
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