quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Para Conceição, Brasil tem "baixo risco real"

Catherine Vieira, do Rio
DEU NO VALOR ECONÔMICO

Tentar crescer na defensiva será o desafio para os países a partir de agora, na visão da economista Maria da Conceição Tavares. Ela diz que embora exista um colapso do crédito externo, o Brasil está numa posição privilegiada e defende que há e continuará existindo recursos internos para financiar os investimentos, que podem chegar a uma taxa de 21% em 2010. "Nosso mercado não depende de dólar e isso é uma novidade. Não nos ocorreu nunca na história do Brasil. Hoje somos um país de baixo risco real, o que é raríssimo", disse.

Para Conceição, por ironia e porque o país está numa fase de "muita sorte", a política econômica dos ortodoxos acabou fazendo um favor ao país. "Foi por conta desses juros altos que nossos bancos não se aventuraram nessas trapalhadas todas nas quais os bancos estrangeiros embarcaram e que agora estão gerando esse colapso", afirmou.

Segundo a economista, os recursos públicos e da poupança forçada dos trabalhadores, que dão lastro aos financiamentos de bancos como o BNDES, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil, são robustos. "O emprego e a formalização estão aumentando, então é provável que os fundos de pensão dos trabalhadores cresçam e nenhum deles se meteu nessas aventuras em que os americanos se meteram", disse. "Os recursos fiscais também crescem a medida que o país cresce e investe, o que eleva o autofinanciamento", completa.

Para ela, é provável que as proporções de origens dos recursos internos fiquem semelhantes, com o auto-financiamento em 50%, a poupança forçada dos trabalhadores em 30% e os recursos fiscais com o restante. "Tudo isso está aqui no mercado nosso", afirma.

Nesse cenário, Conceição, que participou do lançamento do segundo número da publicação "Memórias do Desenvolvimento", do Centro Internacional Celso Furtado, concordou com a projeção feita pelo superintendente do BNDES, Ernani Torres, de que a taxa de investimento vá chegar a 21% do PIB em 2010. "Mas não é para passar muito disso não, não me venham com essa taxa de investimento chinesa", ponderou. Para ela, "taxas muito altas acabam mal, como ocorreu na Rússia".

De bom humor e "em casa", ela fez a alegria da platéia que a assistia ontem, num auditório do BNDES, com suas análises e tiradas. Para Conceição a crise atual nasce da excessiva falta de regulamentação do mercado dos EUA, que ganhou força a partir da década de 90 e avalia que, no cenário atual, os Estados Unidos não são mais o país hegemônico.

"Pode ser ainda dominante, o dólar ainda pode ser a referência, mas a hegemonia acabou, eles dizem "A", os chineses dizem "B" e outros dizem "C". Eles não exportam mais seu modelo de mercado para o mundo como ocorreu antes", disse, notando que, apesar das ações do Fed, a crise segue seu caminho. "O mundo vai ter agora uma multipolaridade e não é uma novidade, o capitalismo já viveu muito tempo sem hegemônicos".

Ela defende que os liberais continuarão existindo, mas não ditarão as regras absolutas. "Vamos voltar a ter uma etapa mercantilista, para mim está claro. A etapa liberal já estourou, acabamos de chegar ao fim da dita", afirmou. "A idéia da ordem mundial, era bom vocês esquecerem. Vamos viver um belíssimo período de uma grande desordem."

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