terça-feira, 16 de setembro de 2008

Um dia com Lula 64 graus


Raymundo Costa
DEU NO VALOR ECONÔMICO


No dia em que os mercados entraram em pânico, o presidente Lula parecia ter visto "passarinho verde", na expressão de um dos presentes ao churrasco que o governador Sérgio Cabral ofereceu ao presidente, em sua casa no condomínio Portobello, em Mangaratiba (RJ). Feliz, mas atento à crise que se desenrolava no Hemisfério Norte.

Lula procurou tranqüilizar os convidados, os governadores Marcelo Déda, de Sergipe, e Paulo Hartung, do Espírito Santo. Segundo o presidente, as medidas que o país tem tomado de "certa maneira criaram uma resistência macroeconômica muito significativa, anticorpos à crise", de acordo com o testemunho de um dos presentes.

Mas Lula fez questão de enfatizar para os governadores que é preciso estar mais atento que nunca, para impedir que a crise tenha maior impacto no país. "Agora tem que monitorar, continuar monitorando, e adotar, a depender da evolução, as medidas que forem necessárias para reduzir o risco de contaminação no país", contou outro convidado do governador Sérgio Cabral.

Lula está feliz com os 64% de popularidade que atingiu em pesquisa Datafolha da última semana, um recorde entre os presidentes, desde a redemocratização. Em sua estadia no Rio, iria a Resende inaugurar o Centro Logístico Volkswagen Caminhões e Ônibus. Não houve teto para o embarque, mas ele telefonou para explicar aos operários por que não estava lá, puseram sua voz no sistema de som, foi um sucesso.

O presidente está feliz também no pré-sal. Não por acaso, os três governadores que dividiram a churrasqueira de Cabral estão entre os estados mais beneficiados com a exploração petrolífera. Lula disse ter claro o propósito de não tomar decisão sobre a exploração do pré-sal "sem estabelecer um diálogo com os estados produtores e com o conjunto dos estados brasileiros".

O presidente disse aos governadores que o pré-sal é uma "riqueza que o país não esperava", que tem de ser explorada "tendo em vista as futuras gerações". Disse que deve receber o relatório que encomendou sobre a exploração do pré-sal em novembro, provavelmente depois das eleições, mas que não tem nenhuma "decisão apriorística". Está com a mente aberta, mas tem alguns eixos que levará em consideração.

Um deles é que "o Brasil não pode repetir os erros que outros países produtores de petróleo cometeram"; outro, como é do conhecimento público, a aposta num modelo de indústria petrolífera que agregue valor e torne o país um exportador de produtos industrializados derivados do petróleo. E que o pré-sal se transforme num instrumento de desenvolvimento, o que ocorrerá se o Brasil preparar-se para atender a demanda de equipamentos, sondas, plataformas e navios.

Num mundo em crise, Lula demonstra muita tranqüilidade. "Ele está em estado de graça, como alguém que viu um passarinho verde, e com um imenso otimismo no Brasil", conta um dos três governadores que estavam em Mangaratiba.

Um ambiente que deixou pouco espaço para conversas sobre as eleições municipais. Mas Lula 64 graus está com um problema de bom tamanho na cidade do Rio de Janeiro, com as pesquisas indicando um possível segundo turno entre os candidatos do PMDB, Eduardo Paes, e do PRB, Marcelo Crivella.

Bem antes da campanha, Lula deixou circular que Crivella era seu "candidato do coração" no Rio. Agora o PRB cobra a fatura do presidente, na forma de apoio gravado para a televisão. O presidente tem Paes na conta de um "desafeto", por sua atuação na CPI do Mensalão, mas o pemedebista é o afilhado de Sérgio Cabral nessas eleições.

Nos quatro Dias que Lula passou no Rio, o governador tratou de desfazer as resistências do presidente a seu candidato. A promessa é que Paes, se eleito, vai trabalhar junto com o governador e se comportar como um integrante da base aliada.

Aposta-se, nos meios cabralinos, que o presidente não vai tomar partido na disputa, em nome de um entendimento com o Rio de Janeiro que estava travado há cerca de 20 anos. Nem é hora: os dois candidatos ainda têm dúvidas se vão mesmo para o segundo turno. Além disso, é improvável que Lula ponha em risco uma popularidade que nunca teve antes no Rio.

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras

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